Encontramos texto disponibilizado em site do Ministério da Justiça(1), onde a dr”. Rosa da Cunha, diretora do Departamento Nacional de Trânsito, em entrevista à repórter Renata Menezes, com muita lucidez e coragem, comenta os termos da Resolução n.º 141, do Contran, expressando, até com uma certa indignação, a indústria de multas que instaurou-se com a regulamentação dos radares eletrônicos.
Por cuidar-se de posição inusitada, considerando que é manifestação de mandatária maior de órgão de trânsito, inclusive com enorme carga crítica e orientadora, entendemos importante transcrever dita matéria em sua integra. Verbis:
“A nova resolução que regulamenta o uso de radares eletrônicos no trânsito foi publicada em 16/10 no Diário Oficial da União. Para a diretora do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), Rosa da Cunha, os principais pontos da medida são: controle na emissão do comprovante de infração, o que obriga a alteração dos contratos de terceirização; o estudo que os órgãos de trânsito terão de apresentar para justificar a fixação dos radares e a presença de agentes de trânsito na operacionalização dos equipamentos não-fixos.
A diretora como funcionária a Resolução que recebeu o número 141.
Fala-se muito em combater a indústria de multas. Como funciona essa “indústria”?
As empresas ganham com base na quantidade de multas aplicadas ou em percentual definido por infração registrada. Em São Paulo, por exemplo, foram aplicadas, no ano passado, 240 mil multas ao mês, segundo dados da Prefeitura. A empresa recebeu de R$ 19,56 a R$ 40,35 por auto de infração. A média mensal embolsada pela empresa foi de R$ 5 milhões só na cidade de São Paulo. Daí o interesse das empresas em multar, o que caracteriza a indústria da multa. Quanto maior o número de multas, maior o lucro. Essas regras foram mudadas para salvaguardar o direito do cidadão. Os equipamentos devem ser usados para reduzir índices de acidente e não como fonte de arrecadação de empresas e órgãos públicos.
A Resolução 141, então, elimina a autuação indiscriminada? Quais foram as mudanças nessas regras?
A principal mudança é a que se refere ao comprovante de infração, atingindo os contratos com as empresas. A partir de agora, os contratos entre os órgãos de trânsito (Detrans e prefeituras) não podem mais estabelecer cláusula remuneratória com base em percentual. Com a mudança das regras, os órgãos e empresas serão forçados a adequar os contratos, porque qualquer multa registrada com base nos contratos antigos não terá validade. Isso torna os contratos por produtividade inócuos. Os acertos terão de ser outros, evitando o ganho com comissão que estimula a indústria da multa.
Quais os critérios utilizados hoje pelos órgãos de trânsito para a fixação dos radares?
Não existem critérios. Com a Resolução 141, os órgãos de trânsito terão que demonstrar, através de estudos estatísticos, no prazo de 180 dias, a necessidade de instalação dos equipamentos, considerando a acidentalidade e se o local é ponto de risco. Esses estudos devem ser disponibilizados aos Conselhos Estaduais de Trânsito para avaliação e fiscalização. Esses conselhos são compostos por representantes do governo e da sociedade.
O estudo é só para os radares fixos? Se os estudos apontarem para a retirada da algum radas fixo, os órgãos de trânsito poderão substituí-lo por radares móveis?
Os estudos são obrigatórios para todos os tipos de radares. Para manter um radar móvel em determinado ponto, terá que ser feito um mapeamento prévio para comprovar que naquele local há necessidade de um aparelho para reduzir a velocidade. Em relação a esse ponto, as regras mudam também, porque a instalação dos aparelhos deixa de ser aleatória, afastando o intuito de apenas multar e não corrigir os problemas de acidentalidade e engenharia de tráfego.
A Resolução 141 diz que, excetuando-se os radares fixos, os demais devem ser operados com a presença de agente de trânsito. Como fica a situação das empresas terceirizadas?
Os equipamentos só poderão ser operados com a presença de agentes de trânsito – policial e servidores públicos que forem nomeados agentes por publicação de portaria, para assegurar o acompanhamento pela sociedade. Não podemos permitir que as empresas coloquem funcionários para trabalhar autuando como se o trânsito fosse mais uma fatia do mercado.
