Lembranças de Richa

José Richa nos legou muitas lembranças de seu espírito público, honestidade pessoal e lhaneza de trato. Guardo bem nítida a reminiscência do morador da Casa do Estudante, do presidente da União Paranaense dos Estudantes (UPE) e do jovem militante nas fileiras do Partido Democrata Cristão (PDC), liderado no Paraná pelo ex-governador Ney Braga.

Estivemos juntos trabalhando no Diário do Paraná, que reuniu, a partir da década de 50, uma plêiade de destacados jornalistas e cumpriu importante papel na imprensa, influenciando politicamente e contribuindo para muitas conquistas da sociedade paranaense.

Nos momentos culminantes e decisivos da história nacional, José Richa não se omitiu e tomou as atitudes que sua consciência apontava como o melhor caminho para a democracia.

Ele exercia mandato de deputado federal, eleito pelo Partido Democrata Cristão, quando o Ato Institucional n.º 2, em 1965, extinguiu todas as agremiações: Partido Trabalhista Brasileiro, União Democrática Nacional, Partido Social Democrático, Partido Democrata Cristão, Partido Republicano…

O regime militar estabeleceu regras de exigência de número mínimo de deputados federais e senadores para organização de novos partidos, significando na prática que só poderiam ser criados um do governo e outro da oposição.

Surgiram, assim, a Arena (Aliança Renovadora Nacional), de apoio ao Poder Executivo e ao sistema autoritário, e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro) para colocar-se na oposição, dando ao mundo a impressão de que o País vivia em democracia, com as duas casas do Congresso abertas e funcionando, embora erradicados muitos mandatos populares pelas cassações, sem direito de defesa.

José Richa não titubeou e foi dos signatários-fundadores do MDB. Disputou no período mais duro da repressão o pleito de senador, em 1970, não se elegendo, mas se alçando à Prefeitura de Londrina dois anos após e chegando ao Senado Federal em 1976.

Em memorável campanha eleitoral, vitoriou-se em 1982, agora pelo PMDB (Arena e MDB também foram extintos), para o Palácio Iguaçu, infligindo o primeiro insucesso eleitoral ao governador indireto Ney Braga, que não conseguiu eleger Saul Raiz e ele próprio perdeu a disputa ao Senado para Álvaro Dias.

José Richa retornaria ao Senado em 1986, com esmagadora maioria de votos, sinal da aprovação do povo paranaense às diretrizes de seu governo. Ele renunciou ao mandato para concorrer, deixando no seu lugar o vice João Elísio Ferraz de Campos.

Como nos embates políticos nem tudo são flores, ele sofreu impactante revés na eleição para governador do Paraná, em 1990, quando não obteve sufrágios suficientes para passar ao segundo turno. Ele conduziu aquela campanha sem o costumeiro entusiasmo, revelando apatia e desencanto com os métodos de proselitismo então praticados.

Richa ajudou a criar o PSDB, juntamente com Mário Covas, Marcelo Alencar, Euclides Scalco, Aécio Neves, Tasso Jereissati e outros, e teve presença marcante nas articulações para a escolha e eleição, em 1994, do presidente Fernando Henrique Cardoso, do qual não foi ministro de Estado nos seus oito anos de mandato porque não quis, uma vez que recebeu reiterados e insistentes convites para a chefia da Casa Civil e ministérios diversos.

Como ser humano, Richa valorizava as amizades, gostava das coisas simples e nunca se deslumbrou com as glórias ocasionais do poder, que ocupou na altitude das funções parlamentares (Senado e Câmara Federal) e no pináculo dos cargos executivos de prefeito de Londrina e governador do Paraná.

Como homem público ele se revestiu da auréola das virtudes republicanas de caráter, honorabilidade e coragem cívica, empenhando o vigor de sua atuação para resolver problemas da coletividade, com os olhos fitos no desenvolvimento econômico do Estado e da nação.

Vamos sentir saudades do amigo cordial e bonachão e vão fazer muita falta suas análises e conselhos sobre a conjuntura política e econômica do País. Remanescerá, para sempre, a recordação de uma vida consagrada ao culto da democracia e do bem-estar social do povo brasileiro.

Léo de Almeida Neves é ex-deputado federal e ex-diretor do Banco do Brasil. Autor dos livros Destino do Brasil: Potência Mundial, Editora Graal, RJ, 1995, e Vivência de Fatos Históricos, Editora Paz e Terra, SP, 2002.

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