Justiça penal cristã e espiritualidade (2)

Ciência à luz dos Direitos Humanos e do Evangelho de Jesus Cristo

Homenagem ao Eminente Dr. NILO PARANÁ Procurador de(da) Justiça (MP-PR) de Jesus Cristo

O afastamento entre ciência e religião se deu no final da idade média, com o movimento do iluminismo renascentista racionalista, afirmando valores humanistas da razão, da liberdade de pensamento e de expressão, em reação aos dogmas eclesiásticos e à fé irracional.

Na Grécia antiga tentou-se criar um saber científico independente de mitos e da religião, com Thales de Mileto, Anaxágoras, Parmênides e Euclides, e Aristóteles.

O cristianismo aprofundou o fosso entre a ciência e a religião, especialmente o extremismo da inquisição atingiu a intolerância plena da perseguição religiosa, a censura e a violência em geral.

A separação entre ciência e religião é causa de alienação de nossa época, se propaga erroneamente que as pessoas cultas tendem ao materialismo e os mais simples à religiosidade.

O direito atual continua privilegiando a prática e a técnica científica, propriamente ditas, com proposições do positivismo jurídico, desde o século XVIII e XIX; porém, vislumbra-se cada vez mais o entrelaçamento das normas com outras áreas do conhecimento humano, através do chamado estudo interdisciplinar e transdisciplinar das ciências jurídicas.

Exige-se hoje, reformas e mudanças no currículo básico do estudo do direito penal, capaz de aliar filosofia, teoria, prática e técnica aplicada em estrita observância aos Direitos Humanos, na busca dos princípios de justiça criminal, em prol do homem, do Estado e da sociedade em geral.

O ecumenismo ou a tolerância religiosa é necessário à integração e à multiplicação de propostas no campo social. O tradicional estudo do direito penal desde a divisão dos cursos de ciências jurídicas e ciências sociais, em 1879, retorna a discussão do ?saber?, do ?fazer? e do ?ser?; o direito penal protege a vida, a honra, a moral, os bens fundamentais individuais e coletivos, por esta razão necessita ser mais estudado e melhor aplicado, de maneira ampliada e amplificadamente.

Somente a filosofia, a ética e a religião são capazes de oferecer critérios e argumentos indispensáveis aos profissionais da área, aos magistrados e aos representantes do Ministério Público, como encarregados de aplicar a norma vigente e fiscalizar a sua correta interpretação, em nome da justiça e das garantias fundamentais da cidadania.

Profetizou o Velho Testamento, um anjo Gabriel – mensageiro de DEUS aparecerá à Maria que com sua maternidade espiritual conceberá, ?por obra do Espírito Santo? (Mateus 1:19) e ?dará à luz a um menino que se chamará Imanuel? (?Deus connosco?) JESUS, filho de Deus.

Na data em que Maria deu a luz a Jesus (25 de dezembro) celebra-se o início do Novo Tempo, da Glória, da Esperança, do Esplendor e da Justiça; e em 8 de dezembro quando se comemora o dia da Justiça e de Nossa Senhora da Imaculada Conceição ou da Concepção (Virgem pela Redenção universal efetuada pelo nascimento de Cristo, bula ?Ineffabilis Deus?, de 1854, do Papa Pio IX).

Três Reis-Magos iniciam a peregrinação acompanhando uma estrela até encontrar Menino Jesus, ofertando-lhe presentes – ouro, incenso e mirra -, por considerarem o futuro Rei dos Reis, mas Herodes não admite e determina o massacre e extermínio de todas as crianças recém-nascidas com até 2 anos de idade, em Belém de Judá segundo o evangelho de Marcos e João, e em Nazaré de acordo a Mateus e Lucas.

Maria e José são obrigados a fugirem para o Egito e evitar a morte de Jesus, numa espécie de exílio em busca de proteção à vida, contra perseguição e tirania (Convenção para a Prevenção e Sanção do Delito de Genocídio ONU/1948 e Lei n.º 2.889/56).

Jesus aos 12 anos de idade entrou no Templo e começou a ensinar, e quando voltou adulto, ficou furioso com a demagogia dos sumos sacerdotes, pelos roubos, corrupções e explorações contra o povo. Indignou-se com aqueles que negociavam no templum, lugar destinado as atividades religiosas. Cristo com seu cajado afastou os profanadores e prostitutos da verdade e da justiça.

Os espaços dos templos e dos fóruns são para orar, pedir e realizar justiça e não ao cometimento de sacrilégios ou infrações. Jesus chamou todos de gente serpentina de dupla cara e hipócrita por não assumirem a sua fé e o seu juramento, difamando e usando em vão o nome de Deus, falseiam a Verdade e brincam com a Justiça. Condenamos e absolvemos a toda hora na ignorância das Leis de Deus (Gaspareto, Zibia, ?Somos Todos Inocentes?, ed. Vida e Consciência, SP, 2006).

Dois terços da obra de Cristo foi pedagógica, é o pão nosso de cada dia, tomemos cada um de nós a nossa cruz, como dor e sofrimento (Marcos 8:34), em nome da Justiça, da fé, responsabilidade e amor a Deus. ?Então disse Jesus aos seus discípulos; se algum quer vir após de mim, negue-se a si mesmo, e tome a sua cruz, e siga-me; porque o que quiser salvar a sua alma por amor de mim, achá-la-á; e todas estas coisas são princípios das dores? (Mateus 16: 24-25; 24:8).

Quem ama nunca desiste, a tudo suporta (1 Coríntios 13:4-7). A morte de Jesus revelou a Sua Vida e as nossas (in)justiças. Justiça é sentimento de fé e de esperança, inerente ao ser humano, razão pela qual incumbe aos profissionais da área, o dever-missão de prestigiá-la, sem prejuízo ao principio da autonomia funcional e da liberdade profissional, o que significa o livre convencimento e a proibição de censura (art. 5.º, inc. IV, IX e XIII; e art. 220, § 2.º CF), em todos os sentidos. O batismo de Jesus no rio Jordão representa aos cristãos a missão de fé, que dá origem ao juramento dos bacharéis e profissionais do direito: juizes, promotores de justiça e advogados (ver Lei Complementar n.º 35/79 Orgânica da Magistratura, Lei n.º 8.625/93, Orgânica Nacional do Ministério Público dos Estados e Lei n.º 8.906/94, Estatuto da Advocacia e da OAB).

Ainda há aqueles que lavam as mãos com suas pretensas e supostas justiças, fecham os olhos e se recusam a se ver diante do espelho, condenando com facilidade o próximo, em nome das leis imperfeitas ou das convenções humanas infelizes.

?Não queirais julgar, para não sejais julgados; pois com o juízo com que julgardes, sereis julgados, e com a medida com que medires, vos medirão também a vós; todo aquele pois que ouve estas minhas palavras, e as observa, será comparado ao homem sábio, que edificou a sua casa sobre rocha; e todo o que ouve estas minhas palavras, e as não observa, será comparado ao homem sem consideração, que edificou a sua casa sobre areia? (Mateus 7:1-2 e 7: 24-26).

S. Lucas indagou ao Mestre: ?por que, perdoas e consolas o pecador e todos os fracos e doentes, exceto os hipócritas?; respondeu Jesus: ?perdôo os pecadores por sua fraqueza de corpo e sua enfermidade de espírito, pois suas falhas foram-lhes transmitidas por seus ancestrais ou pela cobiça de seu próximo. Os fracos pecadores são como pássaros jovens que caem do ninho. O hipócrita é como o abutre que espera sobre o rochedo pela morte de sua presa. Os fracos são homens perdidos no deserto, o hipócrita não está perdido, ele ri entre as areias e o vento? (ob. cit. Khalil Gibran, pg. 37-38).

Conta o Evangelho que: ?Havia em certa cidade um juiz que não temia a Deus, nem respeitava os homens? (Lucas 18:2); a este magistrado iníquo, perverso e injusto falta-lhe fé em Jesus Cristo e respeito à dignidade humana (ver Sobrino, Jon, in ?La Fé em Jesucristo?, ed. Trotta, Madrid, 1999).

Por outro lado, em uma mensagem espírita (Cândido Xavier, Francisco, in ?Alvorada Cristã?, ed. FEB, 9.ª ed. 1987, pág. 137/139) tem-se: ?um certo juiz cristão, rigoroso na aplicação da lei humana, encontrando-se em meio de uma sociedade corrompida e perversa, ante o dever de prolatar inúmeras sentenças criminais, seu coração cada vez mais foi endurecendo, atormentado e angustiado orou implorando a presença e auxílio de Jesus, perguntando-lhe:

– Mestre, que normas adotar perante um homicida?

R. O remédio corretivo, por doente da alma

– Como agir, ante o delinqüente rude?

R. Deve valer-se de nosso auxílio, através da educação, pelo amor paciente e construtivo

– Que corrigenda aplicar ao preguiçoso?

R. Está condenado a manejar a enxada ou a picareta, para conquistar o pão como o suor do rosto

– Que fazer da mulher pervertida ?

R. Devemos o amparo fraterno, a fim de que reerga para a elevação do trabalho e para a dignidade humana.

– Como julgar o ignorante ?

R. Está condenado aos bons livros

– E o fanático ?

R. Deve ser ouvido e interpretado com tolerância e caridade, até que aprenda a libertar a própria alma

– Que diretrizes adotar perante um ladrão ?

R. Condenado a oficina e a escola, sob vigilância benéfica

– Se o ladrão é um assassino ?

R. Condenado ao hospício, onde se lhe cure a mente envenenada.

Após as perguntas e respostas o jurista entendeu que deveria substituir a discriminação de castigos por remédios, de serviços, fraternidade e educação; indagando ainda o juiz à Jesus:

– Mestre, e de mim que farei ?

R. O cristão está condenado a compreender e ajudar, a amar e perdoar, educar e construir, com tarefas edificantes e renovadoras?.

O Novo Modelo Renovador para a Justiça Criminal se visualiza com a implantação da chamada Justiça Penal Reparadora, Reconstrutiva ou Recriadora, visto que a ressocialização ou a reintegração social como objetivo da pena privativa de liberdade (art. 1.º LEP), não tem mostrado nenhuma eficácia ou eficiência, pelo contrário, a prisão a nível mundial tem produzido resultados negativos no processo da prisionalização, sem coibir a reincidência criminosa; nesse sentido o eminente professor espanhol Dr. Antonio Beristain, ensina-nos o denominado ?Direito Penal do Perdão? (Beristain, Antonio, in ?Nova Criminologia à luz do Direito Penal e da Vitimologia?; ed. UNB, Brasília, 2000, trad. MAIA NETO, Cândido Furtado).

Ao ?Estado-Acusação? não lhe interessa condenar por condenar, denunciar por denunciar; seu órgão deve atuar com racionalidade dentro da legalidade, para realizar e alcançar a efetiva justiça criminal através da promoção ministerial em prol das garantias fundamentais dos indivíduos. O Ministério Público é um ?ministério social?… Na dúvida, arquiva-se, tranca-se a Ação Penal ou absolve-se (in dubio pro reo), e nunca se processa, pronuncia-se ou condena-se (in dubio pro societate). As garantias individuais são direitos concretos que prevalecem ante as abstrações (in dubio pro societate), estas servem ao direito autoritário, aos regimes antidemocráticos ou aos governos ditatoriais. Não se pode permitir que nos regimes democráticos as abstrações ?em nome da sociedade? venham destruir o sistema jurídico humanitário positivo, para dar lugar a um odioso direito repressivo, onde o Estado condena e acusa sem provas concretas. (MAIA NETO, Cândido Furtado, in ?Promotor de Justiça e Direitos Humanos: Acusação com racionalidade e legalidade por um Ministério Público democrático?; 2.ª ed. Juruá, 2007, Curitiba, pg. 37 e 107; e Ministério Público Pró-Direitos Humanos e Justiça Criminal?, in Revista Paraná Judiciário; Tribunal de Justiça e Tribunal de Alçada do Paraná; Vol. 44; ed. Juruá; Curitiba, 1994).

