Não são as comissões parlamentares de inquérito que, quando referentes a fatos que envolvem parlamentares, colaboram para deteriorar ainda mais o conceito do Congresso. O que faz com que esse conceito se deteriore é o que elas revelam. Pior ainda é a impunidade, como aconteceu com as investigações dos mensalões e caixa 2, em que a esmagadora maioria dos parlamentares-réus, depois de provada sobejamente e até confessada sua culpa, condenados pela Comissão de Ética, foram absolvidos pelo plenário da Câmara dos Deputados. Essas CPIs também revelaram crimes políticos, negociatas e outros acontecimentos desabonadores que envolveram o Poder Executivo. Ainda aí houve leniência, condescendência, perdão e até olhos vendados para fingir que os responsáveis não foram identificados.
O último escândalo que estourou enoja. Ele é muito parecido com aquele dos ?anões do orçamento?, que saíram ilesos e milionários, com o dinheiro do povo embolsado na forma de propinas retiradas das verbas orçamentárias. O atual, o das ?sanguessugas?, revela que num conluio entre pelo menos uma empresa, muitos altos funcionários do Executivo e do Legislativo e não poucos deputados, os interesses da saúde pública, da saúde dos cidadãos, foram lesados, usados como pretextos para as negociatas. O processo, em síntese, era simples. Os deputados podem apresentar emendas ao orçamento. Muitos o fizeram, apontando recursos para compra de ambulâncias para prefeituras do interior do País. Aí, armava-se a negociata, uma empresa de fachada entrando como fornecedora e prefeitos e altos funcionários combinando a compra de ambulâncias necessárias, algumas desnecessárias e todas superfaturadas. O dinheiro era dividido entre a empresa, os particulares e funcionários que colaboraram na execução do crime. E o deputado que apresentou a emenda fria recebia uma polpuda propina.
Todos, no caso, são criminosos comuns e desprezíveis, mas o parlamentar que usa o cargo para separar dinheiro do povo para negociatas das quais retira uma grossa fatia, comete um ilícito inominável. Merece o opróbrio público, a perda do mandato, seu afastamento da vida pública e cadeia. Isso irá acontecer? Ao lembrar do nojento episódio dos ?anões do orçamento?, acreditamos que não. De qualquer forma, é positivo verificar que o presidente do Senado, Renan Calheiros, que havia rejeitado o pedido de uma CPI para o caso das ?sanguessugas? requerido pelo PSOL e outros pequenos partidos de esquerda, decidiu desengavetar o pedido e instalar o inquérito parlamentar. ?Eu faço isso (a indicação dos membros da CPI se as bancadas não o fizerem) sem tremer. Nessa hora não tem que ter crise existencial. Espero que as pessoas trabalhem pela CPI e os líderes atuem para que haja quorum, senão será uma exposição do Congresso?, afirmou o presidente do Senado.
A senadora Heloísa Helena, do PSOL, que liderou o movimento pela CPI, acrescentou: ?O importante é que o mais rápido possível haja a conclusão das investigações. Não pelo argumento de que esse é um ano atípico por causa das eleições, mas, como todos os deputados e senadores estarão recebendo seus salários, a ninguém é dado o direito de não cumprir com suas obrigações?.