Hoje a noite será quente em um sobrado com fachada discreta, sem anúncios, na principal via do tradicionalíssimo bairro de Santa Felicidade. O local abriga o ponto de encontro dos casais que descobriram um jeito de acabar com a rotina. Toda quarta, sexta e sábado, a pista de dança e os quartos coletivos do Desiree Swing Club fervem, literalmente lotados de gente adepta da troca de casais e do sexo grupal. Estão lá casais de aliança no dedo, namorados, parceiros e até solteiros curiosos, em busca de diversão e de uma pitada de aventura para sair da “mesmice” que ataca nove entre dez relacionamentos.
O swing surgiu no final da década de 60, nos Estados Unidos, em plena era de contestação aos rígidos valores morais da época. Festinhas particulares promoviam a troca de casais de classe-média entre amigos e conhecidos. Era moda, entre os intelectuais americanos com mais de 30 anos, ser “liberado”. Hoje é diferente: virou comércio, e altamente rentável, como tudo na indústria do sexo. Vendido como fórmula para apimentar casamentos desgastados, o swing vem angariando adeptos por todo o Brasil. Como não poderia deixar de ser, a internet é um dos caminhos para descobrir os clubes e se informar sobre as regras da troca de casais.
Paga-se ingresso para entrar nos clubes especializados, onde só se entra depois de ser indicado por outros freqüentadores. Uma vez aprovado e cadastrado, o casal usufrui de estrutura completa – pista de dança, comida e bebida, camas coletivas, suítes privê e até tratamento vip, como escontos em noitadas futuras ou a possibilidade de se tornar sócio do clube, pagando mensalidade.
Em Balneário Camboriú, o Liberty Club, que também tem filial em Curitiba, promete noites memoráveis. Além da área comum, onde os casais dançam e se encontram, a casa oferece suítes e chalés privados, com direito a sauna e piscina térmica, como nos melhores motéis. Curitiba tem pelo menos três clubes especializados. Todos são parecidos e têm em comum o fato de manter clientes fiéis, que voltam toda semana.
Do passado, restaram as regras para praticantes do swing. Todo principiante é respeitado como tal, e ninguém pode obrigar ninguém a fazer nada que não queira. Tudo deve ser feito com consentimento mútuo.
Basta um sinal com a mão para colocar um ponto final no assédio. Com isso, o clube de swing é também o lugar ideal para voyeurs, as pessoas que se satisfazem apenas observando a atividade sexual dos outros. Muitos casais freqüentam o clube com essa intenção: não é raro o marido querer observar a própria esposa ser tocada e possuída por outros homens. (Bia Moraes)
Uma noite no clube de swing
Um telefonema dando como “senha” o nome da pessoa que nos indicou abriu as portas do mundo do swing em Curitiba. Tudo que sabíamos é que o Desiree Swing Club era freqüentado por casais que teríamos que pagar entrada. Mas a conversa ao telefone com Mauricio, proprietário da casa, já revelou mais. Imaginando que fosse solteira, ele sugeriu a quarta-feira, dedicada aos descompromissados e principiantes.
Desfeito o engano, marcamos para o sábado e Mauricio forneceu o endereço. Ao chegar, basta encostar o carro e o portão automático se abre. Somos recebidos pelo próprio Mauricio e pela esposa, Josiane, que nos acompanham num “tour” de apresentação da casa. Se eu os encontrasse na rua, a última coisa que imaginaria é que são donos de um clube de sexo: parecem aquele casal de vizinhos simpáticos a quem você vai pedir uma xícara de açúcar emprestado.
Camas gigantes
É cedo – 23h30 – e o clube ainda não está fervendo. Alguns casais tomam drinques e outros arriscam passos tímidos na pista de dança. O ambiente é parecido com o de uma boate – mesas, um quadrado vazio para as pessoas dançarem, cabine para o DJ. Mauricio nos leva aos dois quartos coletivos. Em cada cômodo, há uma única e gigantesca cama.
Cadeiras encostadas na parede servirão para acomodar os obser-vadores. O proprietário também mostra as suítes, quartos comuns, com cama de casal e porta que pode ser fechada, um diferencial em se tratando de um clube de swing. Ali podem ficar os casais que preferem privacidade.
Mauricio e Josiane são extremamente solícitos e fazem de tudo para nos deixar à vontade. Quando voltamos para a pista, o ambiente já está mais cheio. Mauricio nos coloca em uma mesa, explica as regras da casa – entre elas, o básico “só façam o que vocês tiverem vontade” -, chama a garçonete e se despede dizendo que “com certeza” vamos nos divertir muito. De cara, a sensação de “peixe fora d?água”. Muita gente se conhece, as pessoas se cumprimentam, dançam, batem papo e dão risada.
Pedimos bebida e observamos os casais dançando. Até então, o ambiente parecia com o de uma boate comum, mas logo começam a acontecer coisas diferentes. Dançarinas e dançarinos contratados pela casa se encarregam de animar o pessoal. Estão vestidos de forma provocativa, as garotas de minissaia e top curtinho, os homens com sungas justíssimas.
Insinuante
Não demora muito, uma morena vem fazer graça para o nosso lado. Rebola, dança, meneia os quadris e me chama fazendo sinal com as mãos. Sem jeito, digo que não – nem sei bem para quê! – e ela se volta para meu marido. Curiosa para saber no que vai dar a situação, peço que ele aceite o convite da mocinha e mantenho meu posto de observação.
