A política do Brasil para o mercado de remédios para a aids começa a ter conseqüências em âmbito internacional. Cálculos feitos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre o preço das matérias-primas usadas nos remédios que integram o coquetel contra a aids mostram que os produtos com concorrência de genéricos ou a ameaça de quebra de patentes tendem a ter preços bem abaixo dos outros ainda sob a proteção de regras de propriedade intelectual.
A OMS avaliou os 12 ingredientes farmacêuticos que formam o coquetel contra o vírus HIV e fez um levantamento dos preços mais baixos e os mais altos encontrados no mercado internacional. O resultado é significativo. O menor preço para o Indinavir, por exemplo, é de US$ 285,00 por quilo do produto. Já o valor mais baixo encontrado no caso do lopinavir é de US$ 2,9 mil por quilo.
Para especialistas, essa diferença coincide com o fato de existir um mercado de genéricos para o Indinavir, que não está coberto por patentes no Brasil. Já o mercado de genéricos para o lopinavir, patenteado e bem mais caro, é reduzido. O mesmo ocorre ao se comparar os preços do Abacavir, até cinco vezes mais altos que o Zidovudine, outra matéria-prima. Mais uma vez, a diferença está no fato de o Abacavir continuar sob a proteção de patentes no Brasil.
"Essa avaliação deixa claro que quanto maior a competição no mercado menor será o preço", afirma Eloan dos Santos Pinheiro, ex-diretora da Farmanguinhos e hoje técnica do departamento de combate à aids da OMS. Segundo Eloan, no tempo em que comandava a Farmanguinhos, em 1997, foi obrigada a comprar esses produtos por preços bem acima dos valores registrados em 2005.
"Isso ilustra a importância de se promover remédios genéricos para gerar uma competição em importantes mercados como Brasil, Índia, China, Tailândia e África do Sul", afirmou James Love, um dos maiores especialistas em propriedade intelectual. Já a indústria prefere acusar as empresas de genéricos de não estarem vendendo produtos com a mesma qualidade, o que supostamente explicaria os preços menores.
Na tentativa da OMS de garantir que 3 milhões de pessoas tenham acesso aos remédios até o final 2005, a questão dos preços dos remédios se torna um tema cada vez mais presente. Hoje apenas 700 mil pessoas no mundo são beneficiadas por esse acesso, 180 mil delas no Brasil.
Analistas acreditam que para suprir remédios para outras 2,3 milhões de pessoas, a OMS terá duas escolhas: obter maiores recursos para pagar pelos remédios ou esperar uma queda significativa dos preços.
Com o cálculo das matérias-primas feito, a OMS agora prepara um novo documento em que irá comparar os preços dos remédios finais e mostrará quais empresas vendem seus produtos por quais preços. "Será um documento polêmico", antecipa Eloan