O deputado João Paulo Cunha (PT-SP), que preside a Câmara Federal e que, até aqui, revelou-se irrepreensível, o que não significa vacinado contra erros, mandou a Corregedoria da Casa e a sua Procuradoria investigarem denúncias de pagamento pelo governo de mensalidades, a congressistas, em troca de sua fidelidade. A denúncia foi feita pelo Jornal do Brasil. A mesada, apelidada de “meslão”, seria a distribuição de cargos e verbas, mensalmente, para deputados e senadores que se comprometessem a votar com o governo nas questões controversas, em que este estivesse ameaçado de perder. Exemplo, e apenas exemplo: a taxação dos inativos na reforma da Previdência, que tudo indicava iria ser rejeitada. Foi aprovada. Em casos como tais, os deputados reticentes (ou negociantes) receberiam “meslões” ou mesadas, a paga pelo voto nos moldes desejados pelo governo.

Nada está provado. Desnecessário provar o óbvio ululante. Desta ou de formas diversas, a compra de votos sempre existiu neste País, em todos os governos, em todas as épocas. Todo mundo sabe, mas ninguém deixa impressões digitais e raramente seriam convocadas testemunhas. E, se existirem, ficarão mudas como múmias.

O brasileiro tem consciência de que a compra de votos começa nas eleições ou mesmo antes delas. Compram-se votos oferecendo empregos para cargos ditos de confiança, bem remunerados, mas sem estabilidade. Compram-se com dinheiro mesmo, só que sempre de fontes escusas e adquirem-se com favores benemerentes, como distribuição de vagas em hospitais públicos, dentaduras, cadeiras de rodas e o mais que o quadro político deveria ser capaz de oferecer como um direito do povo. E não como um favor a ser retribuído com apoios e votos.

Nos parlamentos, duas são práticas muitos comuns e vergonhosas, nessa matéria de manipulação do dinheiro público. Uma é a extorsão sofrida pelos servidores e cabos eleitorais beneficiados com favores às custas do erário. Nomeia-se alguém para cargo demissível “ad nutum”, geralmente apelidado de assessor e não raro parente, mas exige-se um racha no dinheiro. Um tanto para o dito assessor e outro tanto para o político que consegue sua nomeação. Outra, é a compra de votos de parlamentares para aprovar propostas que não têm consenso. Se votar no governo, tem direito à nomeação de tantas pessoas para tantos cargos, o que enseja a outra maracutaia, a do racha do dinheiro. Ou são oferecidas verbas para ser distribuídas pelos políticos em suas chamadas bases eleitorais. Aí, há compra de votos com a conquista de apoios remunerados e, ainda, rachas de verbas, muitas vezes uma par para a obra e outra para o obreiro.

A investigação mandada fazer pelo deputado João Paulo Cunha dificilmente provará alguma coisa, embora o que deva ser provado é o que todo mundo está careca de saber. O que se estranha é que se esteja denunciando que essas práticas de corrupção estejam acontecendo também neste governo, o do PT, cuja índole moralizante sempre foi reconhecida e cuja idoneidade sempre foi admitida, até pelos adversários.

A denúncia do jornal, a grita da oposição, o escândalo que se tenta armar agora, neste governo, pode dar em nada. Mas é preciso que se faça e que continuem repetindo os movimentos no sentido da moralização da vida pública. Nada de aceitar, previamente, que neste ou naquele governo os políticos são insuspeitos. O passado sugere que, em princípio, todos são culpados até que se prove o contrário.

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