O presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), adotou uma nova interpretação da Constituição para permitir votações no plenário, mesmo com a pauta trancada por medidas provisórias. Com dez medidas provisórias à espera de votação, ele incluiu na pauta da próxima semana o pedido de cassação do deputado André Luiz (sem partido-RJ) e, na semana seguinte, a eleição para dois novos ministros do Tribunal de Contas da União (TCU).
Depois de tentar devolver medidas provisórias consideradas sem relevância e urgência e declarar que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva promove o "fechamento virtual" do Congresso com o excesso de MPs, Severino abre uma brecha para que matérias que não sejam restritas à elaboração de leis não fiquem submetidas à votação de MPs.
Pela nova interpretação, as medidas provisórias com o prazo de votação vencido (45 dias após sua edição) só trancarão as votações no plenário se forem diretamente ligadas ao processo de elaboração de leis. "Fizemos um exame e entendemos que as atividades não legiferantes, as atividades específicas de fazer leis, não são interrompidas pelas medidas provisórias", afirmou o primeiro vice-presidente, José Thomaz Nonô (PFL-AL).
Desde que a mudança constitucional sobre edição de medidas provisórias entrou em vigor, em setembro de 2001, a Câmara adotava uma interpretação mais ampla. Com prazo vencido, as MPs trancavam todas as votações do plenário. O parágrafo 6° do artigo 62 da Constituição determina a suspensão "de todas as demais deliberações legislativas", enquanto as MPs não forem votadas.
Na interpretação da assessoria jurídica da Câmara, que deu base à decisão de Severino, as "deliberações legislativas" são "decisões de que são produtos de normas gerais, impessoais, coercitivas e inovadoras do ordenamento jurídico". Ainda de acordo com a assessoria jurídica, nem todas as deliberações do Poder Legislativo são de caráter legiferante.
Nonô afirmou que essa decisão se restringe à Câmara. No entanto, se o Senado resolver adotar o mesmo entendimento, a nova interpretação poderá beneficiar o governo Lula. Os senadores poderão votar, por exemplo, indicação de dirigentes do Banco Central e de agências reguladoras e de embaixadores, mesmo com a pauta do plenário trancada por medidas provisórias. Nonô também admitiu que a interpretação tem uma dose política. "Há um clamor da sociedade de que processo dessa natureza (cassação) seja julgado", afirmou, referindo-se ao processo contra André Luiz.
O Conselho de Ética da Câmara pediu a cassação de André Luiz, acusado de cobrar propina ao empresário do jogo do bicho, Carlinhos Cachoeira, para livrá-lo da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Loterj da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro.
A Mesa da Câmara também tem sido pressionada para colocar logo em votação o nome dos dois novos ministros do TCU. O Senado já aprovou a indicação do senador Luiz Otávio (PMDB-PA) para uma vaga e a outra é objeto de disputa na Câmara por, pelo menos três deputados.
