O nascimento do cooperativismo se confunde com o nascimento do sindicalismo quando, no século XIX, traídos pela Revolução Burguesa, os trabalhadores percebem que a fábrica só trouxe condições humanas mais degradantes, impossibilidade de mudança de suas condições econômicas e exploração da força de trabalho sem limites.
Fica mais fácil compreender o que se passa neste período quando se analisa o conceito de “subordinação econômica em Marx”: a subordinação econômica sempre irá existir, do trabalho em relação ao capital, todavia, ela modifica conforme o período histórico: na cooperação e manufatura, quando o trabalhador ainda possui poder de comando, a subordinação é formal; a partir da grande indústria, inclusive nos tempos atuais, a subordinação é real uma vez que o trabalho é mero apêndice da máquina.
O resultado é a mais-valia absoluta (via aumento de jornada de trabalho) e o capitalismo não tem limite físico para crescer.
O cooperativismo nasce enquanto reação à revolução capitalista colocando-se como meta histórica a construção de uma outra sociedade, coletivista, em que os meios de produção seriam de propriedade comum ou propriedade privada mas acessível a todos (1).
Tem como finalidade a possibilidade de redenção do trabalhador enquanto que o sindicalismo propõe a modificação das relações de trabalho dentro da fábrica, no próprio contexto de exploração e venda de mão-de-obra, atenuada, regulada, amenizada pela pressão e poder de mobilização sindical.
Contudo, tanto o cooperativismo quanto o sindicalismo são conquistas da modernidade.
Na América Latina, os direitos dos trabalhadores, a partir da Constituição Mexicana e o próprio advento da CLT (1943) ainda não contemplaram os seus sujeitos haja vista a atual condição dos trabalhadores, número de demandas trabalhistas ou a faltas delas quando o artigo de luxo é o emprego.
E infelizmente para nós, os sujeitos latino-americanos, a Modernidade significou a negação da nossa condição de sujeito.
Quando se percebe que os trabalhadores latino-americanos sequer sabem quem exerce o comando de suas atividades, que com o elastecimento de jornada (via Banco de Horas e Contratos de Trabalho por prazo) a mais-valia mantém-se ilimitada, as afirmações de MARX são letras vivas e presentes em nosso contexto histórico provando-se nossa condição de negação em relação às conquistas da Modernidade.
Desta forma, como repensar nossa condição?
A libertação é a busca do paradigma para além do horizonte da exterioridade; é o paradigma da vida concreta de cada sujeito a partir do não-sujeito ou do sujeito negado, aquele que está para além do horizonte da inclusão.
Pensar a partir do não-sujeito significa pensar a partir do latino-americano, expropriado “desde a sua terra, seus frutos e suas profundezas, ricas e minerais, os homens e sua capacidade de trabalho e de consumo, os recursos naturais e humanos”(2), ou seja, o nativo da região das veias abertas.
O cooperativismo pode ser pensando e repensando a partir deste paradigma. Este será ao mesmo tempo o mais desafiador, o mais árduo e o mais fascinante ponto de partida para nova organização popular atrelada às conquistas da Modernidade em sua gênese porém partindo do não-sujeito: nós, os latino-americanos.
Notas
(1) Singer, Paul. Uma utopia militante: repensando o socialismo. 2.ª Ed. Rj: Vozes, 1998.
(2) GALEANO, Eduardo. Veias abertas da América Latina. 40.ª Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001.
Paulo Ricardo Opuszka
é advogado, mestrando em Direito pela Universidade Federal do Paraná e membro do Núcleo de Cooperativismo, Associativismo e Autogestão do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná.