Com a Emenda Constitucional n.º 45 (publicada dia 31/12/2004), denominada de ?Reforma do Judiciário? a vetusta Justiça do Emprego, transformou-se na verdadeira Justiça do Trabalho, pois teve sua competência ampliada para dirimir todas as ações oriundas da relação de trabalho, é salutar a modificação, para enaltecer a importância da Justiça do Trabalho num Estado de Direito.
A redação anterior à Emenda, o artigo 114 da CRFB/88 vaticinava que: ?Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas.?, a nova redação assim dispõe: ?Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: I- as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,…?; assim sendo, podemos observar a supressão do termo ?conciliar? na nova redação do artigo.
Alguns doutrinadores sustentam um mero esquecimento por parte do legislador ao elaborar a norma, porém entendemos que tal supressão foi proposital, com o escopo de moldar o processo do trabalho à nova competência. Como sabemos, hoje a Justiça do Trabalho não julga apenas os dissídios entre empregador e empregado, mas as controvérsias oriundas da relação de trabalho (lato sensu).
A conciliação é utilizada como um meio alternativo para solução dos conflitos, não sendo de uso exclusivo do processo laboral, Mauro Cappelletti e Bryant G. Garth, na obra Acesso à Justiça, incluem a conciliação na terceira onda de acesso a justiça (utilização de meios alternativos para a solução dos conflitos). Hodiernamente a jurisprudência pátria laboral entende que a proposta de conciliação por parte do magistrado é obrigatória, levando a eiva de nulidade o processo que não contiver tal proposta.
O legislador elencou na CLT dois momentos em que deverá ser proposta a conciliação, art. 846: ?Aberta a audiência, o juiz ou presidente proporá a conciliação.? Art. 850 – ?Terminada a instrução, poderão as partes aduzir razões finais, em prazo não excedente de 10 (dez) minutos para cada uma. Em seguida, o juiz ou presidente renovará a proposta de conciliação, e não se realizando esta, será proferida a decisão.?
Entendemos que no Processo do Trabalho a conciliação é um Princípio -guiando nosso alvitre está Carlos Henrique Bezerra Leite, que elenca em sua obra ?Curso de Direito Processual do Trabalho? a conciliação como um princípio do Processo Laboral.
Não podemos olvidar que com o advento da Emenda Constitucional n.º. 45/2004 todas(1) as relações de trabalho foram abarcadas na competência juslaboralista e assim sendo, iremos aplicar o processo do trabalho para todos os conflitos oriundos da relação de trabalho?
O doutrinador carioca Leonardo Dias Borges(2) entende que ?haveremos de continuar utilizando a CLT, para os casos regulados por ela e o CPC, para as ações cíveis?, entretanto o Colendo Tribunal Superior do Trabalho em fevereiro de 2005 publicou a Instrução Normativa n.º. 27 (3) a qual estabelece: ?As ações ajuizadas na Justiça do Trabalho tramitarão pelo rito ordinário ou sumaríssimo, conforme previsto na Consolidação das Leis do Trabalho, excepcionando-se, apenas, as que, por disciplina legal expressa, estejam sujeitas a rito especial, tais como o Mandado de Segurança, Hábeas Corpus, Habeas Data, Ação Rescisória, Ação Cautelar e Ação de Consignação em Pagamento.? A atitude no TST é louvável com relação à política judiciária, pois ?pacificou? a enorme divergência a cerca da aplicação ou não da CLT, porém a instrução não é fruto de um cientificismo jurídico.
Na ilação de Carlos Maximiliano a lei não contém palavras inúteis, se pararmos para refletir, podemos concluir que a supressão do termo conciliar teve como desiderato à não aplicação do Princípio da Conciliação para todas as lides relativas as relações de trabalho, mas somente para a relação empregatícia, a qual temos previsão expressa na CLT (art. 846 e 850) conforme alhures comentado.
Seguindo as lições dos jus-filósofos pós-positivistas (neoconstitucionalistas), principalmente do professor Ronald Dwokin, da universidade de Harvard nos EUA e o alemão Robert Alexy, um sistema jurídico é composto por normas e estas se dividem em princípios e regras, estás tem ou não total aplicação, é tudo ou nada (all or nothing), já os princípios são mais elásticos, se amoldam no tempo, conforme a necessidade histórica, podem estar implícitos ou explícitos, sendo mais grave uma violação a um princípio do que a uma regra, justificando inclusive a pena de nulidade do processo quando o juiz não faz proposta de conciliação para os atores sociais.
Conclusão: A supressão do termo ?conciliar? foi intencional pelo legislador, continuando obrigatória à proposta de conciliação (Princípio da Conciliação) nos litígios envolvendo relação empregatícia, sob pena de nulidade do processo; já com relação os litígios decorrentes da matéria relação de trabalho (art. 144 da CRFB/88), não será a conciliação um princípio informador, mas apenas uma forma de solução de conflitos, não tendo o condão de gerar a nulidade do processo a sua falta.
Notas:
(1) Entendemos que a Justiça do Trabalho não deve julgar relação de consumo (prestadores de serviço).
(2) Leonardo Dias Borges juntamente com Cláudio Armando C. de Menezes escreveram um brilhante artigo no Livro ?Nova Competência da Justiça do Trabalho, Coord. Grijalbo Fernandes Coutinho e Marcos Neves Fava, editora Ltr?.
(3) Dispõe sobre normas procedimentais aplicáveis ao processo do trabalho em decorrência da ampliação da competência da Justiça do Trabalho pela Emenda Constitucional nº 45/2004.
Rodrigo da Costa Clazer é professor de Direito do Trabalho, pós-graduando em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes (UCAM) e advogado em Curitiba-PR.
