Formação de professores na década da educação

Um dos grandes desafios de hoje é trazer os mestres ao centro do movimento de renovação educativa, ajudá-los a, coletivamente, interrogar-se e reaprender o seu “ofício de mestre” (M. Arroyo). Seria ingênuo pensar em “qualidade de educação” sem uma adequada formação, capacitação e qualificação dos docentes, especialmente no que se refere ao ensino fundamental.

A LDB inovou ao alargar a esfera da educação básica, que passou a compreender três etapas: a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio. Ora, a educação infantil e as séries iniciais do ensino fundamental, em nosso país, têm uma urgente demanda no sentido da habilitação dos docentes que nelas atuam, a ponto de isto haver sido previsto na própria LDB, que dispõe que a formação dos docentes para a educação básica deve se dar em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena (art. 62, 1.ª parte). Reconhecendo, no entanto, a disparidade de oferta desses cursos no âmbito do território nacional, admite a possibilidade de que a formação mínima para o magistério na educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental continue sendo feita em nível médio, na modalidade Normal, que veio a substituir os antigos cursos de magistério (art. 62, 2.ª parte).

A LDB vai além. Ao constatar a situação vigente em nosso país, instituiu, nas chamadas Disposições Transitórias, a “Década da Educação”, que deve ser um tempo de esforços concentrados com a finalidade de elevar a qualidade do ensino aos níveis preconizados na “Declaração Mundial sobre Educação para Todos” (Jomtien 1990), e que perdurará até dezembro de 2007. No art. 87, estão previstas as principais ações para isto, uma delas tratando dos chamados “professores leigos”, ao estabelecer que cada Município e, supletivamente, o Estado e a União, deverá “realizar programas de capacitação para todos os professores em exercício, utilizando também, para isto, os recursos da educação a distância” (parágrafo 3.º´, III), dispositivo que se articula com o parágrafo 4.º´ do mesmo artigo quando estabelece que, ao final da década, somente sejam admitidos professores habilitados em nível superior ou formados por treinamento em serviço.

Tais programas de capacitação não se confundem com os cursos regulares de licenciatura. Sua principal característica é a “provisoriedade”, ou seja, possuem duração limitada pela própria lei. Devem os Municípios e Estados verificar os docentes que não possuem a habilitação devida e providenciar que tenham acesso à formação superior, em cursos de licenciatura ou programas de capacitação. Estes, por seu caráter transitório, específico e emergencial, estão sujeitos à autorização dos respectivos sistemas de ensino, a partir do princípio constitucional do regime de colaboração ( Arts. 23, par. único, 18, caput, e 211 da CF). Como a competência concorrente para legislar sobre educação e ensino é dos Estados, cabe aos órgãos normativos estaduais estabelecer regras e condições de oferta dos referidos programas. Esta competência dos sistemas estaduais é indiscutível, pois não entra em conflito com as competências da União, como foi reconhecido pelo STJ (MS 7801-DF). Também clara é a posição do Conselho Nacional de Educação sobre o assunto (Parecer CNE/CP n.º´ 4/97).

O Conselho Estadual de Educação do Paraná, no uso das competências que lhe são cominadas por lei, estabeleceu normas para a oferta de programas de capacitação em nosso Estado, na Deliberação n.´ 4/02, da mesma forma que outros Colegiados estaduais, como São Paulo, Santa Catarina, Minas Gerais, Pará. No Paraná, duas instituições públicas apresentaram projetos de programas de capacitação, com alta qualidade pedagógica e técnica, especialmente pela utilização de modernos meios de comunicação e informação, aliando momentos presenciais e estudos individuais, em formatos adequados para os docentes atuando em instituições de educação infantil e ensino fundamental: a Universidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG e a Faculdade Vizinhança do Iguaçu – VIZIVALI. Ambos os projetos, satisfeitas as condições normativas, foram autorizados, gozando de todas as prerrogativas legais para a emissão do diploma de licenciatura para educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental (cf. art. 7.º´ da Deliberação 4/02).

Essas duas iniciativas, que poderão ser seguidas por outras de igual qualidade, expressam a ousadia e competência das Instituições de Ensino Superior de nosso Estado em relação ao seu papel, especialmente no que se refere à utilização dos modernos processos de comunicação e informação com base nas novas tecnologias, permitindo conjugar flexibilidade, efetividade e profundidade na formação docente. As resistências surgem daqueles que são incapazes de compreender o surgimento de novos paradigmas antropológicos, tecnológicos e educacionais, redefinindo os modelos tradicionais de formação profissional diante dos desafios contemporâneos da educação. É preciso ter a coragem de romper com certezas cristalizadas e dar atualidade às relações sociais e educacionais no horizonte da dialética entre tradição e ousadia. É o que a educação do Paraná está fazendo.

* Teofilo Bacha Filho

é Presidente da Câmara de Educação Superior do CEE-PR

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