Auditorias secretas às quais o jornal O Estado de S. Paulo teve acesso alertaram para suspeitas de irregularidade na Missão de Paz no Haiti (Minustah), criada em 2004 e, desde então, sob o comando militar do Brasil. Entre os problemas identificados, há contratos superfaturados, pagamentos de serviços sem nota fiscal e licitações com suspeita de favorecimento de uma das empresas que obtiveram um contrato milionário.
Dois anos depois do início da missão, um primeiro relatório interno da ONU apontou as primeiras irregularidades. Numa carta de 20 de março de 2006 a Juan Gabriel Valdés, então representante especial do secretário-geral da ONU, Kofi Annan, a Divisão de Auditoria Interna revela sua preocupação com o que encontrou no Haiti. Uma das constatações foi que, dos US$ 8,4 milhões pagos pela Minustah a fornecedores locais, US$ 3,8 milhões foram feitos sem contrato escrito.
Outro alerta: as empresas fornecedoras estão “inflando recibos”. Foi o caso da Haytian, que teria fornecido seus produtos com um ágio de 87% em comparação aos preços estabelecidos pelo governo. Segundo a auditoria, a empresa “começou a cobrar esse exorbitante valor adicional desde outubro de 2004, quando a missão estava iniciando as exigências por um plano de produção de energia”. De acordo com a auditoria, o preço extra cobrado pela empresa levou a ONU a perder aproximadamente US$ 452 mil entre junho de 2004 e janeiro de 2006.
No mesmo relatório, os auditores revelam que a Minustah pagou US$ 7 mil por um serviço que foi realizado pelos próprios funcionários da ONU, além do gasto de US$ 56 mil para a compra de espaços nas rádios e camisetas sem a autorização do Departamento de Licitações.
Outro problema identificado foi com a compra de combustível para os mais de 2 mil carros, caminhões, tanques e aviões da ONU que estavam no país de 2005 a 2006. Dessa vez, a informação faz parte do relatório da Divisão de Auditoria Interna da ONU que foi publicado no dia 11 de janeiro de 2007.
A constatação é que mecanismos para evitar fraude nos combustíveis dos tanques não foram plenamente adotados. “Uma série de irregularidades ocorreu no processo de licitação de compra de combustíveis”, afirma o documento. “A confidencialidade das propostas (das empresas que concorreram à licitação) não foi preservada e, no geral, faltou integridade ao processo”, alerta o documento. Houve, segundo a análise, favorecimento de uma das empresas, a Dinasa, que conseguiu um contrato de US$ 8,7 milhões.
Na licitação para um dos contratos, as empresas Total, Dinasa e Skylink se apresentaram. “A Total ofereceu um preço muito menor que a oferta da Dinasa. Portanto, a Total deveria ter ganhado a licitação”, afirmou a auditoria, sobre a primeira rodada de ofertas. Um motivo para isso, conclui o relatório, seria o acesso a “informações internas” da ONU.
Procurada pelo Estado, a agência responsável pela auditoria confirmou ter investigado o caso, mas se recusou a dar mais detalhes. Em Nova York, a ONU constatou novas suspeitas. “Os pagamentos (feitos pela missão) aos vendedores (de combustível) não eram embasados. Documentos necessários para justificar pagamentos não eram transmitidos para a Seção de Finanças”, diz o documento. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.