Em duas recentes oportunidades, conversei com o governador Roberto Requião sobre as políticas sociais e as questões econômicas e do trabalho. Na primeira, quando sancionou lei de proteção ao trabalho dos cobradores do transporte coletivo de passageiros; na segunda, quando reuniu as lideranças das lutas populares no Paraná das décadas 70/80. Em seguida, assisti a entrevista concedida à TV Educativa, desde o Porto de Paranaguá, na qual traduz algumas de suas idéias de governo e da qual extraio breves pontos para ilustração do que, sinteticamente, pensa, propõe e realiza o governador. Dada a singularidade de posições que têm marcado uma posição de vanguarda na política brasileira, com ampla repercussão em todos os setores sociais, a íntegra de suas declarações podem ser conhecidas no site oficial do governo do Estado.
(1) Isenções tributárias: Uma das diretrizes de governo de maior eficácia social situa-se no campo das isenções tributárias em setores que beneficiam diretamente os trabalhadores e as empresas. O governador ressalta: ?Por que vamos cobrar imposto sobre comida do trabalhador que tem o salário pobre, como é o salário mínimo no Brasil e, às vezes, não ganha nem o mínimo? Por que imposto em cima da fome? Então, prosseguindo essa visão ideológica que eu tenho, de que o governo serve ao povo, de que o governo que não tiver o povo feliz não é um governo bom, eu fui isentando a micro, diminuindo o imposto das pequenas, criando incentivos para industrialização das regiões de baixo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do Paraná, dos municípios mais pobres, e acabei ampliando a cesta básica para 30 produtos e zerei o imposto dos 30 produtos, inclusive da farinha de trigo?.
(2) Política econômica: O governador Requião tem sido um dos críticos mais contundentes da política econômica do governo federal. Salienta que ?nós estamos na contramão dessa visão do mercado, dessa visão do pagamento absoluto da dívida. O governo não pode funcionar como uma empresa devedora de alguns credores internacionais, busque pagar as nossas contas, mas o povo, a fome do povo, a oportunidade de trabalho, do desenvolvimento econômico têm que estar na frente do Brasil nação. Nunca será o objetivo do Brasil mercado, que é o Brasil do Collor, que o Brasil do FHC, e que desgraçadamente é o Brasil do Palocci hoje e da política econômica do governo federal?.
(3) Responsabilidade com o Estado: Um dos pontos atacados pelo governador refere-se à manutenção de contratos que considera ?imorais? e, neste sentido, confronta-se diretamente com segmentos econômicos internacionais e com grandes bancos: ?Porque defender o interesse público não paralisa Estado de país algum. Conversa mole de que ?temos que manter contratos imorais?, que sacrificam a nossa população, que levam o nosso dinheiro, segura o nosso desenvolvimento em nome da estabilidade da economia do mercado. Quero que se lixe o mercado. Eu sou brasileiro, sou paranaense, eu não fui eleito pelos bancos, eu fui eleito pelo voto do cidadão do Paraná, dos ricos e dos pobres, de todas as camadas. Eu tenho uma responsabilidade com o Estado, com a tranqüilidade social, como desenvolvimento, como emprego. Eu acho que o governo serve para isso. Se eu não pudesse fazer o que eu estou fazendo, que é exatamente o que prometi no processo eleitoral, não valeria a pena ser governador?.
(4) Uma guerra santa: Uma das questões de maior interesse na ação governamental refere-se aos pedágios e à manutenção das estradas: ?A guerra contra o pedágio é uma guerra santa e conta com apoio total da população. Às vezes, a mídia ilude as estradas pedagiadas são melhores. Não são. Nós estamos mostrando que não são. As estradas do Paraná foram abandonadas por oito anos e agora nós estamos recuperando uma a uma. Despesas pesadas, mas num próximo governo, elas serão recuperadas com muita facilidade. Porque se, hoje, para reconstruí-las, gastamos R$ 1,2 bilhão, isso em 2006, em 2007, R$ 120 milhões, R$ 130 milhões serão suficientes para mantê-las como um tapete porque não fizemos operação tapa-buraco, fizemos a reconstrução das estradas do Paraná e pretendemos completar isso até o fim do ano de 2006. Então, o que eu posso dizer é isso: nós não cedemos, não negociamos o interesse público, não traímos o compromisso, mas temos uma briga pesada e uma visão liberal do Judiciário de Terceira Instância sobre os contratos que ferem duramente o interesse da população. Eu sou advogado, eu aprendi, na faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná, que não existe direito adquirido contra interesse público. Mas isso é no estado nacional. Não é na visão dos que acham que nós não somos um país, somos um mercado, uma espécie da casa da sogra dos grandes interesses do capital?.
(5) Globalização: Em sua crítica ao mercado, o governador condena o processo de globalização que beneficia os grandes grupos econômicos: ?Nós esperávamos um comportamento diferente, votamos pela mudança, não votamos pela continuidade da política de FHC. O que aconteceu foi, não só a continuidade, mas a radicalização desta visão de Brasil mercado. Nosso Brasil é um Brasil do povo, com objetivos nacionais permanentes, é um Brasil que se volta para as pessoas, é um Brasil que não se ilude com essa conversa mole de mercado internacional, de globalização, porque essa globalização só arde nos brasileiros, é objeto da vantagem, dos lucros absurdos das Bolsas. Eu insisto, eu não fui eleito por Bolsas. Por isso que eu digo que eu governo o Paraná com a alma e com o coração. As medidas que tomo são medidas pensadas, são racionais, são firmes. O nosso não é governo frouxo, é um governo firme. Alguém diria que é um governo corajoso. Não, não é corajoso, é um governo de compromisso?.
(6) Superávit primário: O governador Requião não aceita a política do superavit primário do governo federal e, lembrando Brizola, dá um exemplo simples sobre esta complexa questão: ?O que é o superávit primário? Eu lembro que o Brizola explicava isso da seguinte maneira: imagina que você tem uma renda de R$ 3 mil, mas de repente você diz, eu preciso ter um superávit primário, eu preciso ter uma poupança em cima da minha renda. Então você corta o almoço dos seus filhos, não paga o aluguel da casa, não acende luz de noite e no fim do mês você tem R$ 1,5 mil de superávit primário. Seus filhos estão doentes, saíram da escola porque você não pagou a mensalidade?.
(7) Programas sociais: Pontos vitais do governo estadual estão localizados em vários programas sociais, sempre marca das diretrizes que o governador Requião imprime em suas administrações. Ele ressalta alguns aspectos, relembrando a Carta de Puebla, base teórica de sua campanha: ?Primeiro: quem não tem coração, que não tem alma, que não é capaz de sentir, que não capaz de sofrer o sofrimento de um povo inteiro. Eu, na campanha eleitoral, com toda a clareza, me comprometi a fazer um governo de acordo com a Carta de Puebla, da opção preferencial pelos pobres. Isso significa prestigiar empresas que gerem uma intensidade de empregos e atender as faixas mais carentes da população, investir na educação,na saúde. E é o que nós estamos fazendo. Eu comecei com a eliminação do imposto para as microempresas, primeiro, segundo dia de governo, e baixando brutalmente o das pequenas. Depois, nós criamos a dilação de prazo por quatro anos para as indústrias que resolvessem investir nos municípios de baixo índice de desenvolvimento humano, os municípios mais pobres do estado. Depois criamos programas, como o Programa do Leite, … depois… vem o programa da energia, Luz Fraterna…. o programa da água a Tarifa Social da água… o Fundo de Aval… Então, nós estamos avançando pesadamente nas políticas sociais. E algumas em parceria com o governo federal, através da Secretaria do Trabalho também. Eu acho que nós estamos, fundamentalmente, cumprindo compromissos. Agora, o fundamental, eu sempre disse que é governar com o coração e com a alma, e com o compromisso com os pobres e com o povo. Não é mais possível que o discurso de campanha não tenha nada mais a ver com a prática de governo. Aqui no Paraná, o jogo é pesado. A posição que nós temos da grande mídia nacional é terrível, mas governamos da mesma forma com que redigimos o nosso programa de governo?.
(8) Transgênicos: a oposição do Governador contra os transgênicos tem repercussão internacional, pois ela se dirige não só quanto a produção, mas comercialização e exportação. Neste campo tem se notabilizado como um dos principais líderes, afirmando: ?… temos que jogar pesado na defesa do meio ambiente. E dentro desse contexto está a resistência contra os transgênicos, que não sabemos aonde irão parar isso tudo, não estão suficientemente testados, podem ser um desastre absoluto, pode ser o fim do ciclo da soja no Brasil e no mundo. Por exemplo, se em determinado momento percebemos o mal que a transgênia pode estar fazendo às pessoas. Existem testes – com ratos terríveis, o inchaço de rins, o problema da esterilidade, uma série de problemas contatados com pesquisadores que foram suficientemente aprofundados ainda. Mas, em nome do lucro e de uma modernidade falsa, vão tentando liberar tudo e querem forçar garganta abaixo no Porto de Paranaguá, o interesse das multinacionais que controlam o comércio internacional de grãos – as famosas commodities. O Paraná é uma barreira de resistência a toda essa irracionalidade, a toda essa tolice. E fazemos isso com um grande compromisso que temos com o futuro, com a racionalidade e com a nossa agricultura.
Com relação à Força Verde, são carros, homens disponíveis para fazer um trabalho junto ao meio-ambiente?.
(9) Prévias do PMDB, candidatura a presidente: O governador Requião nunca escondeu seu trabalho político-partidário rumo a Presidência da República. Em um ano eleitoral, com definições próximas, em especial no PMDB, ressalta: ?Muita gente me pressiona para ir para essa prévia, aceitar essa parada. Eu, no entanto, tenho consciência do Paraná como frente de resistência contra o neoliberalismo no Brasil, [como] um exemplo de um estado que pode dar certo sem se submeter ao mercado, respeitando o povo, trabalhando pelo emprego, pela população e cumprindo compromissos. Eu tenho consciência que isso é muito importante….Se o PMDB se constituísse numa frente de defesa do interesse nacional, não é de rompimento com o mundo, nada de aventuras irresponsáveis, mas uma frente que progressivamente fosse reafirmando o Brasil como nação, restabelecendo e retomando os objetivos nacionais permanentes. Eu toparia essa parada se tivesse apoio de todas essas lideranças. Se, de repente, me dissessem: ?olha, Requião, você vai para a prévia, mas os governadores estão com você, 80% dos convencionais estão lhe apoiando em torno desta proposta de governo?.
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