O ministro da Fazenda, Antônio Palocci Filho, é médico. Como tal, aproveita os exemplos de sua profissão para tentar explicar ao povo as difíceis equações da economia. Com o Conselho de Política Monetária (Copom) do Banco Central surpreendendo o mercado, com a derrubada da taxa básica de juros (Selic), em 2,5 pontos percentuais, quando o mercado apostava em um máximo de 1,5 ponto, podemos dizer, imitando Palocci, que o que aconteceu foi como se um paciente com 40 graus de febre de repente acusasse 39,5%. Uma febre ainda altíssima, mas, de qualquer forma, um indício de melhora. Ou o nascimento de uma esperança de que, daqui para frente, a doença vai ceder e até pode, um dia, acabar curada.
Miguel José Ribeiro de Oliveira, presidente da Associação Comercial dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade – Anefac, de São Paulo, diz que a surpreendente redução dos juros básicos não livrou muito o bolso do consumidor que tem dívidas no crédito pessoal ou no cheque especial. Segundo os cálculos da entidade que preside, um consumidor que tem uma dívida de R$ l mil teve a taxa de juros caindo de 8,70% para 8,52%. Obteve uma redução de apenas R$ l,80 mensal. “Não dá para sentir o corte porque a taxa anual ainda é muito alta”, ensina Ribeiro de Oliveira. Mas nos consola anunciando que os cortes feitos pelos bancos nas taxas de juros foram maiores que o ditado pelo Copom do Banco Central. O Selic, por exemplo, caiu no mês 0,17 ponto e a Caixa Econômica Federal reduziu a sua taxa de juros em 0,95 ponto percentual no mês. Também o Santander Banespa reduziu a taxa de juros acima da queda ditada pelo Copom para a Selic.
Oliveira explica que a taxa básica do governo é apenas um dos itens que compõem os juros cobrados dos consumidores. Neles ainda incluem o risco de inadimplência, os impostos elevados e o “spread”, que é o ganho dos bancos.
Oliveira aconselha que os bancos diferenciem os bons dos maus pagadores, oferecendo àqueles taxas menores.
Não há como negar, entretanto, que a queda da taxa básica de juros, em percentual acima do esperado pelo mercado, é uma notícia positiva. Ela instila confiança no mercado de que as taxas continuarão declinantes e que um dia possam ter um tamanho decente. A Constituição de 1988, vigente em parte porque muitos de seus artigos ficaram pendentes de regulamentação, limita os juros em 12% ao ano. Sonho impossível, pois não dá para tabelar o que depende da lei da oferta e da procura. E, em segundo lugar, porque a regulamentação nunca aconteceu.
Nos Estados Unidos e no Mercado Comum Europeu, os juros estão em 1% ao ano, como uma forma de estimular a produção e o consumo. Entre nós, a nova taxa básica de 22,5% ao ano, tão distante daquela norte-americana e da européia, infelizmente repercute muito pouco nas taxas cobradas pelo sistema financeiro. Mas isso não significa que a decisão do Copom não foi positiva
A prejudicá-la existe, ainda, o fato de que se tem verificado, nos últimos anos, que a massa salarial dos trabalhadores vem encolhendo. Ganhando menos, os consumidores pouco podem aproveitar de uma ainda pequena queda das taxas de juros na ponta dos financiamentos.
É preciso que o movimento declinante continue, sem prejuízo do controle da inflação e que comecem as reposições salariais. Os trabalhadores precisam ganhar mais para poder comprar mais, mesmo que as taxas de juros estejam minimamente menores.