Lembrando 64

Há semelhanças e dessemelhanças entre o Brasil de hoje e o de 1964, quando aconteceu o golpe militar. As dessemelhanças são mais eloqüentes, o que desde logo faz com que afastemos a idéia de um novo golpe. Isso não nos autoriza a fechar os olhos para a quebra da autoridade, a subversão às normas legais e a condescendência do poder público com os que o desafiam e às leis que tem por obrigação fazer obedecer. E mudá-las, se se fizer necessário. Em 1964, o mundo estava em luta. O comunismo de um lado, liderado pela União Soviética, e o capitalismo de outro, sob o comando dos Estados Unidos. A URSS não mais existe, os países comunistas são poucos e a China, o maior deles, pratica paralelamente ao seu socialismo uma boa dose de capitalismo. A guerra fria já era, embora possamos imaginar como sendo uma iminente guerra quente os arrufos entre os EUA e países muçulmanos, as guerras de fato contra Afeganistão e Iraque e as ameaças e contra-ameaças que envolvem o império norte-americano e a Coréia do Norte e o Irã.

Há um neo-imperialismo americano a preocupar o mundo e não mais o fantasma do comunismo, que tanto nos assustava, a ponto de mantermos os marxistas dos diversos matizes na ilegalidade. Hoje, os partidos marxistas são legais no Brasil e não assustam. E há unanimidade sobre a necessidade de resolvermos os problemas sociais. Esta bandeira não mais é privilégio das esquerdas.

O Brasil de hoje tem um governo sufragado pela grande maioria da população e caminha para a consolidação democrática. E, nesse caminho, também trilham as nossas Forças Armadas. Mas, ainda assim, existem semelhanças entre o Brasil de hoje e o de 1964. Detecta-as o governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos, do PMDB. Sobre o assunto falou à imprensa, depois de um encontro com o governador tucano de São Paulo, Geraldo Alckmin, quando discutiram o problema cada vez mais grave de invasões de terras públicas e particulares, edifícios e terrenos nas cidades, repartições públicas e outros atos de força praticados por movimentos diversos e crescentes de sem-terra, sem-teto e agora, também, sem-emprego. Cresce essa massa de necessitados, sob a liderança de pessoas da extrema-esquerda, que, aproveitando-se de problemas sociais efetivos e cruciais, buscam a subversão e, quem sabe, a tomada do poder.

Alckmin, governador de São Paulo, um dos estados que mais está sofrendo essas ações de esbulho, deu uma ordem geral. Cumprir as ordens judiciais de reintegração e usar a polícia, vale dizer, a força, se preciso. Jarbas não ousa falar em ameaça de golpe militar, mas vê fragilidade e condescendência por parte do governo federal, que tem, como escusa, seu ideário social e o fato de estar no poder há muito pouco tempo. Mas lembra que quando quis discutir com o presidente Lula as invasões que ocorrem em Pernambuco em grande escala, este não o recebeu, preferindo receber o MST. Jarbas diz que está assistindo a um filme que já viu em 64. Talvez só o capítulo do rompimento da hierarquia legal e a frouxidão do governo. Ele não ousa suspeitar de que as Forças Armadas, ou alguém dentro delas, possa vir a reagir contra a desordem que se espalha pelo País. É certo que tal não acontecerá porque hoje há uma firme vocação democrática nas nossas forças de defesa. Mas não é lícito imaginar que essa vocação anulará o desejo, direito ou a obrigação de impor a ordem, se a desordem dominar o País por complacência ou inação das autoridades civis.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo