Há muito tempo a soja deixou de ser plantada somente na região sul do País. Hoje o maior produtor nacional é o Mato Grosso. E a fronteira agrícola da soja já chega a um ecossistema delicado e importante: a floresta amazônica. Para tentar entender as causas e os impactos que este cenário traz para o futuro do País, a Embrapa Soja convidou o coordenador de Pesquisa do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), Paulo Roberto de Souza Moutinho, para ministrar a palestra ?Produção de Grãos e a Dinâmica do Desmatamento na Amazônia?, durante a reunião do Comitê Assessor Externo da instituição.
O pesquisador lembrou que o Ipam é uma das poucas organizações não-governamentais dedicada a pesquisa científica no Brasil. Através de uma série de estudos, o instituto levantou os principais problemas enfrentados pela maior floresta do mundo e que abriga a maior diversidade biológica do planeta. O primeiro deles é a completa ausência do Estado (Polícia, Ministério Público, Ministério da Saúde, etc,) nas regiões que abrangem a floresta. Em segundo lugar está a falta de ordenação fundiária, onde não se sabe quem realmente é o verdadeiro dono da terra, e onde imperam a grilagem, os conflitos agrários e a violência. O terceiro principal problema da região, segundo Paulo Moutinho, é a falta de informação de qualidade para os moradores, o que leva a não solução de diversos tipos de problemas, desde a subsistência básica até a comercialização do que é produzido, tanto na agricultura como do que é retirado da natureza.
Esses problemas levam, por sua vez, ao desperdício das potencialidades econômicas e ao comprometimento ambiental, que vem se agravando a cada ano que passa. O desmatamento incontrolável, e cada vez mais acelerado, fez com que o Ipam fizesse uma projeção do que poderá acontecer com a Amazônia no futuro. E os dados são assustadores. Se a derrubada da mata continuar no ritmo atual, 40% da cobertura natural irá desaparecer até 2050. Paulo Moutinho lembrou os 4 principais causadores deste cenário preocupante: em primeiro está a pecuária. 70% da área devastada serve apenas como pasto para o gado. A extração de madeira vem em segundo lugar. Não existem estudos precisos, mas calcula-se que de toda a madeira retirada da floresta, 75% é feita de maneira clandestina e ilegal. O terceiro fator é a agricultura familiar, que derruba a mata para o plantio de subsistência. E mais recentemente o agronegócio, especialmente a soja, que se expandiu na região norte nos últimos anos. O pesquisador advertiu que quando se fala em Amazônia é preciso ter em mente também o cerrado, segundo maior bioma nacional, que se tornou a principal vítima do avanço humano.
Paulo Moutinho lembrou que esta expansão acontece de maneira simples. A soja ocupa as áreas que antes eram destinadas às pastagens. O pecuarista então precisa derrubar mais florestas para conseguir mais pastos. E assim o ciclo não pára. Porém, destacou o pesquisador, não seriam necessários mais estragos ecológicos se a ocupação do solo acontecesse de maneira racional. Paulo Moutinho salientou que existem hoje 60 milhões de hectares desmatados na região amazônica, mas 1/3 dessa área, ou seja, 20 milhões de hectares, estão abandonados.
O Ipam luta para desmistificar a máxima do progresso que diz ?Floresta boa é floresta derrubada?. Os estudos realizados pelo instituto mostram que 50% das chuvas que caem na Amazônia são produzidas pela própria floresta, num processo chamado ?evapotranspiração?. Ou seja, se a floresta continuar desaparecendo, os níveis de chuva também irão cair, como já vem sendo constatado. E estes efeitos climáticos podem causar desequilíbrio em vários países da América do Sul. Se o desmatamento não avançar de maneira mais equilibrada e racional, a própria agricultura irá se inviabilizar no futuro.