Se os princípios morais de um cidadão podem fraquejar, é certo que os dos governos oscilam de acordo com a latitude e a longitude. A rádio BBC, de Londres, comentando a viagem de Lula à África Ocidental, incluindo Camarões, Nigéria, Gana, Guiné-Bissau e Senegal, diz que o Brasil minimiza a corrupção porque está de olho na ONU e na Organização Mundial do Comércio.
Da ONU quer um lugar permanente no Conselho de Segurança, pretensão sempre aplaudida e nunca concedida. Só a China abriu o jogo, dizendo que é contra. A reivindicação já existia nos tempos de Fernando Henrique Cardoso e a concessão de uma cadeira no conselho a um país como o nosso significa dar mais equilíbrio ao órgão da ONU que tem poder de veto. Lá, mandam os grandes. Os mais fracos obedecem ou curvam a cabeça. Trata-se, portanto, de uma importante reivindicação de política internacional e faz bem o governo Lula quando luta por uma vaga.
No que tange aos propósitos comerciais do Brasil, trata-se de uma estratégia para unir os países pobres contra o protecionismo dos países ricos. Estes usam e abusam de subsídios para beneficiar seus produtores e produtos, em detrimento dos nossos, que acabam negociados em desvantagem no mercado internacional. Do que se duvida é se países como os africanos referidos têm algum peso econômico e político representativo para, somando-se ao Brasil, engrossar o nosso arsenal de armas para arrancar um comércio mais justo e equânime. Ficaremos com pouco mais do que arco e flecha, pois Camarões, Gana, Guiné-Bissau, Senegal e Nigéria (este um país com um pouco mais de expressão comercial) têm pouquíssimo significado no comércio global. Pouco produzem, pouco comerciam, mais precisam do Brasil do que podem nos beneficiar e são, em geral, governados por grupos corruptos. Mais corruptos que os que por aqui vicejam.
O ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, entende que a viagem à África pode levar a negócios de mais de US$ 1 bilhão. Acrescentou que podemos vender equipamentos e aviões, e cooperação na área agrícola, por exemplo. Um bilhão é quase nada, tanto mais se compararmos esse número com a doação de US$ 500 mil que o Brasil pretende fazer, para reestruturação das forças armadas de Guiné-Bissau, um país de língua portuguesa. O ministro Celso Amorim adverte que essa ajuda será para reestruturação e que não significa que lhes daremos armas. E ficamos a pensar se esse dinheiro não faz falta às nossas cada vez mais sucateadas forças armadas.
O governo brasileiro, sem capacidade para se aliar aos grandes, está imaginando montar uma miniforça-tarefa com os pequenos, fechando os olhos para seus governos corruptos e para a pequenez dos negócios que possam nos oferecer. Tudo para que o Brasil tenha assento no Conselho de Segurança da ONU e apareça perante o mundo como líder dos pobres. Há alguma vantagem efetiva nisso?