Lula se emociona ao visitar Gorée e pede perdão aos negros por escravidão

No momento mais emocionante de sua viagem de cinco dias à África, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se emocionou hoje (14) ao visitar o mais emblemático entreposto de escravos na ilha Gorée, uma casa onde os negros ficavam confinados, antes de serem enviados como escravos para a América. "Perdão pelo que fizemos aos negros", bradou Lula, repetindo o gesto do papa João Paulo II durante uma de suas várias visitas à África. "Quando se comete um grave erro histórico com o que aconteceu com os judeus e os negros, o papa já nos ensinou que é fácil pedir perdão", disse Lula, referindo-se ao papa João Paulo II, quando pediu perdão aos judeus. Lula visitou cada sala onde mulheres, homens e crianças ficavam confinados, separadamente e a "Porta da Viagem sem Retorno", de onde saíam os escravos. "É como dor de cálculo renal. Apenas quem tem pode dizer como é. Só estando alí para ter a dimensão do que as pessoas sentiram por 300 anos", observou Lula.

O presidente do Senegal, Abdoulaye Wade, ouviu comovido a manifestação de Lula, e afirmou que ambos não tinham responsabilidades pelo que aconteceu nos séculos 16, 17 e 18 quando milhões de africanos foram levados para as Américas como "mercadorias". Wade lamentou o fato de as reservas humanas da África terem sido escravizadas e as reservas econômicas colonizadas pelos europeus.

Wade pediu a Lula que continue atuando para o fortalecimento da África. "Não desista, mesmo que isso provoque ciúmes de outros presidentes", afirmou. "E considere-se um africano", prosseguiu o presidente do Senegal, arrancando aplausos dos presentes.

Contrastando com a recepção calorosa da chegada à ilha, com populares acenando com bandeirinhas, Lula ficou chocado quando começou a conhecer a casa de escravos, uma verdadeira prisão que muitos comparavam com os campos de concentração nazista. O presidente ficou impressionado, principalmente, com os quartinhos e celas minúsculas onde ficavam os escravos que eram vendidos em função do peso que tinham. Um retrato da humilhação e das condições subumanas que eles passavam antes de serem comprados por mercadores europeus e mandados para oito países entre eles o Brasil, Haiti e Cuba.

A ex-ministra Benedita da Silva, que recentemente descobriu que seus antepassados saíram de Senegal, não conseguiu conter as lágrimas durante mais de três horas da visita, e ver espalhados pelos cômodos da casa grilhões e correntes usados para prender os escravos. "A história da escravidão é tratada muito por cima, porque os escravos eram como figuras, ou seja, não eram seres humanos, eram transformados em números, não tinham nomes nem sobrenomes", comentou. "Antes eram homens livres que uma parte da Europa transformou em escravos para poder, quem sabe, começar a se transformar no chamado continente rico do planeta", enfatizou, em discurso.

Segundo Lula, é importante que as crianças brasileiras aprendam que a África não é industrialmente atrasada por que o africano não tem competência nem inteligência. "É porque durante três ou mais séculos deste território as pessoas mais fortes, saudáveis e com mais condições de trabalhar, deixaram este continente. E sabe Deus quantos milhões saíram por esta porta", afirmou Lula, apontando para a "Porta da Viagem sem Retorno". "É a porta do nunca mais. É como se fosse a própria morte. Ou seja, eu vou sem saber, ou melhor, tenho consciência de que não tenho retorno".

O presidente Lula lembrou que os africanos "ajudaram a construir o Brasil", influenciando a culinária, a música e o gingado. "Essas coisas a gente não aprende na Alemanha, na Suécia, aprende ali na ilha de Gorée. Isso não se aprende na universidade, está no DNA", observou.

Identificação

Antes do discurso de Lula, a ministra especial de Política de Promoção da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro, e Benedita da Silva também se emocionam durante seus discursos. O ministro da Cultura, Gilberto Gil, que também acompanhou a comitiva presidencial, cantou a música "La lune de Gorée", composta em parceria com o poeta baiano José Carlos Capinan. A letra em francês diz que a pele dos negros é uma bandeira que representa o sofrimento, mas que é a mesma pele que cobre todas as pessoas do mundo. E que a pele dos escravos é uma bandeira da liberdade. A apresentação de Gil comoveu o presidente senegalês.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo