Greve no governo

Não há quem seja a favor de greve nos quadros do funcionalismo quando atingem serviços essenciais. O entendimento generalizado é que se são serviços públicos são obrigações indescartáveis do governo, que, até a semana passada, em impostos, taxas, contribuições e outros títulos, levou tudo o que os cidadãos brasileiros ganharam este ano. Só agora é que, no orçamento de cada trabalhador podem-se contar tostões para a própria sobrevivência. A favor de greve nos serviços públicos, essenciais ou não, só estão os dirigentes sindicais e lideranças que os apóiam nas assembléias-gerais que decretam os movimentos paredistas.

O governo federal, por proposição da Advocacia Geral da União (AGU), está dando andamento a um anteprojeto de lei que disciplina a greve do servidor público. Lula quer que pelo menos 60% da classe em greve sejam obrigados a ficar trabalhando para que a população não seja totalmente desassistida. O presidente da República adiciona aos termos da nova legislação que quer ver aprovada pelo Congresso Nacional diversos outros condicionamentos e empecilhos para tais paralisações. Surpreende e até espanta que uma posição tão dura contra a classe assalariada parta de um ex-líder sindical que durante mais de duas décadas levantava a bandeira das greves nas barricadas do ABC paulista. Mas uma coisa é falar de fora do governo e outra é ser governo.

Aqui mesmo, no Paraná, estamos assistindo a um movimento grevista no Hospital de Clínicas. A imprensa mostra o espetáculo constrangedor e confrangedor de pessoas pobres e doentes nas filas em busca de atendimento médico, encontrando portas fechadas. O mesmo temos visto com freqüência nos postos do INSS. E é recentíssima a paralisação da Polícia Federal que fez formarem-se filas imensas de pessoas em busca de passaportes. Esse sofrimento da clientela dos serviços públicos certamente leva à posição contra a greve. Mas é preciso que algumas verdades sempre escondidas ou silenciadas sejam ditas, para que as responsabilidades recaiam com o devido peso nos reais responsáveis.

É necessário explicar que há um governo federal, vários estaduais, muitos municipais. Que há poder Executivo, Legislativo e Judiciário. E, ainda, outros entes públicos. Todos eles, nas greves no serviço público, podem ser o patrão. E não poucos são patrões que estão negando a seus empregados, os funcionários públicos, direitos legítimos e incontestes. No caso do Hospital de Clínicas do Paraná, por exemplo, o patrão responsável é o governo federal chefiado por Lula. Os desatendidos não se voltam contra ele e muitos nem cogitam sobre se o governo federal tem ou não alguma responsabilidade.

No caso da Polícia Federal, a greve deu-se porque há quase um ano a União assinou um compromisso de conceder determinado percentual de aumento de vencimentos para a categoria. Escreveu, assinou, mas até hoje não cumpriu. Os motivos da greve são, portanto, os mais legítimos. Essa revelação de quem é o patrão e quem são os funcionários empregados em conflito com movimento paredista é importantíssima, pois entes governamentais tratam essas greves como se fossem crimes sem causa praticados pelo funcionalismo. E apostam na confusão do público, que não saberá se o responsável é o presidente da República e seus prepostos, os governadores, ou os prefeitos ou quem quer que esteja desatendendo a reivindicações do funcionalismo, que podem ser as mais justas. E, em determinados casos, já ajustadas, mas que o patrão-governo finge não ter nada com o problema. Assim, evitam o desgaste político deixando na rinha apenas funcionários em greve e o povo. Lavam as mãos como se nada tivessem a ver com o problema, quando de fato são seus principais responsáveis.

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