Luiz Augusto Módolo de Paula

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A prisão de dois adolescentes acusados de matar um casal em frente ao filho de 7 anos em um bairro nobre de São Paulo trouxe novamente à tona o debate em torno da mudança da maioridade penal. Meses atrás, o assunto já havia ganhado as manchetes após a morte de um garoto de seis anos, barbaramente assassinado por psicopatas no Rio de Janeiro. Ocorre que ninguém mais tocou no assunto. Infelizmente, ainda há espaço para essa discussão oportuna e que nunca é tardia, sobretudo porque casos bárbaros, muitas vezes cometidos por menores de idade, se multiplicam em nossa sociedade.

De acordo com o artigo 228 da Constituição Federal e com o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), a maioridade penal só é atingida depois dos 18 anos. A redução da maioridade penal não é uma garantia de eficiência no combate à criminalidade. Isso seria confiar demais na letra morta da lei. Mas o debate é justo, seja ele motivado por quem já foi vítima da violência, pelos leigos ou até pelos operadores do Direito.

Só não se pode admitir que os defensores da maioridade penal em 18 anos justifiquem sua posição sob o escudo do entendimento de que se trata de uma cláusula pétrea. Para que fique bem-entendido, cláusula pétrea é a norma constitucional, prevista no artigo 60 de nossa Carta Magna, que não pode ser alterada. Ou seja, só é possível modificar o que ela determina através de uma nova Constituição.

Como se percebe, a mera alegação de que a maioridade penal é uma cláusula pétrea visa a abortar a discussão em torno do assunto, o que não é uma atitude muito democrática. Para os defensores da maioridade em 18 anos, só existe esse argumento, tão confiantes que eles se sentem de que o artigo 228 da Constituição seria imutável.

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Em uma recente artigo, o advogado e professor de Direito Penal Sandro Cell destacou: ?Se a idade de 18 é assim, então, tão arbitrária, por que não se pode rediscuti-la? Arbitrária também era a idade de 21 anos para a determinação da capacidade civil absoluta; notou-se que era inadequada aos novos tempos e se a mudou. Arbitrária também era a idade de 18 anos para poder votar em alguém no Brasil, alguns acharam que os tempos eram outros e baixou-se para 16 anos. Isso significa que há o reconhecimento de que os jovens de hoje podem mais cedo fechar contratos civis, sem a assistência de seus pais, podem decidir sobre inúmeras coisas que antes lhes eram vedadas, podem também votar nos homens que fazem as leis penais, só não podem mesmo é responder por elas?.

Nesse ponto, estou de pleno acordo com o professor Sandro Cell. Considero que 16 anos seria o ideal pela própria coerência de nosso ordenamento jurídico, que atualmente já permite aos jovens votarem e se emanciparem civilmente nessa mesma idade.

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A idade de responsabilização penal foi fixada em 1988. Na época, os constituintes seguiram uma recomendação da ONU, que determinava a melhor opção aos já então obsoletos 18 anos. Poderiam também ter sido fixado aos 10, 12, 16, 30, quiçá 40 ou 50 anos. Não faria diferença diante do caos social em que vivemos. Ressalve-se que tal matéria foi desnecessariamente fixada em nossa Constituição, pois não há interesse individual a ser preservado no caso da alteração da idade. Sobra interesse de quem quer dificultar o debate para somente facilitar a defesa de suas convicções.

Se não serve para dar uma resposta à criminalidade, uma modificação poderia ser útil para nos privar por um tempo das companhias dos Champinhas da vida e dos incendiários de carne humana. Essa alteração também contribuiria para diminuir a desvirtuação do ECA que ocorre nos dias de hoje, quando maiores cometerem os crimes e depois jogam a culpa nos menores, sabendo que estes ficarão apenas três anos internados nas unidades sócio-educativas. Talvez esses menores pensassem duas vezes para cometer um delito se tivessem como destino uma prisão

A cláusula pétrea serve para preservar os direitos e garantias individuais. Sendo assim, a idade para responsabilização penal não pode ser garantia aos menores de que eles não serão processados. Pelo contrário. Se pode votar e se emancipar aos 16 anos, o cidadão também tem condições de responder legalmente por desvios de conduta perante à sociedade. É uma pena que essa discussão seja restrita a um colégio mais reduzido. Ao invés dos 180 milhões de brasileiros, a questão ficou nas mãos dos 11 ministros do STF. Eles vão decidir o que fazer se o Congresso Nacional tentar aprovar alguma emenda que reduza a maioridade penal ou se o artigo 228 se trata, ou não, de algo imutável.

Luiz Augusto Módolo de Paula é procurador do Município de São Paulo.