Globalização ideológica

Os partidos socialistas pregam a globalização ideológica e se opõem sistematicamente à globalização econômica. Mas tal acontece, muitas vezes, como uma imposição dos fatos. O Brasil e a Bolívia enfrentam hoje uma séria crise que bem poderia ser o retrato desse paradoxo, o da globalização ideológica desejada pelas esquerdas e a internacionalização das ações econômicas de produção, comercialização e consumo. E nós pensávamos que tínhamos com o país vizinho um problema de altitude e não de atitude!

Tanto o governo Lula quanto o de Evo Morales são ou dizem ser socialistas e, portanto, ideologicamente globalizantes. Defensores na doutrina ou só no discurso dos interesses comuns do proletariado internacional, membros ou simpatizantes da Internacional Socialista e adeptos de símbolos vermelhos, como a bandeira comunista, expressões como ?camaradas? e ?companheiros? usadas com freqüência e não raro empunham o símbolo da foice e do martelo que sempre representou o bolchevismo soviético.

Mas o mundo vem mudando e trocas de posições têm ensinado que se há de ser internacionalista, por vezes, mesmo que se tenha uma posição antiglobalização para o que nunca faltarão razões. Até a eleição de Evo Morales na Bolívia, aliás, auxiliada pelo apoio expresso de Lula, o presidente do país vizinho era tido como um companheiro dos mais achegados. Normal que se esperasse que Evo só dirigisse a Lula mensagens de amizade e convites para entendimentos brindados com ?salteñas? e cerveja, como é costume boliviano. Acontece que o discurso socialista do PT e de Lula, enquanto não havia conquistado o poder, teve de mudar quando o assumiu. O Brasil em relação à Bolívia passou a ser o gigante que significa dominação econômica, principalmente na exploração, refino e comercialização de petróleo e no fornecimento de gás. O nosso País é o maior consumidor de gás natural boliviano e também o seu maior produtor de petróleo. Como conseqüência, é um grande investidor que parece aos olhos socialistas de Evo Morales e seus partidários um país que exerce sobre a Bolívia execrável imperialismo.

Acontece que tudo está no papel, sacramentado. O gás que consumimos da Bolívia é fruto de contratos de fornecimento e pago religiosamente. As usinas da Petrobras lá instaladas custaram muito dinheiro do povo brasileiro e as suas operações de exportação são negócios legítimos. Como país imperialista, passamos a ver nossas empresas nacionalizadas e invadidas manu militari pelas forças armadas bolivianas. Os contratos têm sido rasgados e o último passo arbitrário de Evo Morales foi a nacionalização das operações de exportação da Petrobras, que deve passar a vender sua produção a preços inferiores aos do mercado internacional.

O governo boliviano se propõe a pagar pelas refinarias da Petrobras, mas acena com valores defasados iguais ou próximos do que por elas lhes pagou o Brasil. Ignoram maliciosamente os gigantescos investimentos que a Petrobras fez naquelas unidades. O Brasil exige um preço justo. Criou-se um impasse, pois os internacionalistas ideológicos insistem em cutucar o gigante imperialista que seria o Brasil. E o Brasil, que já foi socialista e, portanto, internacionalista, de repente descobre que há horas em que o interesse nacional fala mais alto do que falsos dogmas ideológicos.

É um jogo de braço que acabaremos de alguma forma vencendo. Sem o Brasil financiador, produtor, refinador, comercializador, cliente e investidor, de pouco ou nada valem os slogans de internacionalismo ideológico que sustentam no poder homens como Evo Morales e outros demagogos que reaparecem na América Latina.

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