Um aviso que vale para todos, mas em especial aos militantes do Partido dos Trabalhadores ainda não conformados com o jeito das coisas depois que o poder passou às suas mãos. Fazer discurso contra, pode. Manifestações de rua, idem. O que não pode, no PT, é passar da palavra a atos de verdade, principalmente alguns, como votar contra ou entrar na Justiça. Aí o rompimento se consolida e “quando a relação de confiança se quebra, não há mais volta”.

Esse é o entendimento já configurado como padrão do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do comando maior do PT às vésperas de uma campanha nacional do Planalto, através da mídia, visando a esclarecer a população acerca do tipo de reforma (especialmente a previdenciária) que virá. Em contraposição a essa campanha, o partido de Leonel Brizola (PDT) e os radicais do PT, chefiados pela senadora Heloísa Helena, fecharam acordo para a realização de outra campanha nacional: a de mobilização, especialmente de aposentados e pensionistas, contra a proposta do governo, que inclui, entre outros itens incômodos, a contribuição dos inativos. Se não ganhar no discurso, o time do contra já avisa que poderá entrar na Justiça, onde questionará inclusive o uso do dinheiro do contribuinte.

A senadora usa as armas da língua solta que tem de sobra: “Recurso público não pode ser utilizado para incentivar a população com uma visão unilateral”. A seu favor tem a posição já antecipada de ponderáveis setores do Judiciário que, em causa própria, também é contra a taxação e outras limitações aventadas. E não adianta o governo se esforçar mostrando que pelo menos quinze mil servidores (só do Poder Executivo) ganham salários acima do presidente da República. Muitos são marajás graças a recursos obtidos na Justiça e bradam pelos “direitos adquiridos”.

Gostaríamos de respeitar todos os direitos, diz o vice-presidente José de Alencar. Dos adquiridos a outros não-adjetivados (ele jura que essas são coisas que diz também ao pé do ouvido do amigo Lula). Mas é preciso dar tempo a que as pessoas entendam que existem alguns desses direitos contraídos que funcionam como uma ofensa à cidadania. Num país onde os milhões recebem salário mínimo, há vilões que percebem 30, 40, 50 e mais mil reais mensais, sangrando os cofres públicos de morte. Isso não pode prosperar.

Acostumado ao debate, o presidente do PT, José Genoíno, admite opiniões contrárias. A discussão – adverte ele – é livre e democrática. Entretanto, “o que não podemos aceitar é ser contestados na Justiça por um parlamentar do partido. Aí não tem acordo”. Nem aí para o puxão de orelha, senadora alagoana já decidiu: não votará a favor de proposta nenhuma que inclua a cobrança de contribuição dos servidores inativos. E nem em propostas de previdência complementar, uma idéia que “joga a poupança dos servidores na lama da especulação”.

Retiradas as questões de disciplina partidária invocadas por Genoíno, o recurso à Justiça anunciado por alguém do Legislativo é, de fato, algo estranho. Está-se buscando reformar a lei, exatamente para adequá-la a uma nova realidade. Tentar impedir a iniciativa de mudança com base em mandamentos dispostos na lei velha, contestada, é abdicar da condição de legislador, conquistada nas urnas. Helena e Brizola podem prestar duvidoso serviço sustentando posições num debate que interessa à nação. Mas ao buscar o apoio do Judiciário para uma causa que constitui, essencialmente, prerrogativa do Legislativo, é fugir da raia. Ou do limite razoável e democrático em que se situam os graduados descontentes.

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