Governo articula para acabar com instabilidade em sua base política

O colapso do modelo de articulação política do Governo Lula, retratado com tintas fortes na eleição da mesa da Câmara e agora nas negociações envolvendo a medida provisória que pretendia aumentar impostos, desencadeou iniciativas no Palácio do Planalto com o objetivo de prevenir situações futuras de instabilidade. É o que pensam políticos da ala autodenominada "independente" do PMDB, procurados recentemente para discutir o apoio dessa ala e ajudar o governo a construir pontes com a oposição para produzir na Câmara "um ambiente de estabilidade, governabilidade e responsabilidade".

A esses interlocutores, os ministros da Casa Civil, José Dirceu, e do Conselho de Desenvolvimento Econômico, Jacques Wagner, reconheceram que o governo cometeu erros ao adotar, nos dois primeiros anos de mandato, um modelo "de motoniveladora" em suas ações na Câmara, e de ter se organizado com uma distribuição desproporcional das posições de poder no Executivo entre o PT e seus aliados.

"Ficamos com 80% dos cargos, com tudo que há de mais importante, e reservamos as sobras para nossos aliados", reconheceu Dirceu na conversa que teve na semana passada com o ex-ministro dos Transportes do governo Fernando Henrique e atual deputado do PMDB, Eliseu Padilha (RS). O ministro disse a Padilha que essa lição foi aprendida e que imagina que ainda seja possível alterar esse quadro.

O mesmo raciocínio o deputado Geddel Vieira Lima (PMDB-BA) ouviu de Jacques Wagner. Também atenderam ao convite para essas conversações de paz o presidente do PMDB, Michel Temer (SP), que se encontrou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e os deputados Jader Barbalho (PMDB-PA) e Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que pertencem à ala governista do partido, mas têm a confiança da ala independente.

A todos, os interlocutores palacianos disseram que pretendiam ter conversas institucionais semelhantes com o PSDB e o PFL, e que julgavam possível até mesmo trazer para o diálogo o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Prometeram também ajudar governos estaduais do partido, como o de Germano Rigotto, no Rio Grande do Sul, o de Rosinha Matheus, no Rio, e o de Joaquim Roriz, no Distrito Federal. Da mesma forma, garantem que pretendem tratar bem e resolver problemas de governos tucanos como o de Geraldo Alckmin, em São Paulo, e Aécio Neves, em Minas Gerais.

O que o governo pede, após a superação do episódio envolvendo a MP 232: em primeiro lugar, que a questão eleitoral de 2006 não entrará nessas discussões. "É assunto para 2006", nos garantiram, revela Padilha. Segundo o ex-ministro, o governo aceita a realidade de um PMDB dividido e que sua facção independente desenvolva o projeto de candidatura presidencial própria.

Em segundo, acredita que esse grupo, que controla a metade da bancada de 89 deputados, tem seis governadores e controla a Convenção Nacional da Legenda, pode ajudá-lo a gerar "um clima de ordem para substituir o atual estado de coisas", em que o presidente da Câmara decide quase tudo solitariamente e em que as bancadas se comportam a revelia de seus líderes. Em terceiro lugar, se compromete a tratar politicamente cada projeto de seu interesse incluído na pauta da Casa, isto é, discutir e fazer concessões de conteúdo se este for o preço para aprová-los.

O cenário que se desenha a partir dessas conversações parece claro: o Governo Lula reconhece que não tem mais a força política dos primeiros 18 meses de mandato e que agora, faltando 18 meses para as eleições gerais de 2006, terá de se submeter a uma estrutura parlamentar decisória que estará fora do PT e de sua tradicional base de aliados. Esta será a maneira pela qual poderá recuperar a capacidade de influir no colégio de líderes da Câmara e de alguma forma ter um mínimo de controle sobre a presidência do deputado Severino Cavalcanti (PP-PE).

Se cumprir o que promete, para evitar situações como a que se criou em torno da MP 232, dizem Padilha e Barbalho, o governo terá de reconhecer que acabou o espaço para aumentar a carga tributária. A insistência nas sobretaxações previstas na 232, ainda que por meio de projeto de lei, estará destinada a produzir nova polêmica e novos impasses nas suas relações parlamentares.

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