Embora a possibilidade de um ataque armado ao Iraque esteja cada vez mais próxima, os EUA ainda não declararam suas verdadeiras intenções. Insistem na alegação de produção e estoque de armas de destruição em massa pelo governo ditatorial iraquiano, desrespeitando a diversas resoluções da ONU. Para George Bush, essa prática compromete a segurança do povo americano, dificulta a manutenção da paz do mundo e justifica sua opção pelo conflito.
Mas tais argumentos não convencem a comunidade internacional. Ao desconsiderarem o fato de que outras potências também não obedecem à normativa da ONU, como acontece com Israel, e outros países possuem armas nucleares, como no caso da Coréia, a justificativa americana mostra-se frágil e abre margem para outras análises que apontam uma série de diferentes razões para o conflito, sendo que as principais serão expostas a seguir:
1. Petróleo.
O Iraque detém 11% das reservas de petrolíferas do planeta. Sendo o combustível mais utilizado no mundo inteiro, o petróleo é a fonte de energia mais disputada entre os países industrializados. A dominação do território iraquiano e, conseqüentemente, de toda aquela região representa a autonomia e a prevalência norte-americana nesse setor, afastando sua vulnerabilidade em relação aos países exportadores, sobretudo à Arábia Saudita, que é o principal produtor mundial. A estratégia dos EUA consiste em instalar-se no Iraque e realizar a privatização da exploração petrolífera, transferindo-a do setor público para as empresas anglo-americanas ExxonMobil, Shell, BPAmoco e ChevronTexaco, a quem já foi prometida a exploração dos 113 bilhões de barris. Explica-se aí a adesão imediata da Grã-Bretanha.
2. O Controle Político do Oriente Médio
Os EUA têm interesse imediato em controlar toda a região onde está localizado o Iraque, inclusive redefinindo-a em termos políticos e geográficos. Além da concentração de petróleo, ao longo do Golfo Pérsico, todo o Oriente Médio possui uma localização privilegiada, por ser um ponto eqüidistante entre importantes cidades do mundo e por ser um local que pode servir como base para uma eventual ofensiva, militar ou não, contra países muito distantes dos EUA, como Índia e China. O controle político e econômico da região seria um importante passo para uma estratégia possivelmente idealizada pelo presidente Bush, de construção de um grande império hegemônico, controlador das neo-colônias localizadas nos mais diversos pontos do planeta.
3. A Continuidade da Estratégia da Família Bush
Na primeira Guerra do Golfo, em 1991, o presidente George Bush pai organizou uma ampla aliança militar para conter Saddam Hussein, que havia invadido o Kuwait. No entanto, tal poderio militar não foi suficiente para destituir o presidente iraquiano e a guerra terminou com um cessar fogo. A defesa da honra da família também é apontada como um dos fundamentos da guerra atual, principalmente quando são consideradas as acusações de que Saddam seria o mandante da tentativa de assassinato de Bush pai ocorrida em viagem ao Kuwait, em 1994. Seria a retomada de um antigo projeto de revanche pessoal, interrompido pela ascensão de um presidente democrata, durante o mandato de Bill Clinton.
4. A indexação do preço do petróleo em Euro
Alguns analistas têm levantado uma outra hipótese que justificaria a obsessão do governo dos EUA em invadir o Iraque e depor Saddam, além de explicar a resistência de alguns países industrializados europeus, como França e Alemanha. Com a consolidação da moeda única da União Européia, o presidente iraquiano teria indexado o valor do barril de petróleo em Euro, afastando o uso da moeda norte-americana e, por conseguinte, desvalorizando-a. Isso teria obrigado os EUA a passar a adquirir Euros para comprar petróleo e não mais fazer a simples emissão de dólar, como acontecia anteriormente.
Como se pode observar diante dessas breves considerações, os motivos reais para o ataque armado estão longe de ser aqueles expostos pelo governo norte-americano. Definitivamente o Iraque não é uma ameaça nuclear imediata e possui pouca estrutura para utilizar armas químicas e biológicas em larga escala, o que facilita a busca de uma solução pacífica, sem pressa e com efeitos duradouros. A guerra não pode ser uma opção. Ela representará a violação da Carta da ONU – e conseqüentemente a perda ainda maior de sua credibilidade; gerará a morte de milhares de civis inocentes; estimulará ainda mais o terrorismo e poderá ocasionar uma revolta do islamismo contra o ocidente, cujas conseqüências são realmente imprevisíveis.
Tatyana Scheila Friedrich
é advogada, mestre pela UFPR, membro do Nupesul (Núcleo de Pesquisa em Direito Público do Mercosul/UFPR) e professora de Direito Internacional Público no curso de Direito das Faculdades Curitiba e nos cursos de graduação e pós-graduação em Relações Internacionais da Universidade Tuiuti.E-mail: tatyanafriedrich@yahoo.com