A entrada em vigor do Código Civil de 2002, em 11 de janeiro de 2003, tem gerado inúmeros debates e discussões, sendo que dentre as questões que têm ensejado grande polêmica, sem dúvida, o tema atinente à multa devida pelo atraso no pagamento das quotas condominiais, mostra-se bastante controvertido.
Antes do advento do referido diploma legal, as questões referentes ao condomínio em edificações, também chamado de condomínio edilício eram reguladas exclusivamente pela Lei 4.591/64, que no tocante à multa incidente sobre o inadimplemento quanto à contribuição para as despesas de condomínio previa, em seu artigo 12, § 3.º, juro moratório de 1% ao mês, e multa de até 20% (vinte por cento) sobre o débito do condômino inadimplente.
Após a vigência do Código Civil de 2002, a multa para o atraso no pagamento da taxa condominial passou a ser de até 2%, tendo sido mantido o juro moratório de 1% ao mês. É inquestionável a polêmica instaurada pela regra estabelecida pelo artigo 1.336, § 1.º, do Código Civil em vigor, vez que a redução da multa a um percentual tão baixo, sem dúvida, desestimula o pagamento pontual, diante da crise econômica enfrentada em nosso País.
Dentre as justificativas para a fixação da multa moratória em patamar tão reduzido, está a tentativa de evitar a aplicação de penalidades rígidas, que em determinadas situações, podem caracterizar enriquecimento ilícito, como seria o caso do condômino, que por estar em atraso no pagamento da taxa condominial por dois ou três dias, era compelido ao pagamento de multa de 20% sobre o valor de seu débito, penalidade essa, que também era aplicável ao condômino, que não paga suas despesas condominiais há mais de um ano.
Diante desse contexto, o legislador ao tentar atenuar a penalidade que era aplicada à impontualidade eventual e esporádica, por via oblíqua, acabou por incentivar o inadimplemento reiterado do pagamento das quotas condominiais, que de acordo com informações do setor imobiliário, está perto dos 30% em todo País. Diante de punição com percentual tão reduzido, a despesa condominial será a última a ser lembrada, quando não “esquecida”, por aquele que enfrenta uma situação de crise econômica.
Vale ressaltar, que o atraso no pagamento das despesas condominiais não afeta somente o condômino impontual, mas todos aqueles que residem no condomínio, que muitas vezes são forçados a arcar com o aumento da taxa condominial, resultante do rateio do valor da dívida dos inadimplentes, para que o condomínio possa honrar com seus compromissos trabalhistas, com fornecedores, bem como para repor o fundo de reserva do próprio condomínio, que precisa ser utilizado quando há altos índices de atrasos no pagamento das despesas condominiais.
Dessa forma, em decorrência da grande inadimplência no pagamento das quotas condominiais, no último dia 8 de julho foi aprovado, pelo Senado Federal, o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados n.º 2.109/99 que, entre outras providências, altera o artigo 1.336, IV, § 1.º, do Código Civil de 2002, para permitir a cobrança de multa de 0,33% ao dia, limitada a 10%, sobre atrasos na taxa condominial, além de juros moratórios pactuados na Convenção Condominial, ou de 1% ao mês se estes não estiverem definidos na convenção.
Referido Projeto de Lei aguarda sanção por parte do Presidente da República, contudo, destaca-se desde já a importância da majoração da multa condominial como mecanismo de tentativa de diminuição da inadimplência.
Cumpre ressaltar que a nova redação dada ao artigo 1.336, IV, § 1.º, do Código Civil de 2002 vai ao encontro da intenção original do legislador, no sentido de amenizar a penalidade para a inadimplência eventual, vez que ao estabelecer a sistemática de “multa diária progressiva” (de 0,33% ao dia, limitada ao total de 10%), favorece o devedor eventual, de boa-fé, uma vez que minimiza a incidência da multa em relação diretamente proporcional à celeridade no adimplemento do débito em atraso.
Nesse sentido, a título ilustrativo, um condômino que esteja em atraso, por 7 (sete) dias, incorrerá em multa correspondente a 2,31% sobre o seu débito (7 x 0,33%), ao passo que um condômino em mora por período equivalente a 30 (trinta) dias (prazo esse que evidencia a ausência do caráter de mera impontualidade e eventualidade) incorrerá em multa significativamente superior, correspondente a 10% (30 x 0,33%).
Cabe ainda destacar, que de acordo com recentes decisões de nossos Tribunais, a regra contida no artigo 1.336, IV, § 1.º, do Código Civil de 2002 não se aplica quando existir previsão de multa, estabelecida antes da vigência do referido diploma legal, na Convenção de Condomínio, mesmo que em percentual maior a 2%, observado o limite de 20% previsto no artigo 12, § 3.º, da Lei 4.591/64.
A nova sistemática estabelecida no Projeto de Lei manteve a sujeição do condômino impontual aos juros moratórios convencionados, o que permite a interpretação no sentido de que a multa de até 20% e os juros moratórios de 1% ao mês, estabelecidos em Convenções de Condomínios anteriores à vigência do Código Civil de 2002 continuarão a ser aplicados. Por outro lado, os condomínios cujas convenções não tenham fixado penalidade, para o atraso no pagamento das despesas condominiais, bem como aqueles que não possuem convenção aprovada, ou ainda, aqueles constituídos após 2002 deverão aplicar a nova regra.
Verifica-se, portanto, que a previsão da multa condominial sob a sistemática de majoração diária progressiva funcionará como eficiente mecanismo, para estabelecer a aplicação isonômica da penalidade à inadimplência condominial, possibilitando, nesse sentido, a diferenciação de tratamento entre os devedores meramente impontuais e eventuais, daqueles que estão de má-fé. Todavia, resta a dúvida acerca da eficiência do novo regime, no que tange à solução definitiva para a inadimplência reiterada dos maus pagadores, vez que, a prática ensina que somente por meio de elevada penalidade pecuniária, estes passarão a honrar suas dívidas.
Aline Cristina de Miranda
é advogada.