Ninguém é contra um médico perito. Ele é essencial para muita coisa. Também ninguém é contra o que querem os médicos peritos: um plano de carreira no serviço público; imediata realização de concurso público para a contratação de oito mil médicos; salário compatível com as responsabilidades das altas funções que exercem; melhoria das condições de trabalho, coisa que todo mundo quer. Ninguém poderia ser contra, também, a reivindicada melhoria no atendimento prestado – e aqui, com licença – seja ele prestado de forma direta, ou realizado por terceiros contratados.

Tudo – ou quase tudo – o que os peritos médicos pedem tem fundamento à luz do objetivo maior que é, sempre, a melhoria do serviço prestado à comunidade. A imperícia dos peritos médicos é essa greve que já se arrasta desde o início de dezembro e não se sabe quando vai terminar. Segundo eles próprios, cerca de noventa por cento dos dois mil e quatrocentos médicos peritos do quadro funcional do Ministério da Previdência Social e outros quatro mil terceirizados estão de braços cruzados em todo o Brasil à espera de uma negociação que não avança por culpa (ou incompetência?, ou irresponsabilidade?) dos dois lados.

Não é pelo número de grevistas de braços cruzados. Greves de categorias muito mais numerosas nem são percebidas pelo público. Mas os peritos médicos constituem o nó górdio de muitas questões, vitais para um universo difícil de calcular entre toda a população. Assim, por mais que eles se esforcem para esclarecer a população acerca das razões dessa paralisação, restará sempre a pergunta básica: e o que os outros, os que dependem de uma perícia para continuar a receber seu sustento (muitas e muitas vezes casos de vida ou morte), têm a ver com isso?

Os peritos precisam ter consciência de que a greve está gerando atrasos no pagamento dos benefícios, direito inalienável de quem os recebe. Deveriam eles achar outro meio de protestar e pressionar pelas causas que defendem. O argumento segundo o qual os peritos nunca pararam ao longo de todas as outras greves realizadas pelos servidores da Previdência não vale. Antes, complica ainda mais, pois estamos diante de uma realidade em que os serviços da Previdência nunca funcionam devido à greve da vez. Ou do dia. E isso é um desrespeito, uma ofensa e um descaso para com os cidadãos a que servem.

A situação ainda não estava normalizada depois da última greve quase geral (sublinhe-se: à exceção dos peritos) do ano passado. De norte a sul, as filas ainda denunciam um quadro deprimente de desrespeito à cidadania, que foi agravado com as trapalhadas recentes do próprio ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, que condicionou velhinhos acima de 90 anos se apresentarem para provar que estavam vivos na hora de receber benefícios, entre outros fiascos que se sucederam e dos quais teve que fazer reiterados pedidos de desculpas aos brasileiros. Agora vêm os peritos e deixam tudo parado de novo. Qual a próxima categoria?

O ministro Berzoini tem anotado em seu currículo – segundo sublinhou o próprio presidente Lula em sua desastrada defesa – uma passagem de valente líder sindical. Não era assim tão conhecido mas, vá lá, não se discute isso. Como ministro, ele deveria estar atento às reivindicações dos médicos peritos, de olho também no atendimento condigno da grande massa que depende dos serviços da Previdência que ele dirige. Ou que deveria dirigir.

Na véspera do Natal, o ministro distribuiu broches e cartões de boas-festas pagos – segundo disse ao ser pego com a boca na botija, lembra-se? – pelo sindicato dos funcionários que lhes são subordinados. Os mesmos que agora fazem greve e, impunemente, complicam a vida de milhões. Está na hora de discutir a regulamentação do direito de greve no serviço público.

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