Lula vê público cair à metade, em desfile sem o ufanismo de 2004

As comemorações da Independência concorridas e cheias de atrações inventadas pelo publicitário Duda Mendonça ficaram para trás. Cercado pela crise política que se agrava a cada dia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assistiu hoje (7) a um desfile de 7 de Setembro esvaziado, ouviu vaias e aplausos e passou duas horas e meia em um palanque cheio de ministros, mas carente de amigos, parentes e parlamentares.

O público presente, estimado pela Polícia Militar, ficou entre 25 mil e 30 mil pessoas. Na melhor das hipóteses, foi a metade dos 60 mil que, no ano passado, aplaudiram com entusiasmo estrelas como o maratonista Vanderlei Cordeiro. Em 2004, o atleta-revelação das Olimpíadas abriu o desfile e assistiu à festa na tribuna de honra, convidado pelo presidente. Lula, com a faixa presidencial, chegou ao palanque às 9 horas, depois de desfilar em carro aberto ao lado de Dona Marisa, vestida de tailleur verde-bandeira e uma echarpe amarela. O casal levou um susto quando o Rolls Royce parou. A haste de metal que o presidente e a primeira-dama seguravam quebrou, que ambos deram um pulo para frente, mas não caíram. Recompostos, desceram do carro e seguiram em frente. O presidente ouviu mais aplausos do que vaias, porque a arquibancada em frente ao palanque reservado para ele estava ocupada por dezenas de petistas gritando palavras de ordem e usando faixas vermelhas com o nome do presidente amarradas na cabeça. Os contra estavam mais afastados, mas também eram barulhentos. Alguns levaram cartazes e bandeiras pretas com a inscrição "impeachment". Depois de alguns acenos discretos, Lula subiu ao palanque, onde o aguardavam mais de vinte ministros e apenas três parlamentares: os deputados federais petistas Sigmaringa Seixas (DF), Vicentinho (SP) e Paulo Delgado (MG). Até a chegada do presidente, a grande atração da tribuna era o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Nelson Jobim.

Aliado do presidente neste momento de crise, Jobim foi cercado por vários ministros e, como chefe do Judiciário, sentou-se na primeira fila, ao lado de Dona Marisa. À direita de Lula, estava o presidente da Nigéria, Olusegun Obasanjo, a quem o colega brasileiro deu grande atenção, explicando detalhes do desfile, como a apresentação de um grupo de capoeira. Com nove pontos percentuais a menos de avaliação positiva em comparação com setembro do ano passado (eram 38% de bom e ótimo, hoje são 29%) e 12 pontos a mais de rejeição (31% ante 19% de setembro passado), segundo o Ibope, o presidente Lula sentiu o peso das dificuldades políticas, mas procurou demonstrar descontração e simpatia. Conversou, aplaudiu, riu das estripulias da Esquadrilha da Fumaça e posou para fotos.

O secretário-geral do Itamaraty, embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, apresentou a família e fez questão de fotografar tudo. Até um bebê foi levado por uma convidada ao colo do presidente, que pegou, fez carinho e devolveu, sorridente. Lula ainda assinou, com o presidente nigeriano, entre a passagem de uma ala e outra, um acordo para incrementar as exportações brasileiras ao país africano. A ausência do publicitário Duda Mendonça foi sentida não só no palanque, mas no desfile. Duda está afastado do presidente desde que confessou ter recebido parte dos serviços prestados ao PT na campanha de 2002 com dinheiro ilegal remetido para uma conta no paraíso fiscal das Bahamas.

Ao contrário dos dois anos anteriores, o que se viu hoje foi uma parada burocrática, numa sucessão de alunos, bandas, carros, tanques, motos, cachorros e cavalos. Muito distante da apresentação do ano passado, concebida por Duda, em que o predominou o tom ufanista, reflexo da campanha "o melhor do Brasil é o brasileiro". Este ano, o slogan oficial era bem mais modesto: "Sete de Setembro – dia de todos os brasileiros e brasileiras".

"Não vejo relação entre a baixa presença (do público) com o momento político. O povo tem várias maneiras de manifestar satisfação e insatisfação", minimizou o deputado Paulo Delgado. Indagado se a falta dos parlamentares foi por medo de serem vaiados, diante da sucessão de denúncias de corrupção no Congresso, o petista mineiro respondeu: "Às vezes, a vaia ajuda mais do que o aplauso sem merecimento. Se o Congresso está merecendo vaias, devemos responder a isso."

Já o deputado Vicentinho, aproveitando os gritos dos petistas que lembravam o "Lula Lá" de 2002, tentou demonstrar o mais puro entusiasmo. No fim do desfile, foi para a frente do palanque, fez o tradicional gesto com o punho fechado enquanto cantava o velho jingle e acenou como se estivesse em um showmício da campanha presidencial. Às 11h20, enquanto a Esquadrilha da Fumaça fazia as últimas piruetas, Lula e Dona Marisa foram embora. Rápidos e discretos, ministros como Antonio Palocci, Jaques Wagner e Luiz Dulci deixaram a cerimônia. Nelson Jobim saiu em seguida, sem dar entrevista. Entre as poucas autoridades que atenderam a imprensa, estava o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan. Com o bom desempenho da economia, Furlan preferiu o otimismo. Questionado sobre a paralisia do governo, parecia ter ouvido outra pergunta. "Acho que o desfile este ano incorporou uma primeira parte com a participação cidadã, nossas etnias, nossas variedades e a segunda parte, com o desfile militar", respondeu. Indagado de novo, Furlan deu pouca importância à crise política. Falou até do tempo, que hoje ficou encoberto, trazendo uma temperatura bem mais amena que nos dias anteriores. "As turbulências não estão criando obstáculos para que a gente não perca o rumo. O Brasil é muito maior que essas turbulências. Até São Pedro foi favorável, porque refrescou um pouco para nós, no dia do desfile", disse Furlan. O deputado Paulo Delgado também falou do clima, mas para justificar a falta de público. "O tempo não está muito bom", comentou. E emendou: "sem qualquer analogia política." (Colaborou Fabíola Salvador)

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