O índio caingangue Leopoldo Crespo, 77, foi assassinado a chutes e pedradas às 23h da última segunda-feira em Miraguaí (454 km a noroeste de Porto Alegre), no Rio Grande do Sul. Crespo dormia na principal avenida do município gaúcho, de apenas 5.000 habitantes, quando foi surpreendido pelas agressões.
O índio era um dos mais idosos integrantes da comunidade da Aldeia Estiva, na Reserva da Guarita, em Redentora (município vizinho a Miraguaí). A causa direta de sua morte provavelmente tenha sido traumatismo craniano.
A polícia de Miraguaí ainda não chegou ao número exato dos agressores, que são entre três e quatro adolescentes, um deles de 14 anos, e os outros de 19. Encontrado pela Brigada Militar (a PM gaúcha) na avenida Ijuí (onde houve a agressão), Crespo foi levado ao Hospital de Redentora, onde chegou morto.
As testemunhas do caso dizem ter ouvido barulhos de pancadas e um gemido. Ao verificar na rua o que estava ocorrendo, viram três jovens deixando o local, caminhando tranqüilamente pela avenida, que estava praticamente vazia.
Não houve flagrante da agressão, e, por isso, os jovens, ouvidos na delegacia, foram soltos apesar de ter confessado a autoria do crime para a delegada Cristiane de Moura e Silva, da Delegacia de Polícia de Tenente Portela (município vizinho de Miraguaí).
A delegada, por motivos relacionados à investigação, não quis divulgar as identidades dos jovens nem detalhes sobre suas vidas. No depoimento, eles disseram que pretendia acordar o índio “”com coices”. A polícia localizou um pedaço de concreto com marcas de sangue no local onde ocorreu a agressão.
Outro índio esfaqueado na noite de 24 de dezembro na mesma cidade também foi ouvido pela polícia. Ele disse ter sido agredido por um dos jovens acusados da morte de Crespo. Ele estava caminhando próximo à rodoviária na noite de Natal quando foi chamado pelo jovem. Ao atendê-lo, foi esfaqueado no abdômen.
Na aldeia, onde Crespo morava com os filhos João e Teresa, o clima era um misto de revolta contida, temor pela possibilidade de a situação se repetir e desolação pela falta de justiça imediata. “As autoridades têm de fazer justiça. A comunidade está calma, mas esperando que os assassinos sejam punidos”, afirmou o cacique Carlinhos Alfaiate.
No enterro de Crespo, ocorrido na manhã de ontem, no cemitério evangélico da aldeia, houve consternação e calma, apesar da revolta, especialmente dos filhos. “”Não sei o que vai ser de nós sem o nosso pai. Espero que esses criminosos paguem pelo que fizeram”, disse João Crespo, 36. No dia em que foi morto, Crespo conseguira uma carona durante a manhã para Miraguaí, a seis quilômetros da aldeia, para fazer compras no mercado do qual era cliente. Era um hábito seu ficar alcoolizado e dormir na rua.
Na aldeia gaúcha, os índios recordavam ontem o assassinato do pataxó Galdino Jesus do Santos, que tinha 44 anos quando teve o corpo incendiado por jovens enquanto dormia em Brasília, em 1997.
No caso de Galdino, cinco jovens passeavam em um Monza preto e pararam, às 5h, em frente ao banco da parada de ônibus onde o índio dormia, lançando sobre ele um líquido inflamável (provavelmente álcool) e fugindo.