Então, quem foi multado por essas empresas, com equipamento operado por funcionários, pode recorrer da multa?
Sim. Cabe recurso se o radar estava sendo operado apenas por funcionário da empresa, porque o Código de Trânsito Brasileiro não permite civis autuando como agente de trânsito, exceto os funcionários públicos nomeados para a função.
A partir de agora, os radares terão obrigatoriamente o registrador de imagem. Como fica a autuação da Polícia Rodoviária Federal que opera com aparelhos que só registram a velocidade?
A Polícia Rodoviária Federal e outros órgãos de trânsito poderão solicitar ao Denatran, mediante justificativa, no prazo de até 12 meses para se adequarem a essa nova regra.
Como funciona o radar eletrônico? Quem aprova e afere o equipamento?
São vários tipos de tecnologia. O equipamento deve ser homologada e aferido pelo Inmetro antes de ser instalado e sofrer revisão a cada 6 meses ou quando houver alteração de seus componentes.
Será obrigatória a sinalização nos locais de fiscalização? Em que distância?
Sim, os equipamentos só poderão ser instalados em vias complemente sinalizadas. A nova resolução determina as distâncias adequadas para evitar oscilação de velocidade, impedindo a existência das famosas “pegadinhas”. Nesse sentido, houve mudança significativa em relação às vias rápidas. No caso de oscilações de velocidade numa mesma via, a distância entre dois radares deverá ser de, no mínimo 5 km. Ou seja, se o equipamento for instalado, por exemplo, em um ponto com velocidade de até 60 km, para instalar outro aparelho em um trecho seguinte de 80 km, deverá existir distância de 5 km entre os dois radares. Isso elimina totalmente a possibilidade de armadilhas para o motorista.
Além do registro da imagem, o que deverá constar nos novos autos de infração.
A identificação do agente que opera o equipamento (exceto os fixos), horário, data e local da infração, velocidade máxima admitida na via, a identificação do aparelho e a data da aferição ou revisão pelo Inmetro. O comprovante emitido pelo aparelho deverá ser homologado pela autoridade de trânsito antes de ser enviado para o ususário. É importante verificar o registro dessa homologação no documento.
Qual o prazo para os órgãos de trânsito adaptarem os autos de infração?
Imediato.
Quem foi multado e o auto não conter esses dados, como deve proceder? A multa será válida?
A multa será considerada inválida porque contraria as regras. Caso haja desobediência do órgão, o usuário deve recorrer às Juntas Administrativas de multas dos Detrans e Prefeitura. Caso seja indeferido, deve recorrer ao Conselho Estadual de Trânsito que é a última instância. Se em todas as instâncias de trânsito o recurso for indeferido, ainda é possível apelar ao Ministério Público e à Justiça.
Quem fiscaliza o cumprimento das novas regras?
Das regras gerais da Resolução, o Contran, os Conselhos Estaduais de Trânsito e o Denatran. Especificamente em relação aos contratos, a fiscalização é dos Tribunais de Contas dos municípios e estados e Ministérios Públicos. Mas a sociedade deve estar ciente de seus direitos e protestar quando violados.”
Sem dúvida, esta posição da Diretora do Denatran representa exatamente aquilo que a população está sentindo sobre esta matéria, onde, o que o Código de Trânsito Brasileiro previu caráter educativo, transformou-se em “fome” arrecadatória, inclusive criando-se verdadeiras armadilhas para os motoristas inconscientemente cometerem infração.
Esperamos que este grito seja apenas o início de insurgimento contra procedimentos adotados para autuação de motoristas, em completo desatendimento ao princípio da legalidade. E como disse a diretora do Denatran, cabe ao Ministério Público fiscalizar esta “fome” arrecadatória.
(1) Site do Ministério da Justiça – www.mj.gov.br
Jorge Vicente Silva é pós-graduado em Pedagogia a nível superior, pela PUC/PR e especialista em Direito Processual Penal, também pela PUCPR, e autor de diversos artigos e livros, inclusive já na 2.º Edição a Livro “Tóxicos” – Manual Prático – Respostas às dúvidas surgidas com a Lei n.º 10.409/02.