A bancada do populismo penal (a que vende a ideia de que todos os males da insegurança pública podem e devem ser resolvidos com mais leis punitivistas e exemplares) sofreu uma grande derrota: Lula vetou em quase sua totalidade o projeto de lei sobre monitoramento eletrônico do preso, aprovado em maio de 2010, pelo Congresso Nacional.

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A redação final contemplada na Lei 12.258/2010 revela sensatez. Foram banidos os excessos estampados no projeto vindo do Parlamento, que pretendia controlar eletronicamente o condenado do regime aberto, os presos recolhidos nos presídios, o liberado condicional, o beneficiário do “sursis” e das penas restritivas de direitos etc.

O caráter populista (eleitoreiro) do projeto era mais do que manifesto, visto que não tangencia o gravíssimo problema da superpopulação carcerária. Criava ônus pesado tanto para o preso quanto para o Estado.

A razão central dos vetos reside na questão dos custos. Feito o expurgo necessário, por força da Lei 12.258/2010 somente é possível o monitoramento eletrônico no caso (a) de saída temporária em regime semiaberto e (b) de prisão domiciliar.

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O monitoramento eletrônico do condenado (ou liberado) pode reduzir o número de fugas (esse é um propósito salutar), mas é caro (cada uso custa de R$ 500,00 a R$ 1.500,00). De outro lado, pode incrementar a estigmatização do liberado, quando visível a pulseira ou tornozeleira eletrônica.

Gerará menos reincidência? Nos países que usam esse tipo de monitoramento comprovou-se o seguinte: se ele é implantado secamente, sem nenhuma estrutura ou acompanhamento de pessoas treinadas, para apoiar o liberado, a redução da reincidência é quase invisível. A lei brasileira, seguindo a linha populista, evidentemente não pensou nessa estrutura de apoio.

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Mas a maior crítica que devemos dirigir contra a lei é a seguinte: não houve previsão (expressa) da possibilidade do monitoramento como medida substitutiva da prisão cautelar.

O monitoramento eletrônico era (e é) muito esperado como substitutivo das prisões cautelares. Há projeto de lei do Governo nesse sentido, que tramita pelo Congresso.

Também o “novo” CPP (que está tramitando nessa Casa Legislativa) contempla a possibilidade de monitoramento eletrônico como medida substitutiva da prisão cautelar.

Nos nossos comentários ao art. 146-D, II, supra (cf. nosso blog), estamos admitindo como hipótese de trabalho (como tese) que poderia o juiz substituir a prisão cautelar pelo monitoramento eletrônico (ou pela prisão domiciliar sob monitoramento eletrônico).

Mas a essa conclusão só se torna possível chegar pela via da inferência, pela analogia (in bonam partem), posto que a lei (art. 146-D, II), muito lacunosamente, falou em “acusado” (cf. nossa argumentação no blog).

Nada mais pertinente do que admitir o monitoramento eletrônico para evitar (ou substituir) a prisão cautelar. O Brasil encerrou o ano de 2009 com 473.626 presos. Apresentava déficit de 167.056 vagas.

Do total, cerca de 43% são presos provisórios, sendo certo que muitos deles poderiam ser beneficiados com a liberdade sob monitoramento eletrônico. A lei do monitoramento eletrônico já publicada, como se vê, ficou no meio do caminho.

Urge que o Congresso Nacional volte ao assunto rapidamente. Não cremos que a Lei 12.258/2010 seja inconstitucional. Mas a aplicação prática do monitoramento eletrônico pode sê-lo, se o juiz não demonstrar, em decisão funamentada, a excepcionalidade e necessidade do seu uso em cada caso concreto. Todas as medidas restritivas de direitos devem se subordinar ao princípio da proporcionalidade.

Luiz Flávio Gomes é doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri, Mestre em Direito Penal pela USP, Diretor-Presidente da Rede de Ensino LFG e Co-coordenador dos cursos de pós-graduação transmitidos por ela. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Twitter: www.twitter.com/ProfessorLFG. Blog: www.blogdolfg.com.br