Dias atrás, um analista de assuntos econômico-financeiros disse que o Brasil teria de aumentar o desemprego para controlar a renascente inflação. Solto, sem maiores explicações, o comentário pareceu mais uma praga que uma análise ou um vaticínio. Mas, pensando bem, ou melhor, sobre o mal, há verdade nessa fatídica conclusão. O governo Lula acaba de firmar, em nome do Brasil, a segunda revisão do acordo com o Fundo Monetário Internacional. Isso valerá a liberação de mais US$ 4,6 bilhões dos US$ 30 bilhões conseguidos pelo governo Fernando Henrique Cardoso, dos quais o governo passado já sacou US$ 6 bilhões.
Esta segunda revisão, aprovada já no governo petista, informam os técnicos do FMI que se deve à antecipação, pelo Brasil, da elevação do superávit primário, que era de 3,75%, para 4,25% do PIB. Tal providência significa mais economia para pagar as dívidas e menos dinheiro para aplicar no desenvolvimento do País. O próprio FMI preocupa-se com a nossa inflação e aconselha que fiquemos de olho nela. E o governo Lula está de olho, tanto é que já aumentou por duas vezes a taxa básica de juros. Ela já passou de 18% (no governo passado) para 26,5% ao ano, neste governo, que já fez duas majorações.
A elevação dos juros, pelo menos em teoria, serve para reduzir a disponibilidade de recursos no mercado financeiro para compra de dólares, aumentando suas cotações; para refrear a inflação de demanda, fazendo com que haja menor consumo de bens e serviços. E tem uma conseqüência inescapável: diminui o volume de negócios, de produção e a oferta de empregos. Ainda, aumenta o desemprego, porque as empresas vendem menos, produzem menos e precisam de menor contingente de trabalhadores.
Enfim, parece claro o vaticínio ou praga do analista referido nas primeiras linhas deste artigo.
Se analisarmos todas as medidas que levaram aos aplausos e aprovação do Fundo Monetário Internacional e sua preocupação com a escalada da nossa inflação, chegaremos à conclusão de que estamos seguindo uma política ortodoxa, capaz de recuperar, por inteiro, a confiança do mercado no Brasil.
Lula não está repetindo o governo FHC, em matéria de economia e finanças. Está sendo ainda mais duro e ortodoxo. Mais realista que o rei. O rei deposto, é óbvio. O problema está na incongruência política de tudo isso. Lula foi eleito porque se acreditou que ele romperia, ou pelo menos reduziria, as relações com o FMI. Porque prometia reduzir o déficit primário para que sobrasse mais dinheiro para investimentos no desenvolvimento do País. Para baixar os juros, facilitando a vida tanto de pessoas físicas como jurídicas. Principalmente destas, para que aumentassem sua produção, gerando mais empregos. As circunstâncias estão levando o governo Lula a fazer exatamente o contrário. Assim, ganha a confiança do mercado financeiro nacional e internacional e perde a do grupo ideológica e politicamente com ele afinado em 23 anos de luta do PT. E perde também os aplausos dos que, mesmo não sendo “lulistas”, nele votaram esperando mudanças. Para estes, o que está acontecendo é um novo governo seguindo no mesmo sentido do anterior. E se mudanças há, é para pior.
Entende-se a expressão de preocupação que a mídia colheu de Lula, nos últimos dias. Ele está bem intencionado e agindo de forma correta em termos de condução das finanças do País. Politicamente, no entanto, está “no mato sem cachorro”.