Péssima idéia. Perdi-o de vista no emaranhado de gente que dançava. Minutos depois, vejo duas garotas empurrando-o para cima de um tablado, no meio da pista. Uma tira a camisa dele e a outra tenta abrir a calça! Pensando em ir buscá-lo, levanto e me dou mal mais uma vez. Sou surpreendida pela primeira “brincadeirinha” da casa: um apagão.
No escuro total, sem ter idéia do que acontece e tentando imaginar o que está sendo feito do meu marido, sento no chão. O sossego dura pouco. Logo sinto alguém me puxando pelo braço. Rápido, digo: “Sou principiante, estou só olhando”. Escuto risadinhas. “Ai, bem, tá vendo? É a primeira vez dela…. deixa pra lá….” A saia-justa vem em seguida, quando a luz acende. O casal, apa-rentando estar naquela faixa etária perigosa entre o final dos 30 e o começo dos 40 anos, está bem ao meu lado, e puxa conversa. O homem bigodudo insiste. “Você não quer mesmo tentar?” Sinto que chamo atenção porque sou um rosto novo no local. “Não, não quero, por enquanto vou só olhar.” “Que é isso, aqui é tudo gente de família… Isso aqui é uma suruba de família, só tem gente boa….” Digo que não, obri-gada, mais uma vez, e a mulher retruca: “Toda semana a gente vem aqui e ele sempre tenta…. Vamos, bem, não adianta insistir, principiante é assim mesmo.”
Cobra
Duplo alívio: o casal desiste, vai para outro lado, e meu marido reaparece – só que todo amassado e com os sapatos na mão. Pelo menos está vestido. Eu ia perguntar o que tinha acontecido, mas já é hora de mais uma surpresa: um show de strip-tease. A dançarina, loura voluptuosa, entra na pista carregando uma cobra de verdade, à la Jade. Ao som de música árabe, faz tudo que pode se esperar de uma stripper com uma cobra. Aplausos calorosos.
Terminado o show, todo mundo está visivelmente mais animado. A música sobe. Mulheres de meia-idade, donas de corpos longe da perfeição, sobem no tablado, tiram a blusa, rebolam freneticamente. Sucedem-se outros apagões, sons de gemidos e suspiros, brincadeiras animadas pelo DJ, dança das cadeiras e do chapéu…. E a noite vai esquentando.
Um dançarino da casa me tira para dançar e resolvo aceitar, em nome da curiosidade jornalística. Deu certo. Entre um passinho e outro na pista, o rapaz me conta a vida inteira. Responde todas as perguntas e conta que é comum ser contratado para “animar” casais entediados.
“Os caras querem ficar excitados, então me pagam pra eu transar com a mulher. Ficam olhando pra depois conseguirem entrar em ação”, revela.
Fora da vida noturna, o garoto de 21 anos é modelo fotográfico. Dou uma olhada em volta para conferir a situação e percebo duas coisas: meu marido está sentado, comportado e sozinho, tomando uma cerveja; e a pista de dança esvaziou. “É a hora da suruba”, confidencia meu parceiro de dança. “Quer ver?”
Gemidos
Como recusar tal convite? O mocinho me pega pela mão e descemos as escadas. Um olhar rápido para meu marido serviu de alerta para que ele nos seguisse. Entramos em um dos quartos coletivos. A penumbra é tão densa que não consigo enxergar nada. Só escuto gemidos de todos os tipos e calibres. “É assim mesmo, logo o olho acostuma e você vai ver”, sussurra o rapaz.
A imensa cama abriga doze, ou treze, ou quinze pessoas, não dá para contar com exatidão.
O que se pode perceber é uma profusão de cabeças, pernas e traseiros, todos nus e se movimentando. Quem está com quem? Impossível saber. Ao nosso lado, igualmente observando, um casalzinho jovem, de mãos dadas, que logo sai de cena. Principiantes, penso, com um certo alívio por perceber que não somos os únicos desenturmados do clube. O dançarino comenta que não participa do sexo coletivo. “Sou contratado para animar a pista. Disso aqui não gosto muito.”
Ele nos leva para o outro quarto. A cena é a mesma. Três pessoas sentadas, olhando, e muita gente fazendo sexo. Mauricio passa a todo momento, conferindo se está tudo certo. Na escuridão, não consegui identificar o casal que tinha me assediado. Fiquei curiosa em saber se eles tinham encontrado outros parceiros. As duas dançarinas que quase despiram meu marido já foram embora. Elas também não participam do sexo grupal.
São quase 4h da madrugada. Voltamos à pista de dança: vazia. Josiane começa a arrumar a mesa onde será servido o café colonial, cortesia da casa para os praticantes do swing, que devem sair da maratona extenuados e com fome. Aquela sensação inicial – peixes fora d?água – permanece. Não conseguimos nos imaginar comendo broa e tomando café com todo mundo. A vontade é sair para comer um sanduíche na madrugada fria, a sós, e voltar para casa. Para uma simples e prosaica cama de casal, de medida padrão.
Nos despedimos, agradece-mos e elogiamos tudo. Mauricio e Josiane nos acompanham até a porta, sorridentes. O preço da aventura: quase setenta reais. Se quisermos voltar, teremos o ingresso como cortesia da próxima vez.
Sucesso
Toda semana, recebo e-mails do Desiree convidando para festas e promoções. Nas mensagens, Mauricio conta que a “Sexta Hot”, inaugurada em julho, tem sido um sucesso: quase cem casais por noite. Diz também que há novidades como a “cabine erótica”, onde elas dançam para eles e eles para elas, prêmios para as melhores performances, novos shows de strip-tease.
Sinal de que o número de casais “swingers” de Curitiba só vem aumentando.