Foto: Lucimar do Carmo/O Estado

Existem animais sem proprietário e sem lar de referência que são bem aceitos pela comunidade, não representando risco algum.

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A forma como cães e gatos de rua são capturados pelos carros da carrocinha e a maneira como eles são tratados em alguns centros de controle de zoonoses e vetores de todo País muitas vezes preocupam médicos veterinários e integrantes de organizações não governamentais voltadas à proteção de animais. No início deste mês, o assunto foi tema de um curso realizado no Centro de Controle de Zoonoses de São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba.

Promovidas pela UFPR e pelo Instituto Nina Rosa, uma organização não governamental de São Paulo, as aulas foram ministradas a funcionários de prefeituras que trabalham com a captura de animais de rua e tinham como objetivo principal a conscientização dos mesmos em relação à humanização do tratamento dado aos bichos.

?A intenção é dar informações a pessoas que trabalham em carrocinhas para que elas não sejam laçadoras de animais, mas agentes comunitárias?, diz a médica veterinária e integrante do Instituto Nina Rosa, Rita de Cássia Garcia. ?Os funcionários dos centros de zoonoses precisam entender de comportamento e fisiologia animal para poder avaliar se determinado cão ou gato precisa realmente ser retirado da rua e de que forma isto deve ser feito.?

Rita conta que, em muitas cidades, os trabalhadores da carrocinha são mal vistos pela comunidade.

Rita conta que, em muitas cidades do Brasil, os trabalhadores da carrocinha são mal vistos pela comunidade pela forma que laçam os animais nas ruas e os colocam dentro dos veículos. Por isso, com medo de serem agredidos, acabam tendo que exercer suas funções antes do nascer do sol. Em todo Brasil, existem casos de profissionais que, durante a captura de animais, foram alvo de agressões verbais e físicas, como pedradas e mesmo tiros.

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?Dando aos trabalhadores uma visão mais humanitária sobre o trato de animais de rua, também pretendemos fazer com que os funcionários dos centros se tornem mais próximos da população, explicando para as pessoas como é o trabalho que exercem, qual a importância do mesmo e porque foram chamados para capturar determinado animal?, afirma a veterinária da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo e uma das coordenadoras do curso realizado em São José dos Pinhais, Adriana Vieira.

Adriana: ?pretendemos fazer com que os funcionários se tornem mais próximos da população?.

Tanto Adriana quanto Rita defendem a idéia de que nem todos os cães e gatos que vivem nas ruas precisam ser retirados das mesmas. Segundo elas, existem animais sem proprietário e sem lar de referência que são bem aceitos pela comunidade, não representando risco algum. ?Acreditamos que só devem ser levados para os centros de zoonoses e sacrificados os animais que representam risco a áreas de proteção ambiental, que são agressivos e podem ferir pessoas ou outros bichos, que tenham alguma doença incurável ou algum tipo de enfermidade que não possa ser tratada pelo próprio serviço público municipal.?

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A realidade atual de muitos municípios, de acordo com as veterinárias, é bastante diferente. Em muitos centros de controle de zoonose, são capturados quaisquer cães e gatos presentes nas ruas. Os bichos são deixados alguns dias à espera dos donos e posteriormente acabam sendo sacrificados através da utilização de métodos coletivos (como inalação de gás), mesmo não estando doentes ou sendo pacíficos.

Captura deve ser feita aos poucos

No decorrer do curso, os palestrantes orientaram os funcionários dos centros de zo- onoses sobre a melhor forma de lidar com os animais retirados das ruas desde o momento da captura até a hora do sacrifício.

A captura, de acordo com Rita, deve ser feita aos poucos e não num único dia. A veterinária condena a atitude de laçar cães e gatos pelo pescoço e acredita que seja importante os agentes comunitários que trabalham em carros da carrocinha ganharem a confiança dos bichos antes de capturá-los.

?A captura através do laço, na qual os animais recebem um tranco no pescoço e são arrastados para dentro dos veículos, não é considerada humanitária, pois gera muito estresse aos bichos e costuma ser mal vista pela comunidade. O ideal é que os agentes ganhem a confiança dos animais antes de capturá-los. Isto não costuma ser difícil, sendo que muitos dos bichos que vivem nas ruas já tiveram donos, são mansos e socializados.?

Para ganhar a confiança dos animais, é indicado que, no decorrer de alguns dias, os agentes se aproximem dos mesmos de forma pacífica e até lhes ofereçam alguns petiscos. Desta forma, cães e gatos passam a conhecê-los e entendem que eles não lhes representam risco, aproximando-se de maneira voluntária. Quando a aproximação estiver efetivada, os agentes devem pegar o animal no colo, passar-lhe uma guia no pescoço e, se necessário, amordaçá-lo de maneira que ele não seja machucado. A utilização de armadilhas, como as feitas com gaiolas, também pode ser eficiente em alguns casos, mas desde que o animal não corra qualquer risco de sair ferido. Para atraí-lo, alimentos podem ser uma boa opção.

?A captura humanitária evita o sofrimento dos animais e ao mesmo tempo facilita o trabalho de quem os captura. Quando estão com medo, tanto os cachorros quanto os gatos liberam cheiros que avisam outros animais de que naquele local existe uma situação estressante. Desta forma, os indivíduos que sentem o odor são avisados de que existe perigo e também ficam estressados, mostrando-se mais arredios e dificultando a própria captura.?

Maneira de transportar preocupa bastante

No que diz respeito ao transporte dos animais nos veículos da carrocinha, Rita e Adriana informam que os indivíduos capturados não podem ser levados soltos dentros dos carros, correndo risco de se machucar em caso de freada ou manobra brusca feita pelo motorista. O indicado é que felinos e cães sejam conduzidos em caixas de transporte individuais, como as encontradas à venda em pet shops e as utilizadas quando animais de estimação são levados de um local a outro por companhias aéreas. O fato de os bichos serem colocados em compartimentos individuais também evita que eles possam brigar e acabar se ferindo com arranhões e mordidas.

Ao chegar ao centro de controle de zoonoses e vetores, as médicas veterinárias explicam que não é recomendado que um grande número de animais seja mantido num mesmo espaço físico. Nos centros, todos os bichos (mesmo os que precisarão ser sacrificados) devem contar com água, comida, realizar passeios, tomar banhos e pegar sol diariamente. O local deve ser silencioso e contar apenas com funcionários que apreciem a companhia de cães e gatos. ?Os bichos saudáveis devem ser disponibilizados para adoção ou ser levados para entidades de proteção animal. Não é recomendado enviá-los para centros de pesquisas, mesmo que estes os solicitem?, comenta Rita.

Eutanásia

Quando o sacrifício de um cão ou gato for necessário, ele deve ser realizado da forma mais tranqüila possível. Embora a utilização da câmara de gás (na qual os animais morrem pela inalação de CO ou CO2) seja aceita como um método indolor pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária, pessoas que trabalham com a humanização no trato de animais defendem o uso de método individual. ?O melhor é que a eutanásia ocorra por injeção letal (que provoca parada cardíaca e respiratória), após o animal ter sido anestesiado e ter perdido a consciência. Isto contribui com o bem-estar tanto do animal quanto do profissional que realiza o procedimento?, finaliza Adriana.