O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) será recebido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no dia 17, em Brasília, logo depois de fazer um protesto contra a Alca e o imperialismo americano em frente a embaixada dos Estados Unidos. A programação da Marcha Nacional pela Reforma Agrária, anunciada hoje pelo coordenador Gilmar Mauro, prevê ainda protestos diante da sede do Banco Central, contra a política econômica, e ante o Ministério da Agricultura, contra o agronegócio.
Os manifestantes vão mostrar que a política econômica do governo Lula impede a reforma agrária e levou ao descumprimento da promessa de assentar 430 mil famílias, disse Mauro. Já o agronegócio se beneficia da isenção do ICMS de 18% sobre as exportações e não ajuda a resolver os problemas sociais do País.
Na frente da embaixada americana, os sem-terra farão uma performance exigindo, entre outras coisas, a retirada das tropas do Iraque. Lula receberá a comissão de negociação do MST no Palácio do Planalto, às 16h, e deve anunciar medidas para acelerar a reforma agrária. Integrantes de outros movimentos sociais e da Igreja serão convidados a compor a comissão.
Enquanto isso, os 12 mil sem-terra estarão concentrados na frente do Congresso Nacional. Lula não deve falar aos manifestantes. "Não pedimos isso a ele." Segundo Mauro, as negociações com o governo foram antecipadas. "Conversamos com a maioria dos Ministérios."
A marcha entra nesta sexta-feira no Distrito Federal e avança mais 17 km pela BR-060. O acampamento montado em Alexânia na fazenda Ribeirão das Lages, será transferido para um local conhecido como Casa do Índio, no município de Engenho das Lages. Os sem-terra passarão o fim de semana em Taguatinga. Sábado acampam nas proximidades da Embrapa e domingo fazem um ato em Taguatinga, na frente da residência oficial do governador Joaquim Roriz (PMDB).
A chegada a Brasília ocorre segunda-feira (16) . Hoje não houve marcha e o dia no acampamento foi dedicado a estudos de temas como o agronegócio e a Alca. As cartilhas são lidas e discutidas em grupos. Uma delas, "A Natureza do Agronegócio no Brasil", editada pela Via Campesina, foi patrocinada pela Associação dos Engenheiros da Petrobrás (Aepet) e pelo Sincopetro, e ataca os transgênicos e o sistema agroexportador.
Já o jornal da Pastoral da Terra, também usado nos estudos, critica o "hidronegócio" e propõe resistência à cobrança pelo uso da água. A cartilha "Como Organizar Assembléias Populares" termina com um questionário sobre a Alca e a dívida externa e diz que é preciso "radicalizar a democracia". Entre as alternativas para "mudar o Brasil", propõe que seja estabelecido o tamanho da propriedade rural em no máximo 1 mil hectares "e desapropriar todas as demais".
Os participantes recebem livros de Marx, Lênin, Florestan Fernandes e sobre Che Guevara. Segundo Mauro, os temas não visam a doutrinação, mas a discussão de questões importantes para o País. Os livros foram entregues aleatoriamente para estimular a leitura.
CNBB
O bispo da cidade de Goiás, d. Eugênio Rixen, visitou o acampamento e entregou mensagem da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) de apoio à marcha. O documento, assinado por d. Geraldo Majella Agnelo, presidente da CNBB, d. Antonio Celso de Queiroz, vice-presidente, e d. Odilo Pedro Scherer, secretário-geral, endossa as reivindicações "para uma ordem mais justa no campo e na cidade".
A caravana já percorreu 147 quilômetros, desde a concentração, em Goiânia, no dia 1º. O número de participantes aumentou de 11 para 12 mil e pode crescer mais com a aproximação de Brasília. O MST espera a chegada das delegações de outros movimentos sociais, como os sem-teto. O governo do DF enviou ambulâncias para acompanhar o deslocamento dos sem-terra. O policiamento que acompanha a marcha será reforçado a partir desta sexta.
Segundo o inspetor da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Marcos José Cordeiro, com a aproximação de Brasília e o aumento na caravana, as dificuldades para ordenar o trânsito tornam-se maiores. O número de viaturas aumenta de 10 para 14 e o de policiais de 30 para 40. "Teremos um helicóptero para dar suporte", disse.
O balanço parcial da marcha mostra números expressivos, apurados pela reportagem. Para o transporte das 13 mil pessoas envolvidas – 1 mil cuidam da alimentação e infra-estrutura – foram mobilizados cerca de 400 ônibus, incluindo os que já retornaram. Muitos pertencem a cooperativas de assentados. Os 27 caminhões fizeram mais de 300 viagens para transportar barracas, bagagens e a estrutura do acampamento. Para a instalação, foram invadidas ocupadas oito áreas particulares.
Cerca de 240 toneladas de alimentos foram usados na preparação de 350 mil lanches e 264 mil marmitas. Os 10 caminhões-pipa transportaram cerca de 3 milhões de litros de água. Os atendimentos de saúde passam de 1.200. A maioria foi resolvida sem ajuda hospitalar. Entre os casos mais graves, houve uma picada de cobra, em que a vítima se recuperou, e um enfarte de miocárdio que resultou na morte de um sem-terra.