É particularmente importante para os brasileiros prestar mais atenção em recente estudo do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) sobre o perfil dos trabalhadores na América Latina, a distribuição dos salários e da renda. Um item é particularmente importante: a relação direta entre escolaridade/cultura e os salários.

Em tese, parece óbvio que um trabalhador mais culto, com mais escolaridade e melhor preparado tenha vantagens em todos os quesitos da empregabilidade. O estudo, entretanto, mostra um aspecto inusitado da questão, deixando claro que, no Brasil, a escolaridade representa sensivelmente mais no salário dos trabalhadores do que em outros países da América Latina e também nos Estados Unidos.

Na média da América Latina, cada ano a mais de estudo de um trabalhador com formação primária completa e pelo menos uma série cursada no ensino secundário significa acréscimo de 9,85% no salário. No caso de um trabalhador com formação secundária completa e um ano na faculdade, cada novo período de estudo representa acréscimo salarial de 17,26%. Em todo o continente, somente Chile e Brasil ficam acima dessas médias, mas nosso país é o que tem índice mais elevado, de 15,99% e 23,29% de acréscimo salarial em cada um dos casos, respectivamente.

Nessa abordagem do estudo do BID, o Brasil tem índice superior aos próprios Estados Unidos, onde a escolaridade secundária/primária representa 9,18% de acréscimo salarial e a terciária/secundária, 13,48%. Essa pesquisa demonstra, por um lado, que as empresas brasileiras têm ampliado o grau de exigência na contratação de funcionários. Esse fator é facilmente perceptível nas atividades nas quais o trabalhador está diretamente em contato com o público, em especial no setor de prestação de serviços. Nota-se, claramente, melhoria crescente no atendimento nos últimos anos.

Por outro lado, os números relativos ao Brasil também evidenciam haver disputa acirrada pelas vagas disponíveis no mercado de trabalho, no qual os processos seletivos são cada vez mais rigorosos e as exigências, crescentes. Tudo isso demonstra a importância de verdadeira mobilização nacional em prol da cultura, da educação e da melhoria da qualidade do ensino público, no qual se define em termos práticos o democrático conceito de igualdade de oportunidades.

Contrastando com essa imperiosa necessidade, o Brasil, num ranking de 45 países emergentes, ocupa a antepenúltima colocação em termos de investimentos em educação, conforme demonstrou recentemente a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), em seu relatório anual sobre o ensino. A despeito dos inegáveis progressos registrados nos últimos anos, em especial no tocante à disponibilidade de vagas escolares para praticamente todas as crianças e jovens, ainda é preciso avançar muito na correção de equívocos nas políticas públicas do ensino ao longo de muitas décadas.

O conteúdo do trabalho do BID relativo à equação ?escolaridade/renda? tem coerência com outro estudo recentemente divulgado, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), demonstrando que a produtividade dos trabalhadores no Brasil é sensivelmente menor do que em nações industrializadas e até mesmo em algumas da América Latina. A questão educacional é apontada dentre as causas da defasagem, ao lado de outros quesitos, como a conjuntura socioeconômica. Assim, é imensa a responsabilidade da nação – ou seja, do governo e da sociedade civil – no sentido de promover a inclusão cultural das crianças e jovens e a educação continuada e permanente capacitação dos trabalhadores. Nesse sentido, devem ser evidenciados e multiplicados exemplos como o do Senai, do Senac e do Instituto Paula Souza, que contribuem para a formação e desenvolvimento de recursos humanos aptos às novas exigências do trabalho.

A valorização do fator humano é pressuposto básico de todo projeto de desenvolvimento. A base educacional, o conhecimento, o direito de estudar e a capacitação técnica da atual e das novas gerações para a realidade de um mundo em constante mutação constituem-se no maior desafio do País neste momento. Todos os programas de saúde, educação, alimentação e de caráter assistencial – do Estado e do Terceiro Setor – são muito importantes para o resgate da dívida social. No entanto, a inclusão cultural é a verdadeira essência de um novo Brasil, pois salário e renda são os mais dignos e eficazes meios de promover a justiça social.

Ruy Martins Altenfelder Silva, advogado, é presidente do Instituto Roberto Simonsen, organismo de estudos avançados da Fiesp. Foi secretário da Ciência, Tecnologia, Desenvolvimento Econômico e Turismo do Estado de São Paulo.

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