Pela primeira vez na história, a cidade de Buenos Aires está totalmente sem carne bovina nos açougues e supermercados. Nunca antes, nem mesmo em situações de crise social, econômica ou política – como golpes de Estado, guerras civis, revoltas sociais e a hiperinflação – os habitantes desta cidade haviam padecido uma escassez de tal magnitude do principal prato da gastronomia argentina.

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Se o locaute hipoteticamente acabasse na terça-feira, o abastecimento da cidade – segundo os especialistas – só estaria normalizado no sábado.

Segundo Alberto Williams, presidente da Associação de Açougues da Capital, 95% dos estabelecimentos em toda a Argentina não possuem carne para vender. Além da carne, escasseiam verduras, cujo desabastecimento chega a 50%. Os legumes, frutas e carne de frango também faltam.

O presidente do Centro de Empresas Processadoras Aviárias (Cepa), Alberto Domenech, calcula que a paralisação do setor afetou a produção de frangos nos próximos seis meses. Na semana passada, por falta de milho e soja para alimentar as aves, as empresas dos setor tiveram que sacrificar 1,3 milhão de frangos de poucos dias de vida.

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Por causa da falta de produtos, a inflação disparou nos últimos dias.

Desta forma, os argentinos choram mesmo antes de descascar uma cebola, já que seu preço subiu 250% nas últimas duas semanas. A batata registrou um aumento similar.

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O Secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, está pressionando os supermercados para que voltem atrás nos preços e restabeleçam os níveis anteriores ao locaute dos agricultores. Economistas independentes afirmam que a inflação de março poderia chegar a 3,5%, um recorde desde os tempos da crise de 2001-2002.

Além do abastecimento interno, a greve está colocando em colapso as exportações de produtos agrícolas, entre eles, a soja. Os especialistas afirmam que todos os anos surgem gargalos no transporte da soja na época de levar o produto aos portos argentinos (o sistema de transporte argentino nunca atualizou sua capacidade ao crescimento exponencial que a produção de soja teve no país em uma década, passando de 15 milhões de toneladas em 1997 para 45 milhões em 2007). Desta forma, quando esta greve acabar, o número de caminhões será insuficiente para levar toda a produção.

Enquanto isso, diversas indústrias do setor agroindustrial ameaçam suspender operários. Na cidade de Roque Pérez, na província de Buenos Aires, 500 trabalhadores das indústrias avícolas foram enviados para suas casas, com o pagamento de apenas uma parte de seus salários. Na província de Córdoba, a fábrica de bolachas da empresa Arcor – a maior do país – suspendeu suas atividades desde a sexta-feira.

Para complicar, com a redução drástica da comercialização dos produtos agrícolas, a perspectiva é que a arrecadação da Receita Federal apresente uma queda abrupta. Segundo especialistas, a arrecadação de março poderia ter sido US$ 100 milhões superior se a greve não tivesse ocorrido. Mas o principal efeito será sentido em abril, mês em que a arrecadação sofreria uma queda de quase US$ 700 milhões.