Não há como negar que os altos índices de criminalidade no Brasil, inclusive os de colarinho branco, são resultado de problemas de ordem social que se agravam e governo algum trabalhou firme e eficientemente para resolvê-los. Chegamos a uma situação insustentável em que os homens de bem (e eles ainda existem e são maioria!) são obrigados a se recolher, reclusos por detrás de grades em suas casas e escritórios, numa vã tentativa de escapar dos riscos de viver no mundo cão em que se transformaram nossas grandes cidades.
Entretanto, enquanto se espera, com cada vez maior desesperança, reformas políticas, econômicas e sociais que nos dêem um país mais justo e acabem com essa fábrica de violência e crimes, há que se combater as causas marginais ou agravantes, como a impunidade. Impunidade que vige no Brasil há tanto tempo que passou a integrar nossa cultura e a ser tolerada pelos nossos legisladores, policiais e julgadores.
Destes, o primeiro corpo a enrijecer e começar a atuar com maior rigor contra o crime foi o Ministério Público.
O Paraná foi pioneiro quando, ao assumirem o cargo de procurador-geral de Justiça homens de peso como os saudosos Alcides Munhoz Neto e Ary Florêncio Guimarães, passou a exigir uma seleção rigorosa nos concursos para o ingresso no Ministério Público e um comportamento exemplar dos promotores públicos e procuradores. Em outros estados e na União essa visão do papel que sempre deveria ter sido representado pelo Ministério Público entrou pela contaminação do exemplo. Faltava, entretanto, a assunção da independência que a lei dava à ação desse corpo de defensores da sociedade, mas que ainda se caracterizava por inadequada e fragilizante dependência política. Demorou para que se implantasse a cultura de que o promotor e o procurador, sejam estaduais ou federais, não devem satisfações aos mandantes, sejam governadores, presidentes ou legisladores. Devem, sim, à lei e ao povo que tem neles um sempre presente advogado.
Nos últimos, mas não derradeiros, escândalos que abalaram e ainda abalam a vida pública nacional, a impunidade tem sido a grande vencedora. Falham os governos e os legislativos; falham as leis e até mesmo segmentos do Judiciário, sempre assoberbado e carente de meios para fazer com que os processos andem e os criminosos sejam punidos. E continua presente, em especial no meio policial, o ?jeitinho brasileiro? em que deslizam interesses nada legítimos e a compra de consciências com paga em espécie.
Os ?mensaleiros?, indigitados pela Comissão de Ética no parlamento, foram absolvidos pelo plenário, mas agora enfrentam a ação do Ministério Público à Justiça, sempre que possível romper a couraça da impunidade que gozam com o foro privilegiado. Os sanguessugas parece que do MP também não escaparão. A Procuradoria da República no Distrito Federal, por sua vez, acaba de anunciar que encaminhou à Justiça denúncia contra 116 pessoas envolvidas com a invasão da Câmara pelo MLST (Movimento de Libertação dos Sem Terra), ocorrida com inadmissível violência no dia 6 de junho.
Começamos a entender que ?dura lex, sed lex? e a impunidade não poderão beneficiar eternamente aos que podem comprar a liberdade imerecida com dinheiro ou votos. Falta, seguindo o exemplo do Ministério Público, dar a mesma rigidez e respeitabilidade às leis aos governantes e aos que têm por obrigação interpretá-las e aplicá-las.