Ao se falar de Justiça Penal Cristã devemos aceitar e reconhecer a tolerância e o perdão para uma prática processual penal verdadeiramente democrática e humanitária (MAIA NETO, Cândido Furtado: ?Tolerância Zero: Justiça Penal e Direitos Humanos. Política Criminal (Nova York-USA) contra os melhores postulados da ciência, da filosofia e da história universal?, pub. Jornal O Estado do Paraná Caderno Direito e Justiça, pg. 8/9, 29/4/2007, Curitiba-PR.; www.aidpbrasil.org.br, maio/2007; e www.jusvi.com.br, dezembro/2007).

Os princípios da oportunidade, da insignificância, da proporcionalidade, da boa fé, do Estado ético e, especialmente o princípio humanitário, unidos aos institutos do perdão, da renúncia, da indulgência (anistia, indulto), representam a misericórdia na justiça penal cristã.

O perdão é como um óleo no motor, um poder invisível que mantêm as engrenagens – a vida – funcionando. Perdoar significa andar para frente (ob. cit. Beth, Jones, Laurie, pg.101), fazer justiça, reparar o erro ou a falta, arrepender-se e conciliar-se.

Jesus é o máximo exemplo de perdão, na passagem do julgamento e apedrejamento público da mulher adultera, podemos ver: ?Quem de vocês estiver sem pecado que atire a primeira pedra?. E todos foram se retirando cabisbaixo, dirigindo-se à mulher disse Cristo: ?Vá e não peque mais? (João 8:7-11). A lei e os homens tanto podem proibir, condenar como também indultar, agravar ou atenuar as situações. ?O que está proibido na Terra será proibido no Céu, e o permitido na Terra será permitido no Céu? (Mateus 18:18).

A declaração misericordiosa de Jesus: ?Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem? (Lucas 23:33-34), se traduz na capacidade e poder de perdão até para os mais terríveis atos. Somente os fortes podem ser tolerantes, os verdadeiros magistrados aplicam com mais assiduidade o instituto do perdão judicial (art. 120 CP e art. 107 CP), como os princípios de insignificância e de humanidade.

?Então chegando-se Pedro a Ele, perguntou: Senhor, quantas vezes poderá pecar meu irmão contra mim, que eu lhe perdoe? será até sete vezes? Respondeu-lhe Jesus: Não te digo que até sete vezes, mas que até setenta vezes sete vezes? (Mateus 18:21-22).

Cândido Furtado Maia Neto é professor pesquisador e de pós-graduação (especialização e mestrado). Associado ao Conselho Nac. de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito (Conpedi). Pós Doutor em Direito. Mestre em Ciências Penais e Criminológicas. Expert em Direitos Humanos (Consultor Internacional das Nações Unidas Missão Minugua 1995-96). Promotor de Justiça de Foz do Iguaçu-PR. Do Movimento Nacional Ministério Público Democrático (MPD). Secretário de Justiça e Segurança Pública do Ministério da Justiça (1989/90). Assessor do Procurador-Geral de Justiça do Estado do Paraná, na área criminal (1992/93). Membro da Association Internacionale de Droit Pénal (AIDP). Autor de vários trabalhos jurídicos publicados no Brasil e no exterior.
E-mail: candidomaia@uol.com.br www.direitoshumanos.pro.br

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