A FAO, agência da Organização das Nações Unidas para a alimentação, revela que a fome aumentou no mundo, mas diminuiu no Brasil. A campanha Fome Zero é elogiada pelo estudo da FAO como uma das iniciativas que merecem aplausos. O total de subnutridos nos países em desenvolvimento tem aumentado na base de cinco milhões de pessoas por ano. O Brasil foi listado entre dezoito nações que conseguiram diminuir a população esfomeada. Essa redução iniciou-se em 1990, o que desde logo afasta o projeto Fome Zero como responsável pela estatística positiva -ou menos negativa -, da FAO. O Brasil reduziu o número de famintos de 18,6 milhões no período de 1990-1992 para 15,6 milhões em 1999-2001. Houve uma queda de 12% para 9% da população.
Temos que levar em consideração que no período estudado a população brasileira aumentou a taxas significativas, o que valoriza a vitória sobre a fome. A FAO observou que os países que conseguiram reduzir a fome, em geral, tiveram rápido crescimento econômico, níveis mais baixos de infecção com o vírus da aids, redução na taxa de crescimento populacional e melhorias nos índices de saúde e educação. Em suma, a fome diminuiu onde houve desenvolvimento. E desenvolvimento que não se limitou ao crescimento econômico, mas estendeu-se à saúde e educação.
No período, sem que de nossos governos tivéssemos qualquer política nesse sentido, houve menor desenvolvimento demográfico. A população cresceu menos. O saudoso Josué de Castro, que serviu ao Brasil e à FAO com dedicação e sabedoria, disse um dia que “a mesa do pobre é parca, mas a cama é farta”. As famílias pobres têm mais filhos. Já as de melhor renda, menos bocas para alimentar. Não se trata, segundo alguns cientistas, de um controle de natalidade voluntário dos mais abastados e pura ignorância dos pobres, mas um fenômeno da própria natureza. Ela, diante de um mal fatal como a fome, faz com que os seres humanos se defendam gerando mais, para substituir os que morrerão prematuramente.
De qualquer forma, é certo que o excesso de filhos se vê nas famílias dos países não desenvolvidos. Os desenvolvidos têm um crescimento demográfico pequeno. Há até os que precisam estimular a natalidade.
De 1990 a 2001, portanto, enquanto a fome no mundo crescia, estimando-se hoje que existem 842 milhões de famintos, no Brasil ela decrescia. O período estudado é anterior ao governo Lula, que assumiu preocupado com o problema da fome a ponto de eleger o programa Fome Zero como sua principal meta. Não se trata, portanto, de uma vitória desta administração. Nem a reivindicará a de Fernando Henrique Cardoso ou outras que a antecederam, pois não é assunto propício para exploração política ou político-eleitoral.
O Brasil, nesse período de onze anos, cresceu, desenvolveu-se, não por causa de seus governos, mas apesar deles. Não é fácil dizer se um governo foi melhor do que o outro. A sociedade brasileira é que trilhou os caminhos do desenvolvimento, com a ajuda governamental, quando possível. Sem ela, se necessário. Não dá para fazer festa com a revelação positiva da FAO, quando se vê, na televisão, como assistimos nesta semana, milhares de miseráveis chafurdando destroços queimados da Ceasa do Rio de Janeiro, catando restos de comida deteriorada, para matar a fome. Esse espetáculo dantesco nos envergonha. Já que foi revelado que o desenvolvimento é o único caminho para combater a fome, é hora de promovê-lo. Senão, na próxima estatística da FAO vamos entrar no bloco dos famintos.