Ministério pode deixar de considerar crédito fundiário como reforma agrária

O Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) admite que pode deixar de considerar como parte do Plano Nacional de Reforma Agrária o programa de Crédito Fundiário, caso os movimentos sociais rurais brasileiros entrem em acordo nesse sentido. "Nós podemos até fazer isso, mas o plano foi construído com todos os movimentos sociais e, em todas as versões, inclusive a elaborada pelo Plínio de Arruda Sampaio, constava o programa de Crédito Fundiário", disse o secretário executivo do ministério, Guilherme Cassel. "Se os movimentos entrarem em comum acordo e quiserem retirar, não há problema."

O Plano Nacional de Reforma Agrária foi negociado no fim de 2003. Hoje, segundo o MDA, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) e a Federação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Fetraf) apóiam o Crédito Fundiário porque consideram que ele atende a uma parcela específica dos pequenos agricultores.

Na última terça-feira (7), numa entrevista coletiva, a presidente da Fetraf, Elisângela dos Santos, afirmou que a entidade está revendo sua posição, porque está "frustrada" com o andamento do programa. "Ele não tem tido nenhum avanço, principalmente por parte dos estados."

Cassel reconhece o problema da cooperação com os estados, que precisam assinar acordo com o governo federal para que recebam o programa: alguns, conta, colaboram efetivamente, mas em outros, há dificuldades. "O desenho institucional do programa é sofisticado, inclui conselho local, estadual, só que o país é desigual", disse. Ele defendeu o programa da acusação de que não promoveria a efetiva reestruturação fundiária. "No Nordeste, onde o programa prevê certos benefícios adicionais, ele está sim mudando a realidade de alguns locais."

A Via Campesina, rede internacional de movimentos sociais da qual faz parte o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), diz que o Crédito Fundiário opera sob os princípios da chamada "reforma agrária de mercado", proposta pelo Banco Mundial, e por isso o rejeita. "Nosso programa não tem nada a ver com esse conceito", refuta Cassel. "É um mecanismo possível de acesso à terra para um público que não é o dos sem-terra. Mesmo deixando de ser ‘reforma agrária’, poderá continuar existindo porque há uma demanda real por ele", completou. Para o secretário, o Crédito Fundiário pode passar a integrar o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), por exemplo.

Na segunda-feira (6), a Rede Terra de Pesquisa Popular apresentou dados preliminares de um levantamento para mostrar que especialmente os programas que antecederam o crédito fundiário até 2002, antes de sua reestruturação no atual governo, estão deixando rapidamente endividados muitos dos agricultores cujos contratos estão ultrapassando o período de carência agora ? porque sem assistência técnica e apoio para a produção, eles continuam pobres e incapazes de obter renda para saldar os empréstimos.

Os pesquisadores alertaram que é preciso dar uma solução rápida para o problema. Cassel também admitiu a possibilidade de se perdoar a dívida desses agricultores, incluindo-os na reforma agrária. "Só que vamos ter de separar o joio do trigo", explicou, em referência ao fato de que estão ocorrendo auditorias em "quase 100%" dos contratos do antigo programa Banco da Terra. Os movimentos sociais da Rede Terra denunciam que boa parte dos beneficiados pelo Banco da Terra não era pobre e burlou as regras do programa para conseguir empréstimo barato para comprar terras.

De acordo com o 2º Plano Nacional de Reforma Agrária, do assentamento de 1 milhão de famílias previsto para acontecer até o fim de 2006, 100 mil conseguiriam seu lote por meio do crédito fundiário. Outras 400 mil deverão ser assentadas a partir de desapropriações e 500 mil por meio da regularização fundiária, ou seja, a titulação de terras de posseiros, principalmente na Amazônia.

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