O governo dissimulou bem a reação de natural desapontamento diante da primeira decisão contestada na Justiça. Mas, mesmo assim, tomou um tremendo susto. Afinal, a medida liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal no caso do bloqueio de recursos para o Rio de Janeiro pode contaminar outras decisões e, mais que isso, pode complicar o intrincado jogo de liberação de recursos, esteio de um outro compromisso intocável pelo sucesso da responsabilidade fiscal que subordina todo governante.

No caso do Rio, a pendenga assume conotações peculiares. Quem deixou de pagar a conta – e portanto em tese teria que ser responsabilizada pelo problema criado – é a ex-governadora Benedita da Silva. Embora ela tenha tentado remeter a questão para mais longe, ao tempo do marido de Rosinha Garotinho, foi ela quem concluiu o governo em 31 de dezembro, depois de uma carreira de insucessos, notadamente na área da segurança pública. Se suspeita de violação da lei, e portanto sujeita às penalidades da lei, no mínimo caberia um afastamento seu do cargo recém-ocupado de ministra de Estado. O presidente Lula não pode admitir conviver com esses incômodos já na segunda semana de seu governo, sob pena de em breve estar sendo visto como tendencioso ou parcial.

Aliás, outros fatos aconselham a Lula um murro na mesa em nome da preservação da imagem: esta história do candidato do PT à presidência da Câmara, o deputado João Paulo Cunha, transformar-se em “líder sindical” do ministério e do próprio presidente, a reivindicar-lhes aumento salarial, é outra questão que precisa ser esclarecida em nome mesmo da preservação moral da prioridade primeira anunciada pelo novo governo. O programa Fome Zero, que deveria antecipar-se a todos os programas, está sendo adiado para fevereiro, enquanto avançam as propostas de aumento nas verbas de auxílio-moradia, verbas de gabinete e aumento de contracheques, não só do pessoal do Legislativo, mas do primeiro time do Executivo também…

Mas voltemos à bomba (não à referida pelo ministro da Ciência e Tecnologia) que o governo Lula não está conseguindo desarmar sem a ajuda do Judiciário: além do governo do Rio de Janeiro, já estão de pires na mão o do Espírito Santo, de Mato Grosso do Sul, de Goiás, de Minas Gerais, do Maranhão, de Mato Grosso e do Rio Grande do Sul. Logo, virão outros, como o de Santa Catarina e mesmo do Paraná. Todos eles escorregaram – assim se entende pelo pouco que se informa sobre o tema – em questões de responsabilidade fiscal, cada um a seu modo, por motivos vários.

Preocupado com essa realidade (“se abrirmos a porteira com os estados, passa uma boiada e o País pode quebrar”, disse o presidente do PT, José Genoíno), o ministro da Fazenda, Antônio Palocci tem repetido à exaustão que não haverá revisão dos contratos celebrados com os estados, cujos termos foram inclusive aprovados pelas respectivas assembléias legislativas. Ao mesmo tempo, entretanto, deixa entrever possibilidades outras de acerto, mesmo porque não pretende quebrar esse clima de lua-de-mel com partidos de oposição antes de iniciar seu projeto de reformas. No intrincado xadrez em que está metido, a preocupação com a popularidade é o que menos conta, entretanto. E, apesar do susto tomado com a liminar do STF (no mérito a questão deverá ser resolvida somente no mês que vem), se alguns governantes estaduais descumpriram a Lei Fiscal, convém que sejam punidos, sejam eles hoje ministros, figuras do partido ou da oposição – não os contribuintes de sempre.

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