Uma das medidas mais polêmicas do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), documento inaugural do segundo mandato de Lula, é a criação de um fundo usando o dinheiro do FGTS. Esse novo fundo, que já é objeto da Medida Provisória 349, que saiu publicada na edição da última segunda-feira do Diário Oficial, proveria o governo de recursos para financiar obras de infra-estrutura. Os trabalhadores ficariam autorizados a apartar até 10% de seu saldo no FGTS para aplicar no novo fundo e dele receberiam, proporcionalmente às quotas compradas, os resultados. Só que teriam de deixar o dinheiro aplicado por pelo menos cinco anos, o que se explica pelo fato de que obras de infra-estrutura são de conclusão demorada. Tal fundo já nasce com R$ 5 bilhões.

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A CGT – Central Única dos Trabalhadores e a Força Sindical estão entrando com ação no Supremo Tribunal Federal contra esse fundo do fundo, que terá administração da Caixa Econômica Federal. Há motivos sobejos para que os trabalhadores não queiram esse fundo do seu fundo. Em primeiro lugar, porque se trata de um desvio da finalidade do FGTS, que é o amparo do trabalhador no caso de demissão sem justa causa, aposentadoria e socorro à sua família, em caso de falecimento. Esse dinheiro, por caminhos já existentes, tem sido desviado para outros fins que não aqueles para os quais foi constituído, mas sempre houve a garantia do governo através do sistema financeiro de que sua remuneração é intocável. Pequena, mas intocável. No novo fundo para infra-estrutura, o dinheiro terá garantia de recebimento dos resultados dos investimentos que com ele serão feitos, mas se trata de aplicações de risco, que podem render logo ou a longuíssimo prazo. Ou nunca. E podem também dar prejuízos.

O mercado de capitais normal, que movimenta dinheiro em ações de empresas cujas atividades podem render a curto ou médio prazos, já tem demonstrado que por sua própria natureza pode dar prejuízos, quanto mais aplicações em obras de infra-estrutura, muitas delas por definição não lucrativas. Os lucros dessas obras são, em geral, não mensuráveis, embora sejam esteio do desenvolvimento econômico. No mais, as próprias políticas desenvolvimentistas fazem com que obras de infra-estrutura não busquem lucros financeiros e sim econômicos e sociais, o que é bom para o País, mas pode não sê-lo para as finanças pessoais dos trabalhadores e de suas famílias.

O governo há muito anda de olho no dinheiro do FGTS, colocando em segundo plano suas finalidades precípuas e quase ignorando que se trata de propriedade dos trabalhadores, um substituto da extinta estabilidade no emprego e um ônus dos empregadores. Seus recursos já foram desviados para a compra de ações da Petrobras e da Vale do Rio Doce, dois empreendimentos de sucesso, rentáveis, mas que não escapam às políticas estatizantes ou à pretensão de reprivatização. Neste caso, de qualquer forma, houve o cuidado de fazer com que o trabalhador tivesse resguardado o seu direito de optar ou não. Já o fundo que agora se constitui aparta, desde logo, R$ 5 bilhões do dinheiro dos trabalhadores, sem pedir-lhes licença. E será administrado sem participação dos donos do dinheiro ou seus representantes. É um desvio de dinheiro dos trabalhadores para o mercado de capitais, o que em si seria um caminho desejável. Mas a forma como está sendo feito e o destino sendo obras de duvidosa rentabilidade, aplicação de longo tempo para maturação e sem a licença dos donos, os trabalhadores, transformam-no num dos calcanhares-de-aquiles do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC.

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