Não importa muito o que os tribunais decidiram ou vierem a decidir no bojo dessa longa greve dos bancários em todo o País. Ela passou dos limites e, no juízo da população, é abusiva. Banqueiros (aí incluído também o governo) e bancários já extrapolaram a fase dos prejuízos recíprocos para impingir sobre a sociedade um custo que ela não tem como pagar.
Culpa pela situação a que chegamos têm todos: os bancos, que não tiveram a sensibilidade de abrir mão de migalhas dos lucros que auferem com a especulação, bem acima daqueles que advêm da produção; os bancários, que não souberam encontrar a hora de parar e agora já enfrentam o desgaste e, por último e principal, o governo que, além de banqueiro travestido de social, cometeu a sua parte de burrice ao anunciar (na condição de patrão) no tempo errado o corte dos dias parados na folha dos grevistas amotinados. Tudo conjugado criou o caldo que leva às guerras sem retorno. Nela entrou inclusive a CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, cujo presidente, dom Geraldo Majella, critica acerbamente o governo, alinhado aos “poderosos donos de bancos” em defesa dos bancários.
Para cumular, veio a Justiça do Trabalho em decisão liminar mandar que pelo menos parte dos grevistas volte ao trabalho. E na quantidade intimada ao trabalho entrou em contradição: no Nordeste o número é 30%; em São Paulo, 60%. Noutros lugares, 40%. Afinal, o que diz a lei? Nem aqui há entendimento, já que alguém fala em número de agências, outros se baseiam no efetivo da categoria em greve. Com qualquer número, o importante seria a prestação dos serviços, não acham?
Já entra em cena a questão da desobediência à Justiça que, como se sabe, não admite insubordinação, pois, dizem, é cega. Mas os bancários avisam que não se deixarão intimidar por liminares. Atendem ao comando grevista em busca de uma saída honrosa. Não interessa agora apenas o salário. E assim esquecem também de ajuizar dissídio que, com a paralisação, seria visto em regime de urgência. Sem pedido na mão, a Justiça olha só pela legalidade ou não do movimento. Que coincide com as eleições, acirrando – de um lado – velhas paixões; de outro, aproveitando-se delas.
Temos um governo que até outro dia se gabava de sua consistência sindical de linha ideológica à esquerda. Boa parte de ministros e assessores do primeiro escalão é oriunda do meio sindical, cansada de greves. Sabia ser estilingue. Não estava preparada para substituir vidraças. Enquanto estimula de um lado, reprime de outro. E às vezes dá pouca importância para o estrago social de uma greve, assim entendidos os atrapalhos causados geralmente à gente humilde que depende dos serviços paralisados.
Foi assim com o pessoal da Previdência Social, que abusou do revezamento na paralisação de meses. Foi assim com algumas áreas da Justiça (em São Paulo ficaram três meses seguidos de braços cruzados!). Agora vêm os bancários, que já arrastam uma greve para além do tempo suportável, atrapalhando a vida financeira e econômica da nação inteira, mas principalmente, e de novo, aposentados e pensionistas… e dizem que este é apenas um teste para, em seguida, os petroleiros entrarem na mesma esteira grevista que tem razão de sobra no argumento: se tudo vai melhor no reino de Lula, por qual motivo só os salários continuam “contingenciados”?
Em Brasília, o ministro do Trabalho, que resume a posição do governo nessa área, parece não estar muito preocupado com o que acontece ao seu redor. Passou a teorizar sobre horas extras para diminuir as taxas de desemprego no exato momento em que deveria estar pensando em como contribuir para uma solução em que o Estado, além de sua obrigação constitucional, é parte. Aposta no esvaziamento do movimento, isto é, na velha e desejada possibilidade de que as coisas se resolvam por si. No desgoverno.