O jornal francês Le Monde, em artigo assinado por Babette Stern, conta uma estória entre o Fundo Monetário Internacional e o presidente Lula que mais parece “A Bela e a Fera”, do terror à valsa dançada pelo presumível monstro e a donzela. Lembra ele que já vai longe o tempo em que o Fundo Monetário Internacional via chifres diabólicos na cabeça do candidato Luiz Inácio Lula da Silva, multiplicando advertências contra a sua ascensão ao poder no Brasil.
Lula, embora negasse, por tática eleitoral, era visto como bicho-papão porque construíra, nas campanhas anteriores e mesmo na última, que venceu, uma imagem de líder de esquerda, antimercado e com gula por uma moratória, capaz de deixar os credores estrangeiros a ver navios. O Brasil, pensavam os homens do FMI, cairia num caos.
Menos de vinte meses depois, tudo mudou, da água para o vinho. Na sua recente visita ao Brasil, o novo diretor-geral do FMI, o espanhol Rodrigo Rato, mais parecia um doce Mickey Mouse colorido. Ele não escondeu sua satisfação com a administração de Lula, pelo que considera seu sucesso na gestão da economia brasileira.
Desde que assumiu, o governo petista “deu continuidade a uma política macroeconômica coerente e implantou uma agenda ambiciosa no que diz respeito às reformas estruturais”, testemunhou Rato. Acrescentou que “estas políticas estão dando resultado”, lembrando que os economistas reavaliaram para cima, no final da semana passada, as suas previsões de crescimento do PIB em 2004, adicionando mais 0,5%.
Para o governo brasileiro, o crescimento acelerou-se mais do que estava previsto para o segundo trimestre, alcançando uma taxa superior em 5,7% ao que havia ocorrido no mesmo trimestre do ano passado. “Esta melhora sensível vem sendo estimulada pelo consumo, o qual, por sua vez, é sustentado pela diminuição do desemprego”, na análise de Ana Paula Rocha, economista do banco ABN Amro, referida pelo jornal francês.
O Brasil, após haver sofrido a pior recessão da última década (-0,3% em 2003), voltou a mostrar resultados positivos por quatro trimestres consecutivos, com uma ligeira queda na sua elevada taxa de desemprego, que em junho estava em 11,7%. O artigo destaca ainda o crescimento da produção industrial e o recorde histórico nas exportações, conseguido em 2003, e que poderá repetir-se no ano corrente.
Em março de 2005 vence o atual acordo Brasil-
FMI e, então, muita coisa poderá ser revista. Mas à dança não faltam alguns pisões nos pés, pois Lula insiste que os investimentos em infra-estrutura, que pretende sejam feitos com as parcerias público-privadas, que ainda não logrou ver aprovadas pelo Congresso, sejam retirados do cálculo do superávit primário prometido no acordo com o FMI. Isto faria com que sobrasse dinheiro para investimentos outros no processo de desenvolvimento e, principalmente, na área social. É o que reclamam os petistas ortodoxos, a oposição e parece ser condição sem a qual não poderemos crescer sustentadamente e com um nível aceitável de desemprego.
A redução do superávit primário exigido pelo FMI, seja com ou sem estorno dos investimentos em infra-estrutura, via PPPs ou não, na verdade dita o futuro do petismo no poder. O ajuste fiscal, por mais que seja desejável, e o atual governo o está fazendo com mais zelo que seu antecessor, está tendo um preço social demasiadamente pesado. Com desemprego, poder aquisitivo baixo e um terço da população na miséria, este governo terá sido um fracasso.