Há matrículas para a escola que não existe

Geraldo Almeida (FAO/UFPR)

Em um país marcado por desigualdades sociais de toda a natureza, sempre há uma pergunta que acompanhada qualquer que seja a reflexão em torno da escola: será que nossos filhos estão estudando em uma boa escola? E, no caso de pais, será que estou pagando por uma educação de qualidade? Por todos os lados surgem experiências prometedoras; por todos os lados surgem pessoas tentando persuadir, encantar e apresentar soluções mágicas, muito embora, o que realmente sobra desse universo imenso e inquieto, sejam dúvidas. Muito ainda deve ser feito para que a escola seja o lugar do conhecimento ou somente do trato dele, da ciência e dos valores humanos, há tempos esquecidos. Dessas falhas padecem, sem generalizações, as instituições públicas e as privadas de ensino.

Estamos mais uma vez vivendo a época das matrículas e, é claro, não faltam apelativos: há escolas que oferecem o céu em termos de educação. Leio os grandes outdoors colocados nas ruas e fico embestecido com a linguagem de cada um deles: uns prometem educar para a vida; outros prometem fazer a diferença, mas há ainda aqueles que prometem preparar para o futuro. Todos me surpreendem, mas ao mesmo tempo, muitos, senão, todos também, me assustam. Educar para o amanhã seria algo para se viver depois? Será que os alunos não se educam à medida que estudam? Será que o viver e o relacionar-se com tudo e todos não desencadeia a maravilha do viver? Penso que, se uma escola pode educar para o amanhã, certamente é porque ela não possui condições de educar para o mundo real, o hoje, o tempo presente, e, dessa forma, não convence que está fincada naquilo que vivemos, naquilo que nos emociona, nos choca, nos aterroriza, nos intimida. O amanhã pode ser um tempo viscoso demais para apanhá-lo com precisão.

Por outro lado, as escolas que prometem fazer a diferença, me decepcionam ainda mais, afinal o diferente que elas pregam são as aulas de judô, ballet e informática. Ora, aí sim, temos que nos prevenir, há tempos que oferecer aulas dessas, chamadas extracurriculares, deixou de ser "um diferencial". Para mim, e creio que pra muita gente, diferencial é algo realmente diferente, distinto, não similar, nada igual. Dessa maneira, quando uma escola divulga que oferecerá "algo diferenciado" deveríamos perguntar: aqui vocês educam? Acredito que esse sim poderia ser "um grande diferencial" entre escolas. Nada contra nenhumas das aulas ou disciplinas extracurriculares, mas é preciso estabelecer limites nesses apelos comerciais. Há verdadeiros crimes contra o consumidor, contra a criança e contra os profissionais que prestam estes serviços.

Não é de se espantar, só este ano, a imprensa divulgou, vários, casos de crianças agredidas por professores e funcionários da escola. Em Curitiba, uma escola chegou a esquecer o aluno dormindo dentro dela. As barbáries são muitas, conhecemos só as divulgadas, as flagradas, as concretas, mas e as subjetivas? As agressões morais e verbais nem sempre são localizadas e diagnosticadas facilmente. Essas são as mais graves. Crianças que são discriminadas, taxadas disso ou daquilo, separadas em turmas fracas e fortes e assim por diante.

Aos pais, que realmente se preocupam com a questão, o momento é delicado. Escolher uma escola somente pela fachada, pelas salas repletas de computadores e pelas cores vibrantes e surtidas que enfeitam as paredes, pode não ser os melhores critérios para tal. Os pais precisam garantir o mínimo de confiabilidade nesta empreitada e, de igual forma, é imprescindível ter mais que diálogo na relação, é necessário garantir a participação, a entrada no processo. Não há escola perfeita, mas há escolas participantes, dialogáveis, em construção. Essas são capazes de buscar constantemente soluções junto às famílias e aos educadores. Escolas prontas cheiram mal, pois elas há tempos vivem de seus modelos pré-formatados, arcaicos, enferrujados, estagnados. E parados eles acabaram putrefando, e o cheiro de coisa ruim se espalha pelo ar, mesmo com as paredes bonitas.

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