Brasília (AE) – Foi um duelo verbal recheado de ironia. Sentado à primeira fileira do Conselho de Ética da Câmara, o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) cumpriu o prometido: olho no olho, acusou o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu de ser o chefe do esquema de pagamento de mesada a parlamentares da base aliada. Pela primeira vez, porém, o algoz de Dirceu falou num sócio para a suposta operação. "Pela monta do negócio, pelo tamanho da operação, Vossa Excelência não está sozinho nisso", afirmou.
Diante de um Dirceu circunspecto, sem saber se ele estava ou não se referindo ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Jefferson não se conteve. Confessou com todas as letras o seu ódio. "Tenho medo de Vossa Excelência, porque Vossa Excelência provoca em mim os instintos mais primitivos", vociferou o petebista, às 17h26. Na platéia, deputados de vários partidos exclamaram "Nooossa!".
Vestido com um terno cinza, camisa branca e gravata cor de rosa, Jefferson chamou Dirceu várias vezes de "ex-todo poderoso ministro" e "hoje humilde deputado".
No rol de suas acusações, fez uma denúncia nova: a de que ele teria negociado com a Portugal Telecom um acordo que "pusesse em dia" as contas do PT e do PTB, em razão das enormes dívidas de campanha. "É mentira", reagiu o deputado do PT, na réplica.
Com gestos teatrais, Jefferson afirmou que, desde o início do governo, tratou de assuntos "republicanos" e "não-republicanos" com Dirceu, em seu gabinete na Casa Civil. Foi mais uma estocada em Dirceu, que durante o depoimento se definiu como "um homem republicano"."Vossa Excelência nos deixava à vontade para qualquer conversa", contou Jefferson.
Dedo em riste, Dirceu desmentiu o acusador. "Virei bandido agora? Como pode uma coisa dessas? Isso é um absurdo", respondeu, com sotaque carregado, entrecortado por um tom de voz mais fino, que provocou risadas na platéia.
"O deputado Roberto Jefferson está dizendo que eu criei o mensalão. Isso é uma coisa estarrecedora. Que país é este?" O ex-ministro disse que não enfrenta processo de corrupção, ao contrário de Jefferson. Afirmou, ainda, que seu adversário tinha esquemas de arrecadação de recursos na Delegacia Regional do Trabalho (DRT), no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), nos Correios, no Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), na Polícia Rodoviária e em Furnas.
Advogado criminalista, o deputado do PTB olhou várias vezes para as câmeras, no plenário de carpete verde. "Todo o povo brasileiro prejulga o deputado José Dirceu, um homem inocente", ironizou Jefferson. "Todos os gestos do Delúbio (ex-tesoureiro do PT), do Silvio Pereira (ex-secretário-geral do partido) não são do conhecimento dele. Toda a atitude do Marcos Valério (publicitário apontado pela CPI dos Correios como operador do mensalão), que foi 12 vezes à Casa Civil, não é do conhecimento dele. Você acredita nisso?" Jefferson negou que tenha participado de uma tentativa de um "acordão" para livrar da cassação uma penca de deputados, inclusive ele. "Quero dizer com toda a sinceridade: Eu assumo o que afirmei e não vou renunciar também. Tudo o que eu disse eu reitero: José Genoino era o vice-presidente do PT. Dirceu era o presidente." O deputado do PTB disse ainda que toda a negociação entabulada com Genoino tinha de passar pelo crivo de Dirceu, na Casa Civil.
Dirceu repetiu várias vezes que as acusações eram inverídicas. "O senhor traiu a confiança do presidente Lula", afirmou o ex-chefe da Casa Civil. O bate-boca continuou durante todo o depoimento. A certa altura, Dirceu pareceu entregar os pontos. "Eu não consigo entender por que o senhor faz isso comigo, por que me atribui uma responsabilidade que não tenho", lamentou.
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