Pela primeira vez, desde julho do ano passado, a taxa dos juros básicos (Selic) baixou. Meio ponto – de 26,5% ao ano para 26%. O pequeno degrau retirado, se fosse na Europa ou em qualquer economia de primeiro mundo, seria festejado como um grande acontecimento. Aqui, tirando seu lado meramente simbólico, representa pouquíssima coisa. Tanto que, embora esperando a baixa, entidades que balizam a opinião econômica nacional, como a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, esperavam mais. E consideraram a medida do Banco Central muito tímida para fazer qualquer contrapeso ao clima de quebradeira geral que já desanima o País.
A baixa de meio ponto nos juros oficiais, embora roube o discurso contestador de integrantes do próprio governo (à frente o vice-presidente José Alencar), deve ser entendida apenas como o sinal de uma tendência que o governo se esganiça em afirmar que é demorada porque deverá ser duradoura: nada subirá repentinamente, nem de repente despencará, repete à exaustão o ministro Antônio Palocci Filho, com sua já conhecida calma, que às vezes parece indiferença ou chega à vizinhança da ironia. A se acreditar no que ele disse, e se a inflação não atrapalhar, daqui para frente é só descida.
Confirma-se, assim, a tendência conservadora da equipe econômica do governo, já manipulada na mídia como se analisam as decisões de um técnico de futebol. A diferença é que em futebol a vitória ou a derrota do time preferido é apenas uma questão de gols; na economia, a conseqüência dos desacertos é sempre desastrosa. Vai do desemprego maior ao aumento da fome, da quebradeira à carestia; da felicidade relativa das pessoas à preocupação cada vez mais crescente com a insegurança que a todos assalta. Até a protegida família do próprio presidente.
Como em futebol, a rigor, não há quem já não esteja de olho no que dizem e fazem os agentes do governo, pelo menos em matéria que mexe no bolso do povo. Entram aqui as reformas, todas costuradas para a saúde do caixa central em detrimento do bolso da cidadania. E embora o presidente Lula se esforce por mostrar que está realizando alguma coisa de excepcional, cujos enigmáticos resultados deverão ser colhidos mais à frente, todos os sinais apontam para um sentido contrário. A esperança já está por um fio e mais assim se parece quando se analisam as reações do próprio presidente às críticas de que começa a ser alvo. O discurso de Pelotas, por exemplo (uma explosão verbal contra considerações realizadas pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso), com alusões à própria virilidade, pode constituir um parâmetro comportamental que agrade a Lula, mas nada recomendável a estadistas.
As bravatas de palanque geralmente impressionam pessoas no confronto eleitoral entre candidatos, durante uma campanha. Mas a um presidente convém que seja mais disposto a ouvir que a dizer. Lula sabe disso, tanto que afirmou várias vezes estar se esforçando para ser o presidente de todos os brasileiros. Não pode dispensar, portanto, a opinião daqueles brasileiros, ou daquela outra parte de cidadãos que se angustiam com o andar da carruagem. Seja por que motivo for, ela está devagar, muito mais devagar do quanto se imaginava. Seja para fazer baixar os juros, seja para subir os índices de emprego, de produção e de segurança ou de auto-estima, cada vez mais no fundo do poço. E se Lula acha que isso também é conversa de oposição, que desça à planície de onde é originário para ouvir do povo a dura realidade que rapidamente tratou de esquecer.