Financiamento Eleitoral e Magistratura

O caso Diniz, pauta do momento, reafirma a tese de pensadores sobre as eleições, como David Fleischer, da UnB: quem tem dinheiro de sobra para campanhas é o crime organizado, assim, as eleições são marcadas pela financiamento do crime às campanhas. Nesse sentido, é mais democrático e republicano o financiamento público. Claro que essa tese encontra opositores, que de pronto alarmam: “como, nós agora além de agüentar os políticos vamos financiar suas campanhas….?”

Ao olhar o debate sobre a reforma do judiciário, verifica-se que várias propostas abordam o que a ciência política chama do “problema do recrutamento”, ou melhor, a forma de ingresso à carreira da magistratura. Ouve-se de tudo, desde eleições gerais ao Judiciário até eleições diretas para o STF, indiretas para o STJ, TST, prévia da OAB para o TSE, etc. Ninguém, entretanto, comenta a tese de Eugenio Raul Zaffaroni, atualmente Ministro da Suprema Corte da Argentina, de que a forma de ingresso ao Judiciário brasileiro, com o primeiro grau recrutado por mérito e nos graus superiores em gradação de mérito com legitimidade, até chegar ao STF, formado com legitimidade popular reflexa (pela indicação e sabatina de Poderes eleitos), é avançadíssima no aspecto formal. E mais: os que falam em eleições diretas simplesmente não fazem idéia do que isso significa. Não se pensa nas pesadas campanhas e disputas eleitorais acirradas, bancadas por grandes escritórios de advocacia.

Em recente pesquisa nos Estados Unidos, onde o voto não é obrigatório e não existe a urna eletrônica, Roy Schotland demonstrou que 47% das eleições para magistrados foram decididas por margens de votos inferiores a 20%, o que torna a corrida eleitoral judiciária mais acirrada do que muitas disputas para cargos no Executivo e no Legislativo americano. Em 42 Estados americanos há disputa eleitoral para juizes estaduais.

Schotland afirma que as recentes eleições judiciais são mais “ruidosas, sórdidas e caras” do que décadas atrás e é comum os candidatos recorrerem a especialistas em eleições, com grupos de consultores políticos e de marketing. Por outro lado, esses especialistas enfrentam tons diferentes de campanha do que estão acostumados para os outros Poderes, pois as eleições para o Judiciário são marcadas por um forte componente retórico em cima da ética, sem preocupações com nichos como certos grupos de interesse social ou com plataformas focalizadas, como é o caso da maioria dos eleitos à Câmara Baixa, pois tendem a representar certos destacamentos da sociedade.

Outra pesquisa, por Joe Cerrel, mostra que os candidatos aos “trial courts” gastam em média US$ 35.000,00. Candidatos para Tribunais de Apelação e Supremas Cortes estaduais gastam, em média, US$ 200.000,00. A pesquisa também alerta que em alguns Estados, quais a disputa é mais acirrada, esses valores são bem maiores. O National Institute on Money in State Politics informou que os gastos da campanha de 1998 para Suprema Corte do Alabama, Ohio e Texas, rivalizou com os gastos das campanhas para a U.S. House.

Isso significa que a eleição para magistratura, nos Estados americanos que prevêem tal investidura, traz consigo todos os problemas das eleições usuais: o financiamento de campanha é o maior deles sob o aspecto do mandato livre.

Vários Estados regulam as eleições para juízes, impondo limites à angariação de fundos e monitoram os conteúdos das campanhas. Vinte e sete Estados proíbem os juízes já eleitos de pedir fundos para novas disputas. Em trezes Estados, essa proibição é para todos os candidatos, que são obrigados a formar comitês de campanha para arrecadar dinheiro. Enfim, há uma significativa preocupação com a questão do financiamento.

Pois bem, ante os fatos, alguns ainda insistem em argumentar em uma magistratura eleita de forma direta, ante uma retórica de valores democráticos e etc. Entretanto, a realidade mostra exatamente o contrário, no sentido de que a liberdade de um magistrado é dada pelas garantias institucionais conferidas e não pela preocupação com a popularidade eleitoreira.

Rafael Thomaz Favetti é bacharel em Direito (UnB), mestre em Ciência Política (UnB), professor de Direito do IESB (DF) e assessor de ministro no Supremo Tribunal Federal.

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