Os resultados parciais na Bolívia estão a ponto de confirmar nesta terça-feira, 22, a vitória do presidente Evo Morales em primeiro turno nas eleições, mas a oposição denuncia fraude e protesta nas ruas do país, enquanto os observadores internacionais questionam a repentina vantagem do chefe de Estado.

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Após uma segunda-feira violenta, quando manifestantes atearam fogo em urnas de votação e sedes eleitorais, a oposição, sindicatos, organizações empresariais e cidadãos organizavam novos protestos para esta terça-feira.

As mobilizações nas ruas começaram quando as autoridades eleitorais, sem explicação alguma, retomaram na noite de segunda-feira a recontagem de votos que foi interrompida no dia anterior.

A recontagem rápida (TREP – Transmissão de Resultados Eleitorais Preliminares) deu a Evo 46,87% dos votos e a seu rival, Carlos Mesa, 36,73%, com cerca de 95,30% das urnas apuradas.

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Segundo a lei boliviana, um candidato vence no primeiro turno se obtiver 50% mais um dos votos ou superar os 40% com dez pontos porcentuais de diferença do segundo colocado.

Para esta terça, a mobilização deve ser maior e mais organizada. O sindicato de médicos, que manteve greve de mais de um mês por reivindicações trabalhistas, anunciou ações em todo o país.

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Fernando Camacho, presidente do poderoso Comité Pro-Santa Cruz, um coletivo que reúne de empresários a associações de bairros, pediu um “bloqueio do país”.

A influente plataforma civil Conade, que agrupa comitês cívicos bolivianos, anunciou também uma “resistência civil” ante a possível vitória de Evo. O líder Waldo Albarracín, que recebeu um golpe na cabeça durante uma briga de rua com oficiais, denunciou uma “fraude monumental” e convocou “o povo a ficar em alerta”.

Ante o clima de violência, a Igreja Católica pediu “paz e serenidade” e pressionou o tribunal eleitoral do país “a cumprir com seu dever de árbitro imparcial”.

Suspeitas de fraude

O Tribunal Eleitoral da Bolívia retomou nesta segunda-feira, 21, a apuração preliminar e indicou uma vitória de Evo Morales no primeiro turno. A contagem havia sido interrompida no domingo (20), sem explicação, provocando suspeitas de fraude e reclamações de opositores e da Organização dos Estados Americanos (OEA). O anúncio desencadeou confrontos em La Paz.

Com o anúncio, milhares de pessoas ocuparam as ruas nas principais cidades do país. Em Sucre, uma multidão enfurecida incendiou a fachada da sede do tribunal eleitoral da cidade, fazendo a polícia de choque recuar, e ocupaou o prédio, segundo o jornal Correo del Sur. Em Oruro, no sul do país, centenas de jovens tentaram ocupar a sede do tribunal eleitoral, mas foram dispersados pela polícia, revelou o portal Doble Impacto.

Em Cochabamba, na região central, os manifestantes romperam o perímetro de isolamento do local de apuração, mas foram contidos pela polícia, informou o Opinión.

Em La Paz, grupos de opositores protestavam nas ruas e acusavam o tribunal eleitoral de fraudar a apuração para beneficiar Morales, enquanto partidários do presidente comemoravam sua reeleição no primeiro turno.

Os resultados preliminares TREP são um procedimento estatístico criado para tentar prever o resultado das eleições. O TSE havia suspendido a contagem com o argumento de que a apuração oficial havia começado e não fazia sentido investir tempo na apuração provisória.

Na noite de domingo, um primeiro boletim da contagem rápida, com 84% dos votos apurados pelo TREP, dava 45,28% a Evo e 38,16% a Mesa, mas o escrutínio foi paralisado até a tarde desta segunda-feira, provocando protestos de Mesa e dos observadores da OEA. Além disso, países como Brasil, Argentina e Estados Unidos pediram a reativação do TREP.

Mesa disse mais cedo nesta segunda que os resultados do TREP garantiriam um segundo turno contra Evo em dezembro, e denunciou que a situação, em cumplicidade com o TSE, estava tentando manipular os votos. Por este motivo, convocou militantes e a população a se mobilizarem para que seja respeitada a vontade popular.

Na segunda, após quase 24 horas de silêncio, o órgão leu o novo boletim dentro do hotel Radisson Plaza. Imediatamente, lá fora, militantes do partido de Mesa, Comunidad Ciudadana (CC), gritavam “Fraude, Fraude!”, enquanto os governistas respondiam gritando “Assassinos! Assassinos!!”

‘Resistência democrática’

A polícia foi obrigada a usar gás lacrimogêneo para conter os manifestantes. Enquanto isso, Mesa assegurou que não reconhecerá os resultados e convocou os bolivianos para uma “resistência democrática”. O opositor disse que o resultado foi “uma fraude escandalosa” e “uma vergonha”.

“Não aceitaremos essa votação. Foi um resultado arranjado”, disse Mesa, que criticou a paralisação e pediu uma mobilização popular para exigir transparência. “Quero denunciar que o governo está tentando evitar um segundo turno.”

A oposição garante que apurações independentes mostravam um resultado diferente. “A partir de todas as contagens rápidas independentes, estamos no segundo turno com uma diferença inferior a 5 pontos porcentuais. O que está acontecendo é grave, ao ponto de observadores da OEA fazerem um alerta, perguntando por que a recontagem tinha sido interrompida. Não podemos aceitar que se manipule um resultado que nos leva ao segundo turno, que deve ser realizado de qualquer maneira”, disse Mesa.

O que aumentou a suspeita de fraude foi a paralisação de quase 24 horas na apuração preliminar, quando parecia que a eleição seria definida no segundo turno. O presidente, há 14 anos no poder, nunca disputou um segundo turno. Hoje, o governo da Bolívia aceitou uma missão de acompanhamento da apuração de observadores da Organização dos Estados Americanos.

A missão “rechaçou” a interrupção da apuração de votos na região de Potosí, no sudoeste da Bolívia, onde foram registrados protestos contra o órgão eleitoral diante dos temores de fraude em benefício de Evo.

Os protestos obrigaram o Tribunal Departamental a suspender a apuração de votos na cidade, e veículos de comunicação locais revelaram que policiais se deslocavam da vizinha Sucre a Potosí, sem que o governo tenha confirmado ou informado as razões deste deslocamento.

“A Missão de Observação Eleitoral da #OEAnaBolivia rejeita a interrupção da contagem definitiva no Tribunal Eleitoral Departamental (TED) de Potosí e faz um apelo a que se retome para dar certeza à cidadania. Urgimos que estes processos se realizem de forma pacífica”, destacou a organização no Twitter.

O tuíte foi publicado horas depois de o Ministério das Relações Exteriores informar, pela mesma rede social, que o chanceler Diego Pary e os observadores da OEA “acordaram estabelecer uma equipe de acompanhamento permanente no processo de contagem oficial de votos”.

A missão da OEA celebrou uma reunião “com o Tribunal Supremo Eleitoral (TSE) e transmitiu-lhe a necessidade de manter informada a cidadania sobre os passos seguintes na entrega dos resultados”. (Com agências internacionais).