Falar mal da vida alheia é um hábito feio. Falar mal da própria vida talvez seja pessimismo ou sinal de depressão. Ou outro mal daqueles que demandam tratamento psicológico. Falar bem das coisas más ou silenciar pode ser sinal de insensibilidade, leniência, conivência ou mesmo revelação de desejo de viver no ?quinto dos infernos?. Conta-se que a expressão ?quinto dos infernos? era usada pela rainha ao se referir ao Brasil, quando ela veio com dom João VI aqui instalar a corte, fugindo de Portugal e de Napoleão. Acontece que, como já disse um ilustre político e pregador religioso brasileiro, ?a verdade é verdade até na boca do diabo?. Assim, quando brasileiros falam mal do Brasil lá fora, expressam sua inconformidade com o destino de viver ?no quinto dos infernos? ou revolta por ver este país tão lindo ser palco de tantos e evitáveis males. E transbordam inveja ao compararem com o que estão vendo no primeiro mundo.
Há poucos dias alguém espalhou via internet testemunho de um brasileiro que esteve viajando por quarenta dias pela Alemanha. Ele dizia-se espantado, até revoltado, por ver que lá o cidadão toma um coletivo, ônibus, bonde ou mesmo trem. Paga a passagem e, durante toda viagem, não aparece um cobrador sequer para pegar o bilhete. Mas ninguém entra sem pagar passagem. Revoltou-se também porque, mesmo o trânsito estando um pouco atravancado, o que é raro, os carros param ao sinal vermelho, mesmo que seja de madrugada e nenhum veículo venha pela rua transversal. Ninguém desatravanca o trânsito usando o acostamento. Nas estradas, não há limites de velocidade. Apenas recomendações. Mas a consciência e habilitação dos motoristas faz com que tudo funcione bem.
Impossível diante desta e de outras observações deixar de comparar com o que ocorre no Brasil. E, mesmo que para com os próprios botões, falar mal do nosso querido País. Vai começar o Pan. Um chargista brasileiro, em veículo de comunicação nacional, afirmou com inteligente ilustração que o Pan já começou. Desenhou morros apinhados de favelas e de todos os pontos saindo ?pam?, ?pam?, ?pam?. Referia-se, é claro, aos incessantes tiroteios nas favelas do Rio, sede dos Jogos Pan-americanos.
Um casal curitibano, ele médico e ela dondoca da alta sociedade, foi passear na Europa. Estavam em Genebra e o marido aproveitou para mimar a esposa com alguns daqueles deliciosos chocolates suíços. Ela abriu um bombom de dar água na boca, comeu-o e amassou o papel que o embrulhava, jogando no chão. Apareceu um policial, que mandou a madame juntar o papelzinho e colocá-lo num cesto de lixo. O marido, um tanto ruborizado, abaixou-se, pegou o papel e quando ia jogá-lo na lixeira foi advertido pelo policial. ?O senhor ponha de volta no chão. Quem infringiu a lei foi sua esposa. Ela é que tem de juntar e pôr no lixo.? E assim foi feito. Depois do ?carão?, riram. Riso amarelo, mas riram. Riram de si mesmos e, inevitavelmente, do Brasil, onde até policiais jogam papel no chão e, se papel- moeda, muitas vezes põem nos próprios bolsos.
Fazemos estas inocentes observações para discordar do presidente Lula, que criticou os brasileiros por falarem mal do Brasil lá no Exterior. Ele criticou também as notícias da mídia interna que aqui ressaltam fatos negativos que acontecem todos os dias, todas as horas, todos os minutos. Por que não dar ênfase às notícias boas? Seria porque não existem ou porque não há espaço na mídia, já que as ruins tomam todas as páginas dos jornais e revistas, todo o tempo dos noticiários de rádio e televisão? Podemos dar uma de ?cala-te boca? diante de tudo o que está acontecendo neste país, inclusive no governo. Mas o diligente presidente que não se esqueça de que a imprensa internacional tem correspondentes estrangeiros aqui. E eles vêem, sentem, vivem os nossos dramas. E acabam falando mal do Brasil lá no exterior, no El País, Times, no New York Times. Assim, o que nos pede Lula é missão impossível. É melhor que ele e nós todos sigamos o conselho da ministra Marta Suplicy: ?relaxar e gozar?. Preferentemente de boca calada.