1.Introdução

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O objetivo desta exposição é discorrer sobre tema: “Juiz e advogado: peças fundamentais na prestação jurisdicional”, limitando-se, porém, essa apreciação a destacar os poderes do juiz, em face das últimas reformas do Código de Processo Civil, que ampliaram os seus poderes na condução do processo, e os direitos e obrigações do advogado, com realce especial quanto ao relacionamento que deve existir entre magistrado e advogados, objetivando a agilização da prestação jurisdicional, de acordo com o preceito constitucional que assegurar; a razoável duração do processo, com a utilização de “meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (artigo 5.º, inciso LXXVIII, da CF).

2. Desenvolvimento.

Os poderes do juiz, após as reformas pontuais do Código de Processo Civil, e seu relacionamento com o advogado.

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Com o início das reformas parciais do Código de Processo Civil (CPC), a partir da Lei 8.952/1994, que alterou a redação do artigo 273, criando a tutela antecipada, até a promulgação da Lei 11.232/05, que modificou o conceito de sentença e a execução judicial, e da Lei 11.382/06, que deu nova sistemática à execução extrajudicial, e diante das normas já existentes de proteção e defesa do consumidor (Lei 8.078/90 Código de Defesa do Consumidor), de ordem pública e interesse social (art. 1.º), os poderes do juiz foram consideravelmente ampliados, exigindo-lhe constante atualização, para que possa acompanhar novos ensinamentos oriundos da doutrina e da jurisprudência e decorrentes da aplicação da recente legislação.

Não bastasse isso, é sabido que o direito moderno está sendo buscado de forma crescente além dos textos normativos e não apenas em razão do surgimento dos princípios e de sua força impositiva, mas igualmente por causa da idéia cada vez mais nítida de que a exigüidade das normas não abarca a complexidade do direito(1).

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Ora, para atender essa exigência de capacitação do magistrado, foi muito importante a criação da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento do Magistrado (Enfam), através da Emenda Constitucional n.º 45/04, e a atuação permanente, há vários anos, das Escolas da Magistratura.

As Escolas da Magistratura Federal e Estadual têm desempenhado um papel relevante, quer na preparação dos advogados que pretendem concorrer ao concurso para ingresso na magistratura cursos de especialização -, quer na atualização, especialização e aperfeiçoamento dos magistrados, inclusive ministrando-lhes conhecimentos específicos sobre psicologia, filosófica e sociologia -, ciências estas indispensáveis para o exercício da função jurisdicional.

O conhecimento de tais ciências torna o magistrado mais humano, mais compreensivo e mais justo na aplicação do direito. Isto é importante, porque a missão do juiz, basicamente, consiste em resolver os problemas de outrem; solucionar controvérsias; para facilitar a vida alheia e trazer harmonia e felicidade aos seus semelhantes(2). Para tanto, é necessário que os juízes participem ativamente das discussões a respeito de seu papel social e procurem, com serenidade e coragem, indicar de que modo poderão ser mais úteis à realização da justiça(3).

O Ministro CÉSAR ASFOR ROCHA(4), presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), discorrendo sobre a matéria, escreveu:
Não há razões para se tornar o juiz um recluso ou um desconfiado de todos, pois deve naturalmente conviver com os que o cercam, mantendo relações normais de convivência: sem isso, ele se desligará da realidade do mundo e talvez não possa sintonizar suas idéias com as que circulam na sociedade e servem de inspiração e motivação para seu trabalho intelectual.

Entre as obrigações impostas ao juiz cabe, aqui, destacar a de receber bem todos que o procuram, com especial atenção aos advogados, acompanhados ou não de seus clientes, porque se constitui em um ato de educação. Além disso, o advogado, também, tem o direito de ser recebido a qualquer momento pelo magistrado, para tratar de providência que reclame e possibilite solução de urgência (inc. IV, do art. 35, da Loman).

Ao receber o advogado em seu gabinete de trabalho, ou, em sua residência, para tratar de medidas de urgência tutela antecipada ou liminares em ações civis ou penais , deve o juiz ouvir com a mesma atenção a exposição do advogado, recém formado, que está dando seus primeiros passos na sua profissão(5), ou o advogado já experiente, com vários anos de atividade no fórum.

Em suma, o magistrado deve dar toda atenção ao advogado, ainda que a causa que ele esteja patrocinando seja simples, e sua exposição verbal até pareça desnecessária, embora o tempo disponível do magistrado sempre seja escasso(6).

