Durante muito tempo, o serviço de assistência social no País foi usado apenas como uma forma de garantir o clientelismo e o controle das classes menos favorecidas. Hoje, o perfil deste serviço é outro. Está engajado em políticas públicas que procuram devolver a autonomia e a dignidade para as pessoas.
Cursos de capacitação que ajudam a garantir uma renda mínima para a sobrevivência são bons exemplos. A população tem acesso a estes serviços através dos Centros de Referência da Assistência Social (CRASs), criados nos municípios a partir de 2004, com a aprovação da Política Nacional de Assistência Social.
Em Curitiba existem 24 CRASs. Todos eles estão instalados em áreas de maior risco social. Em cada posto trabalham duas assistentes sociais, duas psicólogas e dois educadores sociais. A diretora de Proteção Social Básica da Fundação de Assistência Social (FAS), Maria de Lourdes San Roman, explica que as unidades funcionam como a porta de entrada para os vários serviços e benefícios oferecidos pela Prefeitura, governo do Estado, governo federal e até pelo terceiro setor. O Bolsa Família e o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) são exemplos. Os moradores também conseguem obter de graça seus documentos e são encaminhados à assistência jurídica para a realização de testes de DNA que confirmam a paternidade, além de fazer pedidos de pensão alimentícia, entre outros.
Allan Costa Pinto |
Oficinas têm como objetivo estimular pessoas a descobrir seu potencial e a apostar nele. |
Mas, além de oferecer estes serviços, as unidades atuam também na área de prevenção. Algumas vezes, mães desesperadas procuram os postos porque o marido foi embora e elas estão sozinhas e desempregadas para cuidar dos filhos. Para evitar que as crianças venham a ir para a rua ou que sejam encaminhadas para abrigos, a mãe é encaminhada para cursos de capacitação e uma agência de recursos humanos, e os filhos para um contraturno escolar. Até que a situação se estabilize, a família pode receber cestas básicas.
Na unidade também são oferecidas oficinas, que além de ensinar uma atividade para ajudar na renda mensal, também procuram resgatar a cidadania. A assistente social Lidiane Oliveira Bonamigo de Souza diz que, durante as oficinas, procura-se estimular a pessoa a descobrir o seu potencial e a apostar nele. ?Trabalhamos com a promoção social, não mais com o assistencialismo. O CRAS é a porta de entrada, mas ele também tem a de saída. Com as orientações e os programas oferecidos procuramos fazer com que as pessoas resgatem sua autonomia?, fala. Na unidade também há uma horta comunitária e grupos da terceira idade, entre outras atividades.
Assistentes sociais fazem a mudança
O serviço de assistência social surgiu no País na década de 1930 e até 1970 carregou um perfil assistencialista e clientelista. As ações não procuravam tirar as pessoas da situação de miséria porque era vantajoso mantê-las desmobilizadas. O sistema garantia votos. Em 1980, o perfil começou a mudar. A profissão de assistente social atraiu intelectuais que se aproximaram da classe trabalhadora e mudaram o foco de atuação.
Segundo a conselheira do Conselho Federal de Serviço Social, Jucimeri Isolda Silveira, no plano ético-político os assistentes sociais passaram a fundamentar suas práticas em valores libertários e democráticos, e a defender os direitos como um meio para reduzir as injustiças e desigualdades sociais, econômicas, políticas e culturais. Os profissionais da área passaram a defender, então, políticas sociais articuladas com a política econômica para a geração de trabalho e enfrentamento da exclusão do acesso aos bens e serviços, além de reformas estruturais que desconcentrem renda e riqueza.
A diretora do curso de assistência social da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Maria Izabel Pires, explica que o serviço social ganhou mais força em 2004, com a criação da Política Nacional de Assistência Social (PNAS) e do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Foram instituídas duas formas de proteção: a básica e a especial.
A básica é desenvolvida pelos CRASs, que ficam localizados em áreas de maior pobreza e outras vulnerabilidades sociais, como a violência sexual contra crianças e o abandono. Atua mais na prevenção. Já a especial é destinada a pessoas que tiveram seus direitos violados e perderam o vínculo familiar, como os moradores de rua.
A PNAS também veio para organizar o trabalho desenvolvido pelas diversas entidades que trabalham na área social, como as ONGs e até mesmo instituições públicas. No Paraná, dos 399 municípios, 164 se habilitaram ao SUAS e possuem no mínimo um CRAS.
Programa quadriplica renda na Vila Verde
Allan Costa Pinto |
Neiva: ganho mensal saltou de R$ 100 para R$ 400. |
Na Vila Verde, em Curitiba, a área de abrangência do CRAS é de 3.500 famílias – com renda máxima de três salários mínimos. Mas a maioria atendida pela unidade ganha apenas meio salário mínimo. A família de Neiva Carrilo da Silva, 37 anos, se encaixa neste perfil. Ela conta que tem sete filhos e a sua renda era de R$ 100. Agora, graças às oficinas, ela conseguiu aumentar o seu ganho mensal para R$ 400. Diversificou a produção e, além de flores de meia de seda, também vende bonecas de pano e de porcelana. ?Com mais dinheiro também posso comprar matéria de maior qualidade?, comenta.
A filha mais velha, de 15 anos, também foi encaminhada para o programa Agente Jovem, do governo federal. Ela recebe R$ 67 por mês e participa de atividades que buscam resgatar a cidadania e estimular os jovens para que sejam protagonistas dentro da própria comunidade, repassando informações sobre AIDS, DST e sexualidade. ?É bom porque o programa incentiva que ela continue estudando. Com o estudo está difícil, imagine sem?, fala Neiva, que estudou apenas até a 4.ª série. Saiu da escola para cuidar dos irmãos mais novos para que a mãe pudesse trabalhar.