O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso criticou hoje, duramente, em São Paulo, a política fundiária do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e avaliou que o Ministério do Desenvolvimento Agrário não age de forma adequada em relação ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). "É preciso chegar num entendimento com esses setores do MST. À medida que o ministério da reforma agrária, às vezes, parece dar força a um ‘reivindicacionismo’ incessante, isso complica a possibilidade de, realmente, consolidar o que já foi feito", disse, na sede da Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdid), onde falou do atual cenário do setor.

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Fernando Henrique argumentou que a gestão dele fez o maior processo de reforma agrária numa democracia, sem necessidade de revolução, e isso permitiu o acesso à terra.

"Só no meu governo, assentamos cerca de 500 mil famílias e desapropriamos cerca de 20 milhões de hectares de terra. Isso quer dizer Holanda, Bélgica e Luxemburgo juntos."

Segundo ele, neste momento, Lula deveria "ir mais a fundo naquilo" naquilo que pregou – consolidar o que foi feito. "Porque foi feito muito, embora, na época, eles (petistas) tenham negado." A respeito das acusações feitas pelo presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart, que culpou o agronegócio pelo assassinato de sem-terra no País, FHC disse: "Eu vi (a declaração), mas o presidente Lula é quem tem de responder isso, não eu." Na opinião do ex-presidente, é lamentável tanto as ocupações como a reação "inaceitável" dos pistoleiros. "São sintomas do nosso atraso, da nossa incapacidade de resolver de uma maneira institucional esse problema", avaliou.

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Críticas

Depois de uma palestra fechada de duas horas para cerca de cem empresários da área de infra-estrutura e indústria de base, FHC disse aos jornalistas: "Podem perguntar à vontade." Apesar da alegação de que não estava disposto a criticar o presidente, porque esteve no mesmo cargo e sabe que as "coisas são difíceis", o ex-presidente advertiu-o várias vezes.

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"Maioria para quê?", indagou, sobre os esforços da administração Lula para manter o PMDB na base aliada. "O Executivo não pode governar sem ter maioria no Legislativo, mas é preciso ter propósitos claros", emendou. Sobre quais seriam essas intenções, FHC desconversou: "Não estou aqui para fazer críticas." Mas continuou: "Não fica bem para quem sabe das dificuldades julgar o governo. Lula, como ex-deputado ou o líder Lula, julgava-me, mas ele tinha a absolvição de quem não sabia como era difícil. Eu não tenho isso. Eu torço pelo Brasil e não contra o governo Lula." Durante essas críticas, o ex-presidente sugeriu ainda que o presidente faça uma revisão das visões que tinha do passado.

FHC também listou o que considera pontos fortes e fracos do atual Poder Executivo. Segundo o ex-presidente, o que mais o surpreendeu foi que esperava "mais em termos criativos" do novo Executivo, sobretudo na área social e gerencial. FHC citou como exemplo o programa Fome Zero, que era uma grande novidade e teria sido esvaziado.

Sobre as críticas que a ex-primeira-dama, a antropóloga Ruth Cardoso, faz ao projeto, o ex-presidente brincou: "Quem sou eu para discordar da d. Ruth?" Para FHC, o ponto forte do governo petista é a responsabilidade pela condução da política econômica e a capacidade pessoal de Lula em comunicar-se com o País.