Um exemplo sempre ilustra melhor um pensamento. Lembre-se, aqui, da pessoa de um ilustre magistrado que, na sua atividade jurisdicional, reuniu todas as virtudes do juiz integral: MILTON LUIZ PEREIRA. Juiz íntegro, competente e admirado por todos que tiveram o prazer de com ele conviver e continuam convivendo, após a sua aposentadoria. Dr. Milton teve uma trajetória brilhante na magistratura federal, iniciada como um dos primeiros juízes da Justiça Federal da Comarca de Curitiba e concluída no elevado cargo de Ministro do Superior Tribunal de Justiça.

Advogado: peça fundamental na administração da justiça; seus diretos e obrigações.

O advogado não só é indispensável à administração da justiça (art. 133/CF e art. 2.º/Lei 8.906/94), como também presta serviço público e exerce função social (§ 1.º, do art. 2.º, citado)

O Estatuto da Advocacia relaciona, no seu artigo 7.º, os direitos do advogado. Cabe destacar, entre outros: a) a liberdade: no exercício da profissão (inciso I); na inviolabilidade de seu local de trabalho (inciso II); b) a comunicação: com seus clientes, mesmo sem procuração, quando estiverem presos (inciso III); c) de ingressar livremente: nas salas de sessões dos tribunais (inciso VI, a); nas salas de audiências e demais repartições judiciais; em edifícios públicos e em qualquer assembléia ou reunião de que participe seu cliente (inciso VI, b, c e d); d) de utilização da palavra: sustentar suas razões, nas sessões de julgamento (inciso IX); em qualquer juízo ou tribunal, para esclarecer equívoco ou dúvida, relacionada a fatos, documentos ou afirmações que influam no julgamento (inciso X); reclamar contra inobservância de preceito de lei, regulamento ou regimento (inciso XI); e) de examinar peças e autos de processo: em qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou da Administração Pública em geral, de autos de processos findos ou em andamento, mesmo sem procuração (inciso XIII); de retirar autos findos, mesmo sem procuração (inciso XVI), e outras prerrogativas previstas no Estatuto (incisos XVII, XVIII, XIX e XX, do artigo citado).

O advogado, também, tem deveres a cumprir, decorrentes de sua atividade profissional, para com a comunidade, o cliente e o outro advogado, a publicidade, a recusa do patrocínio, o dever de assistência jurídica e o dever geral de urbanidade e os respectivos procedimentos disciplinais, previstos no Código de Ética e Disciplina da OAB (par. único, do artigo 33, do Estatuto da Advocacia).

DE PLÁCIDO E SILVA, discorrendo sobre a ética profissional, ensina que essa expressão é usada, para indicar a soma de deveres, que estabelece a norma de conduta do profissional no desempenho de suas atividades e em suas relações com o cliente e todas as demais pessoas com quem possa ter trato(7).

Sendo uma ciência moral, a ética nos fornece princípios de vida, um modo de ser que, fundamentado na razão e na livre escolha, procura pela prática das virtudes ou forças positivas realizar a plenitude do nosso ser e assim atingir a felicidade e o nosso bem estar(8).
No Paraná, o Tribunal de Ética e Disciplina da OAB tem desenvolvido um trabalho exemplar, não só orientando e aconselhando os advogados sobre ética profissional, e respondendo às consultas a ele formuladas, mas também julgando os inúmeros processos disciplinares (art. 49 do Código), encaminhados pelas diversas Comarcas do Estado.

No exercício de sua nobre profissão, o advogado deve observar os princípios éticos. Porém, isto não o impede de ter nenhum receio de desagradar a outrem (a parte contrária, o juiz da causa, ou o promotor de justiça), nem de incorrer em impopularidade.

No entanto, é dever do advogado tratar as pessoas com respeito, discrição e independência, exigindo igual tratamento e zelando pelas prerrogativas a que tem direito (art. 44 do Código de Ética), para que o torne merecedor de respeito e, assim, possa contribuir para o prestígio da classe e da advocacia. (art. 31 do Estatuto).

Com referência à conduta e à linguagem do advogado ao postular e atuar em Juízo, desde a formulação da petição inicial até a interposição dos recursos admitidos pela Lei Processual, elas devem ser: com “lhaneza, emprego de linguagem escorreita e polida, esmero e disciplina na execução dos serviços” (art. 45)

PIEDRO CALAMANDREI, em seu famoso livro “Eles, os juízes, vistos por nós, os advogados”, apresenta sobre o tema a seguinte lição:
…uma boa regra de boa educação para uso do pretório: adverte o advogado, apaixonado pela sua causa, que não deve dar-se ares de ensinar o direito aos juízes esse direito em que eles são mestres. Seria talvez grande jurista, mas certamente péssimo psicólogo…(9)
O mestre italiano, ainda, acrescenta como deve ser um grande advogado. Em suas palavras: quer dizer advogado útil aos juízes, para os ajudar a decidir de acordo com a justiça e útil aos clientes, para ajudar a fazer valer as suas razões; que fala apenas o estritamente necessário, que escreve clara e concisamente; que não aborrece aos juízes com a sua prolixidade nem os põe desconfiados com as suas subtilezas(10).

O bom texto jurídico, que atende ao ensinamento de CALAMANDREI, deve conter três características fundamentais: clareza, objetividade, elegância(11). Para alcançar esse objetivo, os operadores do direito isto vale, também, para os magistrados devem tomar algumas atitudes: ter gosto pela leitura, porque a profissão exige atualização permanente, em razão da promulgação de novas leis; dos ensinamentos doutrinários e jurisprudenciais. Para tanto, torna-se necessária diariamente: a leitura de jornais (locais e de circulação nacional); de revistas especializadas, e o acesso aos sites dos Tribunais Superiores e do Tribunal de Justiça do Estado, a fim de que possam manter atualizados e capacitados para exercer a advocacia com segurança(12).

Um exemplo de advogado a ser seguido: Dr. NEWTON JOSÉ DE SISTI. Em 2009, o ilustre advogado completou cinquenta anos de atividade jurídica e oitenta (80) anos de vida. Pessoa simples, competente, ética, possuidora de uma linguagem escorreita e polida, dedicada inteiramente à família e à advocacia, com atuação marcante na OAB, Seção do Paraná, e no Instituto dos Advogados do Paraná.

3. Encerramento.

Por fim, merece especial destaque um pensamento de RUI BARBOSA, extraída da “Oração aos Moços” – discurso proferido como paraninfo da turma de bacharéis de 1920 da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo -, que bem demonstra como as atividades do juiz e do advogado se entrelaçam, objetivando o bem maior: fazer justiça:
Na missão do Advogado também se desenvolve uma espécie de magistratura. As duas se entrelaçam, diversas nas funções, mas idênticas no objeto e na resultante: a justiça. Com o advogado, a justiça militante. Justiça imperante, no magistrado.

REFERÊNCIAS.
1. ALMEIDA PRADO, Lídia Réus de. O juiz e a emoção. Aspectos da Lógica da Decisão Judicial. Campinas: Millennium editora. Ed. 2005.
2. CALAMANDAREI, Piedro. Eles, os juízes, vistos por nós, os advogados. Lisboa: Livraria Clássica Editora. 1960. 3.ª Ed
3. DALLARI, Dalmo de Abreu. O Poder dos Juízes. Rio de Janeiro: Saraiva. Ed. 1996.
4. HERMANS, Wilhelmus Godefridus, ETICA Ensaio sociofilosófico. OAB Editora. Ed. 2004.
5. MÜSSNICH, Francisco. Carta a um jovem advogado. Paixão, determinação e talento. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda. 3.ª Ed.
6. ROCHA, César Asfor. Cartas a um jovem juiz. Cada processo hospeda uma vida. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda. Ed. 2009
7. SILVA, De Plácido. Vocabulário Jurídico. Vol. II. 1.ª Ed. 1963.
Notas:
(1) ROCHA, César Asfor. Cartas a um jovem juiz. Cada processo hospeda uma vida. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda. 2009, p. 59.
(2) ALMEIDA PRADO, Lídia Réus de. O juiz e a emoção. Aspectos da Lógica da Decisão Judicial. 3.ª ed. Campinas: Millennium editora. 2005. Prefácio item XI.
(3) DALLARI, Dalmo de Abreu. O Poder dos Juízes. Rio de Janeiro: Saraiva. Ed. 1996, p. 163.
(4) ROCHA, César Asfor. Op. Cit., p. 136
(5) ROCHA, César Asfor. Op. Cit., ps. 141.
(6) Idem, p. 142
(7) SILVA, De Plácido. Vocabulário Jurídico. Vol. II, São Paulo: Forense, 1.ª Ed., p. 12.
(8) HERMANS, Wilhelmus Godefridus, ETICA Ensaio sociofilosófico. OAB Editora; 2004, p. 58.
(9) CALAMANDREI, Piedro. Eles, os juízes, vistos por nós, os advogados. Lisboa: Livraria Clássica Editora. 1960. 3.ª Ed., p. 39.
(10) Idem, p. 108.
(11) MÜSSNICH, Francisco. Carta a um jovem advogado. Paixão, determinação e talento. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda. 3.ª Ed., p. 29.
(12) MÜSSNICH, Francisco. Op. Cit., p. 29.

Accácio Cambi é conciliador Voluntário do TJ-PR e pós-graduado em Processo Civil.